A minha ideia com isso de ficar vivo é continuar envelhecendo. Esse é o objetivo. Sei que, tecnicamente, ainda não posso ser considerado um idoso, mas quero sê-lo. Portanto, não concordo com as críticas à velhice. Velhice é coisa boa e desejável.
Claro, há contingências físicas. Com certa idade, você não pode mais marcar por pressão. Também há alguma perda de flexibilidade, o que pode tornar os agachamentos movimentos perigosos. Você agacha e depois não sobe mais.
Mas, em geral, ficar velho é bom, porque o livrará de coisas que teria de fazer se fosse jovem. Dançar, por exemplo. O jovem dança. Nunca gostei de dançar, principalmente em casamentos. É uma depressão ver aqueles caras dançando de paletó e gravata, e as mulheres de longuinho.
Há exceções, é evidente, com destaque para os momentos em que já bebi um ou dois chopes e aí resolvo exercitar toda a minha manemolência - não é à toa que era chamado de "O John Travolta do IAPI".
Infelizmente, mulheres adoram dançar e vivem reivindicando isso. A Marcinha quando nos conhecemos fez a pergunta que todas as mulheres fazem ao conhecer alguém por quem se interessam:
- Tu gosta de dançar?
Eu:
- Claaaaaro...
Tempos depois, nós já casados, ela cobrou:
- Quando te conheci, tu disse que gostava de dançar!
Fiquei espantado:
- Que falta de sensibilidade! Não percebe que eu estava tentando te conquistar? Se um homem diz a uma mulher que não gosta de dançar, ele é desclassificado! Não sabia disso? Onde está o teu romantismo?
Francamente.
Bem. Depois de determinada idade, você não precisa mais dançar. Ninguém espera que você saia por aí rebolando, os bracinhos para cima, fazendo urru. Um alívio.
Outra coisa: ir a show. É muito aborrecido ir a show, sobretudo em estádios de futebol. Você consome horas do seu dia para ouvir música de pé e beber cerveja morna em copo de plástico. O que não significa, óbvio, que não apreciei alguns shows na vida. O do Paul McCartney, por exemplo, foi tão bom que nós saímos do estádio meio que flutuando pela noite porto-alegrense. E, em Boston, vi o Billy Joel no Fenway Park, o estádio do Red Sox, o mais antigo das Américas, e gostei muito. Mas foram exceções. Em geral, shows, como quaisquer outros ajuntamentos de seres humanos, são um incômodo suarento.
Então, se alguém me convida para um show de estádio, quase sempre alego:
- Não tenho mais idade pra isso...
Gosto de ficar em casa, essa é a verdade. O que, por fim, me leva a fazer a confissão que motivou essa crônica: é que não estou passando tão mal assim no confinamento. Sei que, por solidariedade com os amigos que estão angustiados, devia mentir, devia dizer que sofro. Mas não sofro. Às vezes até faço uma queixa, dou uma reclamada. Mas é fake. Reclamação fake. Sinto falta do bar: certo. Sinto falta dos amigos: certo também. Mas não me desespero. Ao contrário, sou um confinado feliz. Uma vergonha. Deve ser por causa da idade.