Quando se pôs diante do túmulo de Alexandre pela primeira vez, Júlio César chorou. Porque, deitado na sepultura, jazia um homem que, antes dos 33 anos de idade, já conquistara o mundo, enquanto ele era tão mais velho e mal havia iniciado essa façanha pela todos os romanos ansiavam.
O que faria César se estivesse em frente à estátua que Renato Portaluppi certamente ganhará em sua homenagem, se levar o Grêmio à conquista do mundo agora, em 2017? Nem as artes de amor de Cleópatra poderiam consolar o humilhado César, pois com a mesma idade em que ele, César, morreu, 55 anos, Renato pode conquistar o mundo pela segunda vez, um feito que assombraria até Alexandre.
Mas não será fácil. Em primeiro lugar porque, antes de chegar à batalha decisiva, o Grêmio tem de vencer o jogo desta terça-feira, contra o Pachuca, do México. E é esse o grande perigo, é esse o grande temor. Porque não há como contar a história do Grêmio sem falar no Inter, assim como não há como contar a história do Inter sem citar o Grêmio. Eles estão de tal maneira relacionados que, às vezes, parecem uma coisa só.
Acontece que, todo mundo sabe, uma das maiores frustrações do Inter foi o chamado "Mazembe Day". Em 14 de dezembro de 2010 o Inter estava onde o Grêmio está hoje: numa semifinal do Mundial Interclubes disputada nos Emirados Árabes. Como os gremistas de agora, os colorados da época pensavam apenas nas glórias futuras, em tudo de grandioso que viria com a possível conquista do mundo. Mas o Mazembe surpreendeu, ganhou o jogo e decidiu o título com a Inter de Milão. Pelos seis anos seguintes, até o Grêmio chegar ao Tri da Libertadores, semanas atrás, esse foi o maior trunfo dos gremistas na eterna disputa Gre-Nal, ao passo que, para os colorados, a palavra "Mazembe" tornou-se maldita.
Hoje, 12 de dezembro de 2017, o sonho dos milhões de colorados ora silenciosos e doloridos é transformar essa data em um "Pachuca Day". Se isso acontecesse, o ambiente mudaria, no Rio Grande do Sul - o fim de ano não seria mais azul, preto e branco, como vem sendo desde que o Grêmio bateu o Lanús na Argentina. O vermelho se anunciaria no horizonte e os colorados diriam que houve um "Pachucaço".
No futebol, como na vida, é assim: tudo pode mudar rapidamente. O poetinha Vinicius de Moraes deu-se conta disso há quase 80 anos, quando, a bordo de um transatlântico que o levaria para a Inglaterra, apoiou-se na amurada do navio, olhou para a costa brasileira que se distanciava, suspirou ao pensar na amada que deixava em terra e compôs, ali mesmo, versos belos e tristes, que choravam:
"De repente, do riso fez-se o pranto
Silencioso e branco como a bruma
E das bocas unidas fez-se a espuma
E das mãos espalmadas fez-se o espanto.
De repente, da calma fez-se o vento
Que dos olhos desfez a última chama
E da paixão fez-se o pressentimento
E do momento imóvel fez-se o drama."
De repente, as coisas mudam, no futebol. Muitas vezes por um detalhe, por uma desatenção ou por um golpe de sorte. O pé levantado do goleiro Galatto criou o épico da Batalha dos Aflitos. O balão que Renato deu da bandeirinha de escanteio e encontrou a cabeça de César conquistou a América, em 1983. Aliás, César. Mais um César. Aquele de dois mil anos atrás, ao atravessar o Rubicão para entrar em Roma, proclamou:
– Alea jacta est!
A sorte está lançada!
A sorte está lançada para o Grêmio.
César contou com ela, foi, viu e venceu. Renato também tem tido sorte. É um vencedor. Mas é preciso cuidado, muito cuidado para que a sorte não mude de repente. Não mais que de repente.