O destaque do Carnaval 2019, não resta brisa de dúvida, foi o flamante presidente Jair Bolsonaro. O homem gosta da folia. Há uma pedregosa reforma da Previdência em discussão, a economia ainda não se recuperou, o desemprego aumentou, o pacote da segurança pública continua sendo debatido, escolas e hospitais públicos estão em ruínas, empresários e trabalhadores têm questões acerca das leis trabalhistas, mas o presidente da República se preocupa, mesmo, com um sujeito que faz xixi em outro em um bloco de rua.
Se você, distraído leitor, não sabe, relato: Bolsonaro postou em uma rede social um vídeo de um homem que enfia o dedo em seu ânus (o dele, não o do presidente), depois do que se agacha, enquanto outro se aproxima, tira o membro para fora e urina em sua cabeça. Segundo Bolsonaro, "é isso que têm virado muitos blocos de rua no Carnaval brasileiro".
Meu filho viu o vídeo que ele postou. Outras crianças devem ter visto – hoje todas têm acesso à internet. O Bernardo veio me contar:
– Papai, o Bolsonaro postou um vídeo pornô. O presidente da República pode postar vídeo pornô?
Claro que pode, guri. É isso que está ocupando a cabeça do presidente, é disso que ele quer falar, que fale! Censura nunca mais!
No dia seguinte, não satisfeito com a repercussão (inclusive internacional) da sua postagem, Bolsonaro publicou uma pergunta singela no Twitter:
Aaaah, presidente, nós sabemos que você sabe o que é…
Para você, perplexo leitor, que não tem ideia do que seja essa prática divulgada para o mundo todo pelo presidente do Brasil, informo: golden shower, ou chuva dourada, é o ato de um ser humano urinar sobre outro. Tem quem goste.
Que o nosso Carnaval se torne lei em todo o país! Que cariocas, paulistas, pernambucanos e baianos façam a maior festa nacional com ordem e método! Assim, quem sabe, o presidente começará a administrar o Brasil.
Mas o que realmente importa é o desassossego manifestado pelo mandatário maior da República com o tema. Tamanha inquietação indica que ele pretende moralizar nosso Carnaval. Como o fará? Tenho cá uma sugestão: olhe para o Rio Grande, presidente! Doravante, obrigue por decreto os foliões a seguirem as estritas normas do Carnaval Gaúcho de Salão.
Talvez o presidente, por ser de plagas distantes, não conheça as regras do Carnaval Gaúcho de Salão. São poucas, porém rígidas. Ei-las:
1. No Carnaval Gaúcho de Salão, os foliões "pulam" em círculos. Um, maior, externo, que gira no sentido horário. Outro, interno, que gira no anti-horário.
2. Os foliões "pulam" aos pares. Em geral, abraçados e com os indicadores que não estão apoiados nos ombros do cônjuge apontando para o firmamento. Se o folião não estiver abraçando ninguém, os indicadores devem fazer movimentos harmônicos para cima e para baixo de forma alternada, de modo que, quando o indicador direito estiver em cima, o esquerdo estará embaixo, e assim sucessivamente.
3. Na hora do frevo (tará-tará-tará-tará! Tarararararará!), pode-se jogar as pernas para frente, como se fossem chutes, mas tenha cuidado para não atingir o folião da dianteira, ou ele se virará para você e reclamará, com toda a razão:
– Pula direito, rapaz!
4. Se você quiser brincar, deve aproximar-se de uma moça e convidá-la:
– Vamos pular?
Se ela topar, gol do Brasil. Vocês, então, se aproximarão da roda maior e esperarão por uma brecha para participar do baile. É como entrar na preferencial na hora do pique, é preciso encontrar alguém solidário que dê espaço.
5. Quando o Carnaval Gaúcho de Salão chega ao fim ou faz uma pausa, toca sempre Bandeira Branca. Aí, todo mundo reduz o ritmo da "pulada" até praticamente caminhar pelo recinto.
Como se pode constatar, o Carnaval Gaúcho de Salão tem algo de militar, o que só pode agradar ao presidente da República.
Que o nosso Carnaval se torne lei em todo o país! Que cariocas, paulistas, pernambucanos e baianos façam a maior festa nacional com ordem e método! Assim, quem sabe, o presidente começará a administrar o Brasil.