Então, como ia dizendo antes de ser interrompido pela indicação ao Oscar do documentário do qual fui consultor, por comentários desprezíveis nas tais redes e por certas declarações deveras "imprecionantes", o fato é que a história da arqueologia foi marcada pela presença de gigantes. Mas nenhum maior do que Giovanni Belzoni. Não que esse assombroso italiano tenha sido um escavador exemplar: pelo contrário, há quem o considere o pioneiro no chamado "estupro do Nilo". Belzoni de fato arrombou e explodiu tumbas e escavou feito toupeira na busca por tesouros perdidos. Só que além de ter operado prodígios, também era um... gigante. No sentido literal.
Nascido em Pádua, na Itália, em 1778, Belzoni tinha 2m2cm de altura. Fugindo das guerras napoleônicas, mudou-se para a Inglaterra, onde virou atração de circo. Como o "Sansão da Patagônia", metido num maiô multicor e com barba até o peito, ele erguia enorme roda de ferro com 20 homens sobre ela – graças também, e principalmente, aos segredos da hidráulica. No meio circense, conheceu, apaixonou-se e se casou com Sarah Bane, mulher tão "imprecionante" – ops, perdão, impressionante – e quase tão forte e alta quanto ele. Os dois iriam formar um dos casais mais formidáveis do século 19 – de qualquer século, na verdade.
Belzoni e Sarah foram para o Egito em 1812. Ele queria vender aspirador de pó para beduínos – rê-rê-rê, é piada. Na verdade, pretendia empurrar máquinas hidráulicas para emires endinheirados. Encontrou-se por acaso com Jean Louis Burckhardt, o inacreditável aventureiro suíço, descobridor da cidade perdida de Petra, que lhe falou de um misterioso templo soterrado nas areias de Abu-Simbel. Após seis meses de indizível labuta, Belzoni desenterrou e penetrou no templo. Também transportou a colossal cabeça de 12 toneladas de Ramsés II, encontrou a tumba de Seti I e assinou seu nome com a arrogância e a obtusidade de um ex-BBB na antecâmera da pirâmide de Quéfren, na qual foi o primeiro a penetrar.
Foi ele quem desvendou a magnificência do Egito para o Ocidente. Além de ter escrito um best-seller (inédito em português), Belzoni montou uma exposição no Egyptian Hall, no coração de Londres, deflagrando o primeiro (de muitos) boom de egiptomania na Inglaterra. Ganhou rios de dinheiro – e tudo perdeu em perdulária enxurrada. Disposto a chegar à misteriosa cidade de Timbuctu, morreu no Benin em 1823 – de febre ou de bala. Sarah ficou na penúria.
Dentre os gigantes da arqueologia, nenhum teve a audácia desmedida, o ímpeto resoluto e, é claro, a estatura de Giovanni Belzoni. Ainda assim, foram bem maiores do que ele.