Brizola tinha seus defeitos, todos temos, menos a Irina Shayk, mas havia nele uma grandeza rara. Brizola dedicou sua vida às outras pessoas, em especial aos pequenos brasileiros. Porque Brizola não gostava especialmente da boa mesa ou da bebida. Brizola não amava as mulheres, como Jango, ou o futebol, como Lula. Brizola não se distraía com o cinema, a literatura, a arte ou a música. Brizola, o que ele fazia, o tempo todo, era política. Mas a política com um fim.
Brizola queria salvar as crianças do Brasil.
Para atingir esse objetivo, muitas vezes ele prejudicou até a sua própria trajetória política, como quando fez acordo com Collor em troca da construção de Cieps no Rio de Janeiro. Aquela aliança custou-lhe caro, e o preço foi pago na eleição presidencial de 1994, a que encerrou sua carreira eleitoral.
Falar das crianças emocionava Brizola. Imagine que, quando ele foi governador do Rio Grande do Sul, construiu 6.300 escolas e contratou 40 mil professores. Isso no fim dos anos 50!
Cevo a convicção de que, se Brizola tivesse sido eleito em 1989, viveríamos num país melhor. Ele teria errado bastante, disso também estou convicto, mas salvaria pelo menos uma geração das nossas crianças. Porque acredite, leitor de pouca fé, nenhuma grande nação foi construída sem que se desse atenção diferenciada a uma instituição: a escola pública.
Não é a indústria, a tecnologia, a riqueza de recursos naturais, a excelência das universidades ou a capacidade dos políticos que torna um país justo para a sua população. É a escola pública.
Com boas escolas públicas, os povos da Europa, dos Estados Unidos, do Canadá, do Japão, da Coreia do Sul, de Israel e da Oceania elevaram sua compreensão do mundo e seus padrões de exigência. Se o homem tiver uma educação básica de qualidade, terá o controle da própria vida. E não se submeterá facilmente à servidão. É por isso que as grandes empresas abrem filiais na periferia do mundo – porque nesses lugares a mão-de-obra é barata, o regime de trabalho é quase servil, e só é assim porque esses países oferecem ensino básico de baixo nível, o que mantém as massas submersas na ignorância, prontas para aceitar quaisquer migalhas para sobreviver.
A China ainda é o maior fornecedor desse tipo de trabalhador, egresso do interior atrasado do país, mas lá os níveis de educação se elevam a cada ano. Logo, os chineses terão um papel de maior protagonismo no cenário econômico e novos mercados de semiescravos terão de ser abertos no planeta.
E o Brasil? Teria o Brasil energia e competência para construir um bom sistema de escolas públicas, escolas em que as crianças entrassem de manhã e saíssem à noite, com corpo e espírito bem tratados e alimentados? Teríamos consciência e sabedoria para fazer esse tipo de escolha? Pois tudo na vida são escolhas. Agora mesmo, o Estado brasileiro teve o juízo de optar pela ajuda às pessoas mais pobres durante a crise do coronavírus. Esses R$ 600 mensais estão garantindo a sobrevivência de muitas famílias no país, e há quem defenda que o auxílio emergencial se torne permanente.
Não tenho dúvida de que, enquanto continuarem as restrições causadas pela pandemia, terá de continuar também o auxílio. Mas, depois que o Mal passar, que tal direcionar recursos e empenho para a escola pública? Poderíamos fazer essa escolha. Poderíamos decidir que permanente, de fato, seria a formação de cidadãos no Brasil.