Nada – nem chiclete, nem topete, nem ray-ban, nem band-aid, nem lambreta, nem Grapette – deixou o Brasil mais antenado do que a TV. Nem mais americanizado também, já que ao abrir o primeiro canal brasileiro, no raiar dos anos 1950, o pioneiro Assis Chateaubriand seguiu não o modelo da inglesa BBC, uma TV pública, mas, sim, a fórmula "Nossos comerciais, por favor" das redes americanas. A questão, portanto, nunca chegou a ser Tupi or not Tupi, mas TV or not TV: simplesmente porque ou haveria anúncio, ou não se veria TV no Brasil, pois TV educativa foi algo que não cruzou nem perto de certas cabeças ocas de então.
Ainda assim, em seus primórdios, por mais moderna que se anunciasse, a TV brasileira era uma mistura um tanto sem jeito de teatro e rádio, com uma garota-propaganda no meio. Fina ironia, pois, com o advento da TV, o teatro perdeu o rebolado e raiou a já era do rádio. Do reclame ninguém reclamou: era parte da novidade.
De todo modo, a TV chegou dando sorte ao Brasil, pois foi ao ar em 18 de setembro de 1950, exatos dois meses e 48 horas após o mais azarado dia da pátria de chuteiras, quando, em 16 de julho, pelas ondas do rádio, o Uruguai ganhou a Copa do Mundo diante da suposta "nação de vira-latas". A TV virou o jogo – e nem passou a reprise. Sintonizando o país de cabo a rabo, fez tudo mais colorido, até quando era só em preto e branco. Ligada, deixou nossas vidas por um fio e todo mundo com o dedo na tomada.
E, apesar dos pesares, é óbvio que a TV melhorou o Brasil.
Na semana retrasada, quebrei o braço em Brasília. Após três dias no hospital, numa suíte com TV a cabo, tive que me transferir para um hotel mequetrefe. No quarto, só havia TV aberta. Deus meu, nosso Senhor: que coisa diabólica! Eram nove canais, quatro deles evangélicos.
Havia um "pequenas rezas, grandes negócios" (esse promete sucesso terreno e dinheiro suficiente para comprar lugar no céu); um médico-hospitalar (que tudo cura com "água sagrada do Rio Jordão"), outro que parece videogame, alardeando que há uma batalha letal sendo travada no Brasil e, por fim, juro, um "sertanejo evangélico", que une duas pragas (não bíblicas) que assolam esta nação (não a "nação dos 318").
Além desses, o resto – bota resto nisso – era: RedeTV (entrevistando Bolsonaro), SBT (com o apresentador embebido em formol entrevistando... Bolsonaro), Record (com sua horrenda versão televisiva das Escrituras e entrevistando... Bolsonaro) e a Band (com os pastores Silas Malafaia e RR Soares entre rezas e boletos). No meio delas, um oásis de excelência técnica (premiada em todo o mundo), com um jornalismo de passável para bom: a TV Globo.
Devo confessar que gosto da Globo – talvez porque sempre tenha me pago bem e me dado toda a liberdade criativa. Mas saber que o falso Messias de Brasília e o presidiário de Curitiba, ambos, a odeiam, ah, isso, sim, é o melhor.
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