Cinco minutos depois de publicar minha coluna em GaúchaZH, no começo da tarde ensolarada deste domingo (19), o prefeito Nelson Marchezan me ligou. Queria, obviamente, falar sobre o que eu havia escrito. Que, em resumo, foi acerca de uma espécie de conceito que se formou no Estado, com a pandemia do coronavírus: o de que a população é a culpada pelo aumento dos casos da doença, enquanto todas as medidas tomadas pelos governantes são sensatas e sábias.
Marchezan não fez uma contestação; fez uma explanação. Tentarei resumi-la aqui. Mas, para aprofundá-la, marquei com ele uma entrevista para o Timeline desta segunda-feira (20), na Rádio Gaúcha.
Marchezan diz que não põe a culpa na população. Ao contrário: ele compreende que, depois de quatro meses de sacrifícios, as pessoas simplesmente não tenham mais condições de ficar em casa. Não por desgaste psicológico ou por aborrecimento, mas porque elas têm de sobreviver. Ele sabe que o pequeno comerciante, que a diarista, que o profissional liberal e tantos outros mais precisam trabalhar para pagar suas contas, alimentar a família e cuidar da saúde, que nem sempre é abalada apenas pela ameaça do coronavírus.
Ele entende tudo isso.
Mas...
Esse “mas” é decisivo. Marchezan apresentou um histórico. O isolamento que começou em março obteve um resultado que não está sendo atingido agora. E isso não é devido à propalada indisciplina da população, como acreditam alguns, mas porque, como observei acima, as pessoas têm de sair de casa para sobreviver. Quer dizer: mesmo que haja consciência de que é preciso ficar em casa, mesmo que haja coerção por parte do poder público, obrigando os cidadãos à imobilidade, eles dificilmente obedecerão, porque a necessidade os força a trabalhar.
No entanto, o sistema de saúde está no limite, irá colapsar em breve. Se não houver leitos de UTI para todos, Marchezan teme que aconteça o que aconteceu na Lombardia, onde os médicos intensivistas tinham de escolher quem sobreviveria e quem morreria.
Essa é a situação atual. Como já discorri de sobejo a respeito do que houve antes de chegarmos a esse ponto, quero me concentrar no que haverá depois. No futuro próximo. Porque tudo indica que entraremos em lockdown. Foi o que deduzi da conversa com Marchezan, embora ele não queira ter a autoria da proposta.
— Essa tem de ser uma decisão da cidade — observou. — A cidade tem de compreender que talvez seja melhor tomar um remédio mais amargo e mais forte agora, durante uma ou duas semanas, para relaxar depois.
Marchezan vai tentar trabalhar por esse convencimento. Eu o ouvi no começo da tarde ensolarada deste domingo, vou ouvi-lo amanhã, no rádio, mais uma vez. Espero que você ouça também, para fazer seu próprio julgamento e tomar a sua decisão. Estamos passando, talvez, pelo momento mais grave da história de Porto Alegre. Mais do que nunca, precisamos ouvir, falar e pensar para saber o que decidir.