Há pessoas que abraçam árvores. Compreendo-as. As árvores são os seres vivos mais majestosos do planeta. E os mais velhos também. Li, na semana passada, que em Portugal foi descoberta uma oliveira com 3.350 anos de idade. Vi fotos dela. Tem o tronco fendido, como se estivesse sobre duas pernas. Se alguém quiser, pode se abrigar dentro de seu corpo. Oliveira do Mouchão, esse o seu nome. Está plantada em Cascalhos, na freguesia de Mouriscas.
Fiquei pensando no que acontecia de importante no mundo há 3.350 anos. Mais ou menos por essa época, Moisés vagava pelo deserto com os hebreus que havia tirado da escravidão. Pouco tempo antes, egípcios e sumérios desenvolveram a invenção mais revolucionária da História: a escrita.
Já então a Oliveira do Mouchão fazia impávida, do outro lado do mundo, o que sabe fazer: dava frutos. E aí está algo extraordinário: ainda hoje a Oliveira do Mouchão continua produzindo azeitonas. Que sabor terá esse azeite de oliva?
Mas a Oliveira do Mouchão não é a árvore mais antiga da Terra. Aqui, nos Estados Unidos, há sequoias contemporâneas a ela. Uma, que se chama Presidente, tem 75 metros de altura, tão grande, que ninguém conseguia fotografá-la por inteiro. A National Geographic contratou uma equipe de fotógrafos alpinistas que realizou o feito anos atrás.
Uma outra sequoia, a General Sherman, é ainda mais alta: tem 83 metros. O general Sherman humano é um dos personagens mais interessantes da história americana. Era um cara durão. Na Guerra Civil, adotou a política de terra arrasada: destruía plantações, casas, tudo o que via pela frente. Quando tomou Atlanta, o prefeito implorou para que poupasse a cidade. Sherman rosnou:
– A guerra é um inferno.
E mandou incendiar a cidade. Você assistiu a E o Vento Levou? Lembra da cena de Tara em chamas? Aquilo foi obra do general Sherman.
Talvez a grande sequoia da Califórnia devesse ter um nome mais pacífico. De todo modo, já escrevi isso e escrevo de novo: ainda quero ir ao Parque das Sequoias Gigantes e tocar na casca poderosa da general Sherman com minhas próprias mãos.
Usei o adjetivo “poderoso” para me referir à sequoia, mas posso estar errado. Que poder uma árvore tem, mesmo sendo milenar?
Uma árvore imponente resistiu por 50 séculos, até que um ser humano, um único, insignificante, minúsculo ser humano a assassinou
Uma vez, um cientista foi tentar estabelecer a idade de um pinheiro americano que se imaginava antiquíssimo. A forma mais segura de fazer esse trabalho é contar os anéis do tronco, cada um equivalendo a um ano. Mas como cumprir a tarefa sem cortar o tronco? Para tanto, eles se valem de uma espécie de furadeira muito fina e sensível, que entra na árvore sem decepá-la. O cientista estava usando-a no pinheiro, quando ocorreu um acidente: a furadeira quebrou dentro do tronco. Tratava-se de um equipamento caro, era preciso resgatá-lo. E agora? Pois o maldito cientista DERRUBOU A ÁRVORE para recuperar a furadeira! Depois, contou os anéis do tronco e descobriu que o pinheiro que acabara de matar tinha CINCO MIL ANOS! Uma árvore imponente resistiu por 50 séculos, até que um ser humano, um único, insignificante, minúsculo ser humano a assassinou em troca de uma furadeira.
Imóveis e silenciosas, as árvores correm riscos tendo-nos por perto. Por essa razão, admiro quem as abraça, embora eu mesmo nunca tenha abraçado uma. Mas há um carvalho bem aqui, na frente da minha casa, um carvalho de tronco espesso, que três homens de mãos dadas não conseguiriam cercar; ele é mais alto do que um prédio de sete andares e parece ser mais velho do que quaisquer outros seres vivos desta cidade; esse carvalho, eu o vejo todas as manhãs, enquanto tomo café, e todas as noites, quando olho pela janela antes de deitar; esse carvalho sustenta em seus galhos nus a neve branca do inverno e, no verão, torna-se bojudo de folhas verde-escuras; esse carvalho, no outono, assume sua forma mais bela, quando suas folhas ficam amarelas e vermelhas e cor de laranja; esse carvalho abriga esquilos e passarinhos o ano inteiro e, nos poucos dias quentes, já vi um casal de gambás descansando debaixo dele; esse carvalho, por algum motivo, sinto-o como um protetor desta casa e de tudo o que há em volta. Por que será que sinto isso, se as árvores não têm de fato poder nenhum? Não sei, mas um dia, antes de me mudar daqui, ainda vou me pôr ao pé desse carvalho e abraçá-lo e sentir no rosto o contato áspero de sua casca e sussurrar:
– Obrigado.