Outro dia escrevi sobre uma música do Zé Rodrix, “Jonas e a Baleia”. É uma obra de arte, um dos mais trepidantes rocks do Brasil em todos os tempos. A letra é intrigante, a melodia é envolvente, ninguém fica indiferente à história do Mestre Jonas, que não quer sair de dentro da barriga da baleia que o engoliu.
Mas essa nem é a melhor música do Zé Rodrix. A melhor é um dos maiores clássicos da MPB, “Casa no Campo”, que Elis Regina imortalizou com sua voz de metal e mel. Quando ouço Casa no Campo, me emociono. Se estou ouvindo a música sozinho, concentrado apenas nela, sinto a grandeza da poesia em combinação com o arranjo perfeito, e aquele som me bate no peito, e quando a Elis canta:
“Eu quero uma casa no campo
Onde eu possa compor muitos rocks rurais
Onde eu possa plantar meus amigos, meus discos, meus livros
E nada mais”.
Quando ela canta essa estrofe, os olhos marejam.
Sou mesmo um sentimental...
Acontece que o Zé Rodrix é subestimado. Ele era um compositor original, iluminado e cheio de recursos. Mesmo suas músicas mais simples têm algo que faz o ouvinte pensar. Vou tomar como exemplo uma canção que ele compôs no final dos anos 70 e que até alcançou algum sucesso. Chama-se “Quando Será”. Não é um rock rural, como ele gostava; é uma rumba. No refrão, Zé Rodrix pergunta:
“Quando será o dia da minha sorte?
Sei que antes da minha morte eu sei que esse dia chegará”.
Aí está uma ideia é fascinante. O sujeito é uma pessoa comum, nada de excepcional acontece com ele, mas haverá um dia que será único: o dia da sua sorte. Então, tudo vai dar certo, coisas maravilhosas ocorrerão e ele, naquele período, será muito feliz.
Faz sentido termos um dia da nossa sorte, não é? Porque, afinal, a vida é surpreendente. Você faz um plano e a vida vai lá e modifica tudo. De nada adiantou todo o seu cálculo, toda a sua antecipação, a vida quer empurrá-lo para outro caminho. Eu, sabedor disso, faço como os chineses e o Zeca Pagodinho: deixo a vida me levar.
A propósito, certa feita uma gravadora queria que Roberto Carlos interpretasse “Deixa a Vida me Levar”, e ele respondeu:
— A vida não me leva, bicho.
Uma pequena arrogância do Rei. É claro que a vida joga com ele, como joga com todos nós.
Assim, o mais saudável é não se opor, nem se desesperar. O mais saudável é relaxar e aproveitar o que vai acontecendo pelo caminho. Então, lá adiante, quando você estiver no lugar em que a vida quis colocá-lo, você olhará para trás e constatará: “Tive dias da minha sorte. Tive muitos. E foram bons”.