A vacina vem aí, a vacina está chegando. Começou sua jornada na Velha Álbion, que em tudo é pioneira, e daqui a pouco estará se derramando por este solo que um dia foi pisado por Carlos Chagas e Oswaldo Cruz, heróis da medicina mundial. Neste interregno, precisamos nos cuidar. Não vamos ceder justamente agora, que já estamos vendo uma réstia de luz em meio às trevas. Mas...
Mas há algo que é preciso levar em consideração: o “fique em casa” não é mais possível. Não aqui. Não no Brasil. Este país, como qualquer outro, tem suas peculiaridades, sofre suas próprias dores, e elas precisam ser levadas em conta nos processos de decisão das autoridades.
Porque a sociedade não suportaria mais outra temporada de confinamento. As forças estão exauridas, os recursos foram todos consumidos, não existe mais condição de pedir esse sacrifício adicional às pessoas.
Se os governantes tentarem impor o lockdown, fracassarão. Porque os brasileiros simplesmente não obedecerão às restrições. Note: não estou pregando desobediência civil ou coisa que o valha; estou prevendo o que vai acontecer.
Neste momento crucial, os governantes terão de usar a criatividade. Terão de compreender a natureza do brasileiro para poder combater o grande mal sem gerar um mal maior.
Como fazer com que as pessoas possam sair às ruas sem se arriscar? Como fazer com que as atividades necessárias para a sobrevivência continuem sendo exercidas em segurança?A palavra-chave é “aglomeração”.
É preciso dizer ao brasileiro que ele pode fazer quase tudo, menos se aglomerar. A aglomeração é o fruto proibido, é o interdito ancestral. Todas as outras frutas suculentas estão ao alcance da mão, com exceção de uma: a da aglomeração.
Mas é indispensável agir com sabedoria. Porque o brasileiro tem de ser convencido, antes de ser coibido.
O maior exemplo de ação coletiva bem-sucedida no Brasil foi o Plano Real. O lançamento prévio da URV, a Unidade Real de Valor, foi acostumando o brasileiro à nova moeda. Quando chegou a hora de o Real ser implantado, o país estava pronto para aceitá-lo. E a inflação acabou. Se o Plano Real fosse de outro país, ganharia o Prêmio Nobel de Economia, tal a sua genialidade
Essa psicologia tem de ser empregada hoje, neste momento de perigo. A população tem de compreender que basta usar máscara de vez em quando, lavar as mãos sempre e não se aglomerar nunca, que tudo vai dar certo. Alguns poucos meses sem festas, sem bailes, sem passeatas, sem comícios, é só o que se pede. Tudo é permitido, menos aglomeração. Por alguns meses, talvez só até o fim do verão. Falta pouco, acreditem. Olhem para a venerável ilha no além mar e suspirem. A bendita vacina vem aí.