Tudo o que se faz com a batata se faz com o aipim. Já disse essa verdade universal e digo de novo sempre que posso, como uma afirmação de brasilidade. Porque aipim é Brasil-sil-sil. Dilma estava certa ao saudar a mandioca, que a mandioca merece.
Lembro de ter aprendido sobre a lenda da mandioca na escola: Mani era uma linda menininha tupi que se destacava na tribo por ter pele branca de leite. Todos os índios gostavam dela, brincavam com ela e se alegravam com ela. Mas, um dia, sem motivo aparente, Mani adoeceu. O pajé correu a tratá-la com ervas e fumos, mas a doença não cedia. A tribo inteira se mobilizou para tentar curá-la. Nada adiantou. Mani morreu em silêncio e sem dor, como um passarinho que simplesmente deixa de existir.
Porque o mundo não sabe, e nós sabemos: aipim é melhor do que batata.
Como era costume entre a tribo, Mani foi enterrada no chão da oca em que viveu. Seus pais, desolados, pranteavam dia e noite sobre sua sepultura. Com suas lágrimas e sua saudade, regaram o solo que a guardava. Depois de alguns dias, como por milagre, uma planta brotou no local. Eles puxaram a raiz e viram que era marrom por fora e branca por dentro. Branca como a pele de Mani. Então, chamaram a descoberta de Manioca, porque Mani estava na oca. Donde, mandioca. Foi a mandioca que, sendo cozida, matou a fome da tribo, que passava por tempos difíceis.
Aí está mais uma prova do que digo, que o que se faz com a batata se faz com a mandioca. Porque a batata serviu para matar a fome de muitos países europeus pobres, depois de ter sido levada das Américas pelos navegantes ingleses, no século 16.
Talvez por essa razão, europeus e americanos amem a batata com tanta devoção e desconheçam o aipim. Ou a mandioca. Ou a macaxeira. Aqui, nos Estados Unidos, nenhum restaurante serve qualquer prato com mandioca e não há mandioca nos mercados, a não ser os brasileiros. É num desses, numa cidadezinha perto de onde moro, chamada Allston, que me abasteço.
A mandioca vem dentro de um saco enorme, de três quilos, e, felizmente, se apresenta descascada, alva como a pequena Mani. Levo-a, pois, para casa e a deposito em uma grande panela com água, para ferver. Mas a mandioca não cozinha na primeira fervura, ela resiste como uma defesa formada por Kannemann e Geromel. Você tem de experimentar a consistência dela com um garfo, enquanto a água borbulha. Mas não a retire quando estiver macia. Não. Ela precisa estar molezinha, quase se desmanchando. Só que, ATENÇÃO!, não deixe desmanchar. Não! Nunca! Porque, neste caso, ela pode se desintegrar, e nós a queremos coesa. Assim, há que se ter calma e critério. Vá testando com o garfo. Testando e testando. Quando o corpo da mandioca estiver quase em pasta, porém ainda inteiro, retire-a. Deixe a água escorrer. Deixe-a secar.
Enquanto isso, prepare a frigideira. Ponha-a no fogo. Unte-a generosamente com manteiga. E frite as barras da mandioca com muito critério e doçura, até que ela fique com a cor exata das pernas de Gisele Bündchen, não mais morena nem mais pálida.
Pronto. É só temperar com sal a gosto, tirar aquela cerveja que você deixou no freezer e fazer como fiz outro dia: sirva a um americano que jamais provou aipim. Ou mandioca. Ou macaxeira. Ele dirá, inevitavelmente, como disse o meu amigo americano:
– OH, MAI GOD!
Nesse momento, será como se estivesse sendo executado o Hino Nacional. Como se as escolas de samba do Rio, todas, estivessem tocando na sua sala de jantar. Neste momento, foi gol do Brasil. Porque o mundo não sabe, e nós sabemos: aipim é melhor do que batata. Admito que é polêmico, já imagino a repercussão entre os amantes da batata, já vejo os protestos nas redes sociais, mas repito e repetirei sempre, com orgulho pátrio: aipim é melhor do que batata!