Conversei com Sergio Moro por telefone no final da tarde de domingo passado (26). Como ele não concordou em conceder entrevista, não entrarei em detalhes a respeito do conteúdo do que falamos. Conto apenas que Moro me pareceu bastante tranquilo e preparado para o que chamou de "judicialização" das revelações que fez ao sair do governo. Tratando-se de um juiz com 22 anos de experiência, isso significa que virão à superfície informações no mínimo consistentes acerca desse tema nos próximos dias.
Aguardemos.
Mas houve outro ponto que chamou a minha atenção, e é a respeito disso que quero tratar. É que Moro se disse impressionado com "a quantidade de mentiras" que vêm sendo espalhadas sobre ele nas redes sociais. Para mim, isso foi notável, porque estamos falando do juiz que passou cinco anos coordenando a Lava-Jato, nada menos do que a mais importante operação judicial da história do Brasil.
Realmente, nos últimos três dias o volume de notícias falsas que se derramou internet abaixo foi assustador. É uma praga do nosso século, uma peste tão insidiosa quanto o coronavírus, porque as pessoas moldam suas opiniões a partir dessas mentiras, e uma opinião só é inofensiva até se transformar em ação.
Eis o grande drama: é tamanho o fluxo de notícias falsas, que as pessoas acabam se convencendo da sua veracidade, e formam opinião, e a opinião se torna comportamento, e o comportamento se torna ação.
Participo de muitos grupos de WhatsApp. Eles têm composição heterogênea, tanto de classe social quanto de posicionamento político. É instrutivo, porque mostra as diversas realidades do país. Uma dessas realidades é a dos bolsonaristas, que, quando divisam um alvo, atacam em forma de enxame, aferroando de todas as maneiras com mentiras inteiras ou meias verdades.
É o que acontece agora com Moro.
Se você recolher alguns punhados dessas publicações que pipocam em grupos de Whats desde sexta, constatará que elas não saíram dos bueiros do mundo virtual por acaso. É algo feito de caso pensado, em proporções industriais, muitas vezes com qualidade profissional. E isso vai se espargindo, se infiltrando na sociedade, criando raízes, transformando-se em parte da paisagem. Logo, também vira um tipo de realidade, e aí não adianta mais reagir. Ninguém tem como passar a vida dando explicações ou desmentindo boatos.
Tudo isso é muito perigoso, e não estou me referindo só ao caso de Sergio Moro. Esse é um único exemplo, há muitos mais por aí.
Há fake news de todos os vieses políticos e ideológicos, mas os bolsonaristas são mais suscetíveis a elas, porque eles realmente adotaram as redes sociais como principal fonte de informação. Não é à toa que as pessoas que assistiram à posse de Bolsonaro na Presidência da República, em Brasília, gritavam:
– WhatsApp! WhatsApp! Facebook! Facebook!
Não era só um repúdio à chamada "mídia tradicional". Era uma manifestação de adesão a uma nova percepção da realidade, em que só tem valor aquilo em que a pessoa quer acreditar. Não interessa o que dizem os fatos, interessa é o que se diz deles.
O consumidor de fake news bebe com avidez daquelas informações falsas porque elas dão verossimilhança à sua visão de mundo. Com ele é inútil usar a lógica ou mostrar o que está acontecendo. Ele tem sua própria lógica, ele enxerga o que decidir ver.
Crentes religiosos ou políticos, de esquerda ou de direita, enfrentam desilusões com bravura. Nada os abala. Eles batem no peito, eles cerram os punhos, eles vão em frente. De olhos bem fechados.