O Natal, tal como o festejamos, é basicamente uma festa nórdica: escandinava, com sabor germânico e uma leve pitada britânica. Mas claro que, em seus primórdios, o Natal é bem anterior aos ritos pagãos feitos para sacralizar, nas lonjuras do Norte, o solstício de inverno, com suas longas e infindáveis noites. A própria árvore de Natal ainda remete ao ritual mágico que levava os hirsutos povos do Setentrião a pendurar adereços nos galhos secos na esperança de que voltassem a dar flores e frutos tão logo a primavera lhes voltasse a sorrir.
Ainda assim, as cerimônias que deram origem ao Natal cristão são mais antigas – e floresceram em terrenos menos inclementes. Não restam dúvidas de que o Natal nada mais é do que uma readaptação do ancestral culto a Mitra, o Deus da Luz, professado na Babilônia e na Pérsia, durante o solstício de inverno, pelo menos sete mil anos antes da era cristã. Foi Alexandre, o Grande, quem introduziu a devoção a Mitra na Europa, no século 4 a.C. E, após suas turbulentas andanças pelo Oriente, o Deus da Luz persa virou a dileta divindade dos soldados romanos, indo parar assim no coração do império: a fabulosa Roma.
Os primitivos cristãos arrastavam-se pelas catacumbas – ou serviam de repasto aos leões no Coliseu – enquanto Mitra era saudado com toda pompa e luz a cada novo solstício. E, mesmo após a nova religião chegar ao poder, as velhas crenças persistiram. Só então, no ano 221, o historiador Sextus Julius Africanus (c.160-c.240), nascido na Líbia, mas cidadão de Roma, decidiu calcular, de forma escandalosamente manipulada, a "data exata" da concepção de Cristo. Ele cravou 25 de março como o dia mágico. Assim, o "salvador dos homens" sairia do ventre de Maria exatos nove meses depois. Ou seja: em 25 de dezembro, justo o dia em que as celebrações do chamado "Festival do Sol Invicto" chegavam ao auge nas ruas de Roma. E eis que nasceu o Natal – com o nazareno Jesus cedo tomando o lugar da velha Luz vinda da Pérsia.
Manipulação mais acintosa, porém, sofreu o pobre Papai Noel, que nasceu na Turquia, meio século depois de Sextus, e teve como modelo São Nicolau. O velho bispo da cidade de Mira era famoso por distribuir presentes a todos – e só vestir azul. Isso até um refrigerante – que há quem chame de "a água negra do capitalismo" – recriar Santa Claus à sua imagem e semelhança, fazendo o Papai Noel trocar a cor do céu pela do inferno.
É por isso, e ainda mais, que, lá em casa, todo dia 24 de dezembro nos reunimos para celebrar a Luz. Todos, é claro, vestidos de azul.