Os camponeses de Zapata marchavam, desde a Província de Morelos, entoando pelo caminho de pedra e pó:
– Tierra! Tierra!
Os esfomeados de Paris exigiam, diante das 2.153 janelas do Palácio de Versalhes:
– Pão! Pão!
Os colonos que queriam se desquitar da Inglaterra, na origem dos Estados Unidos, clamavam:
– Liberdade! Liberdade!
E agora o povo brasileiro lança na atmosfera um novo grito, único na história da humanidade:
– Queremos general! Queremos general!
Era o que imploravam os manifestantes que invadiram o Congresso nesta semana. Eles tomaram a Casa que os representa para pedir o seu fechamento. Reivindicavam a volta da ditadura, o que significa que, provavelmente pela primeira vez em 10 mil anos de civilização, um povo pede para ser oprimido. Não queremos ter voz! Falem por nós! Calem-nos!
É notável, sem dúvida. E talvez eles estejam certos. Talvez nós tenhamos de desistir da democracia. Porque, no fundo, no fundo, o brasileiro não se adaptou a esse negócio de governo do povo, para o povo, pelo povo.
É, de fato, algo difícil de compreender.
Observe, por exemplo, os Estados Unidos, que nasceram democratas. Jovens americanos do século 21 protestam nas ruas porque o candidato deles não foi eleito, pregam mudança nas regras do jogo e asseguram que Trump não é o presidente deles. Ou seja: a nova geração americana não sabe mais o que é democracia.
No Brasil, nenhuma geração jamais soube. Alguém poderá argumentar que muita gente está criticando a ação dos saudosos da ditadura, o que seria uma prova dos profundos sentimentos democráticos desse país tropical. Certo. Agora imagine que, em vez de 50 desmiolados ansiando por serem comandados por um militar, o plenário tivesse sido invadido por 50 estudantes protestando contra a PEC do teto dos gastos. O que aconteceria? Os pais escreveriam no Facebook sobre o orgulho que sentem dos filhos rebeldes, artistas da Globo os elogiariam no Instagram, Chico Buarque faria uma música em homenagem as heróis da educação brasileira.
No entanto, a afronta à democracia seria a mesma. Não interessa a causa defendida. Nenhuma causa justifica invasão do Congresso, ou de qualquer Assembleia ou Câmara de Vereadores, nenhuma causa justifica bloqueio de rua, ocupação de prédio público ou a mais amena espécie de vandalismo.
A lei é a base e o cimento da democracia. Quando a lei é descumprida em nome da justiça, ou do que se acredita que seja justiça, a Justiça com jota maiúsculo é profanada.
O brasileiro não entende isso. O brasileiro não entende a democracia. Nunca entendeu. Por isso, os invasores do Congresso estão certos. Deveríamos voltar às origens. Deveríamos escolher um rei. Somos monarquistas na alma, temos o Rei Roberto, o Rei Pelé e o Rei Momo. Por que não um rei de fato e de direito? Tenho até um candidato. Na falta de um Bragança, podemos escolher alguém que tenha sobrenome vindo de alguma cidade da pátria-mãe Portugal e nome de algum rei bem-sucedido do passado. A cidade portuguesa deveria ser... tipo assim... a capital universitária do país. Qual é mesmo? Coimbra! E o rei, o ideal seria um rei amado por Deus, o maior herói da Bíblia. Quem foi mesmo? David!
Eis!
Não gritem mais "queremos general". Gritem:
– Sois rei! Sois rei! Sois rei!