Será que agora os ladrões de Porto Alegre vão começar a assaltar restaurantes?
Sexta-feira à noite um restaurante mexicano da cidade foi assaltado. Havia 60 clientes no lugar. Os bandidos chegaram, anunciaram o assalto e passaram a recolher carteiras e celulares. Uma moça que demorou a compreender o que estava acontecendo levou um tapa, mas não houve mais violência. Os assaltantes foram de mesa em mesa, recolhendo celulares e carteiras e colocando tudo em um saco de pano. Depois de 20 minutos de terror, saíram agradecendo pela colaboração.
Entre os clientes se encontrava o vereador Valter Nagelstein e sua família. Nagelstein é defensor da liberação das armas. Ontem, a repórter Adriana Irion o entrevistou para GaúchaZH. O vereador reconheceu que, se alguém estivesse armado naquele momento, poderia haver uma tragédia. Os ladrões reagiriam e, como sempre, os inocentes pagariam a conta. Mesmo assim, ele continua defendendo o porte de armas "desde que haja treinamento". Como se vê, o vereador é um otimista. Acredita que o treinamento dará, ao homem armado, não apenas a destreza, mas o equilíbrio e o bom senso.
Antes que os machos defensores das armas se levantem para atirar em mim, ressalto que não sou contra a POSSE de armas restrita a residências. Contra o PORTE, sim. Mil vezes sim. Ocorrências recentes, como o assassinato de uma família inteira na zona sul de Porto Alegre, demonstram com clareza o que pode acontecer quando pessoas andam armadas pelas ruas. Os Estados Unidos, país em que há quase tantas armas quanto habitantes, propicia fartos exemplos disso. Os Estados mais seguros, como Massachusetts, onde vivi, são os que impõem as maiores restrições às armas.
Mas o que mais interessa, no momento, é a pergunta que fiz no começo da crônica: será que agora os ladrões de Porto Alegre vão começar a assaltar restaurantes? O próprio Valter Nagelstein disse, na entrevista, que tentará evitar os restaurantes de rua. Ou seja: irá apenas a shoppings.
É quase uma sentença de morte para a cidade. Porto Alegre já teve uma noite feérica, que encantava os forasteiros. Os hábitos noturnos dos porto-alegrenses eram parecidos com os dos argentinos, dos uruguaios e dos espanhóis. No fim de semana, você saía de casa à meia-noite e percorria uma cidade iluminada, colorida e feliz, que, não raro, só ia dormir ao amanhecer.
A partir dos anos 90, o medo foi, paulatinamente, trancando as pessoas em casa. As ruas restaram para os bandidos e os temerários. Quando um cidadão sai para jantar, fica tenso ao descer do carro e ao entrar no carro, fica tenso ao parar debaixo de um semáforo e ao acionar a porta da garagem de casa. Será que ficará tenso também dentro dos restaurantes? Será que não há lugar em que o porto-alegrense possa viver uma vida normal, em paz?
As autoridades do Estado têm de tomar o caso deste assalto como um símbolo e um cavalo de batalha. Têm de se manifestar a respeito, têm de traçar um plano e, principalmente, têm de agir, para dar alguma garantia à população. Ou as pessoas farão como querem os amantes de armas: vão reagir por conta própria.
E, como sempre, os inocentes pagarão a conta.