"Infelizmente, o Brasil perdeu muito da doçura e da alegria. E você não faz coisas verdadeiramente boas e relevantes sem alegria."
A frase não é minha. É do publicitário Washington Olivetto, em entrevista concedida à Folha de S.Paulo, dias atrás.
Washington Olivetto, você deve saber, era dono da mais icônica agência de publicidade da América do Sul, a W/Brasil, cantada pelo Jorge Ben Jor naquele seu clássico de letra criptográfica. "Alô, alô, Dáblio Brasil! Alô, alô, Dáblio Brasil! Jacarezinho! Avião!"
A entrevista é ilustrativa. Olivetto acerta em vários pontos da análise que faz sobre o Brasil, em especial esse que destaquei. Mas não chega a pisar no terreno pedregoso das motivações. Não responde à questão que corta: "Por que o Brasil perdeu muito da sua doçura e da sua alegria?".
A internet mudou os humores no mundo todo e deixou todos os céus mais cinzentos
Isso não é algo que aconteça de um ano para outro. Isso se faz devagar. No caso do Brasil, nem tão devagar assim, porque a mudança se deu na era das redes sociais. A internet fez com que as pessoas conhecessem as opiniões umas das outras e, sobretudo, fez com que as pessoas pudessem criticar as opiniões umas das outras.
Todo mundo é ombudsman do próximo no Brasil. Antes da internet, você só se envolvia em discussões improdutivas e idiotas em mesa de bar, e só com meia dúzia de amigos já meio altos. A discussão começava depois do terceiro chope e, nos casos mais graves, terminava quando se rachava a conta. Agora, as discussões improdutivas e idiotas explodem de minuto em minuto, são travadas ardentemente por amigos, parentes, conhecidos e desconhecidos, e se estendem ao infinito e além, como diria Buzz Lightyear.
Mas o que produz a amargura não é a diferença de opiniões; é a importância das opiniões. Hoje você tem um painel onde pendura a sua opinião. As pessoas passam por ali e leem o que está escrito. E julgam. Julgam não apenas a opinião, mas também o dono dela. Não raro, concluem: "O cara que diz isso é um imbecil". Ou seja: você e sua opinião se confundem, vocês estão sob análise. Se sua opinião é imbecil, você será imbecil. Se for genial, você será genial.
Todo mundo quer ser genial. Então, você se empenha, argumenta com força e, quando esbarra na opinião alheia, tenta espicaçá-la e transformá-la numa pasta de carne e sangue, a fim de provar que você, sim, é quem sabe das coisas, é quem tem boas opiniões, é quem é genial.
Houve um movimento de fora para dentro: o canal de divulgação das opiniões contaminou a qualidade das opiniões. A sua opinião, agora, não é mais só sua, ela é publicada, vira editorial, faz parte de você.
É importante.
Esse fenômeno não é apenas brasileiro, a internet mudou os humores no mundo todo e deixou todos os céus mais cinzentos. Mas, no Brasil, a amargura é mais rascante, a ferida dói mais. Porque houve outros ingredientes. Dos quais falarei amanhã.