É realmente uma irresponsabilidade dos gestores das redes sociais permitir a livre circulação de mentiras – impressiona a multiplicidade de áudios e vídeos espalhando informações falsas. Que tristeza dá ouvir essa torrente de asneiras, pensando no mal que faz para as pessoas que ouvem e acreditam, no risco em que se colocam. O áudio ou vídeo vem de uma pessoa dos seus contatos, às vezes um familiar, mas nem sempre se consegue chegar ao verdadeiro responsável. Outras vezes, a mensagem vem daqueles que ocupam – ou ocupavam – altos cargos no governo, incitando medo e ódio. Ao invés de trazer a informação que pode salvar a vida de alguém, multiplicam mentiras que podem terminar em tragédia.
Uma mentira pode ser repetida tantas vezes que podemos começar a duvidar se não seria verdade. Se alguém recebe muitas mensagens dizendo que as escolas fazem lavagem cerebral ou que as universidades são antros de comunistas plantando drogas, quanto tempo vai levar até alguém com problemas mentais ataque uma escola? Estamos hoje vivendo isso. O objetivo dessa estratégia, já falamos aqui, é gerar o caos. Nas palavras imortais do personagem de George R.R. Martin – o caos é uma escada: muitos se desequilibram e caem; uns sobem até o topo. A indústria da desinformação visa gerar o caos.
A atualização para as chamadas vacinas bivalentes incitou nova onda de mentiras. Essas vacinas são uma mistura do imunizante baseado na variante original do SARS-CoV-2 com o material que tem a mesma sequência da variante Ômicron. Mas as reclamações e mentiras sobre as vacinas bivalentes não foram atualizadas – são as mesmas veiculadas para a vacina original. Alguns reclamam de sentirem-se mal após a vacinação. Realmente, qualquer vacina – seja ela inativada, de mRNA, bivalente ou não – pode resultar em sintomas inflamatórios, como dor no corpo, dor local, febre e indisposição. Esses sintomas são gerados pela ativação do que chamamos de imunidade inata. Essa imunidade é sempre ativada no início das respostas imunes e é um primeiro passo para gerar depois a imunidade de memória que queremos ao vacinar. Mas o relato do sintoma é como isso fosse o prenúncio de que algo está errado, de que se vai morrer; a vacina seria uma ferramenta letal, usada para eliminar – como disse um – 50% da população. Na verdade, é apenas seu corpo reagindo.
As reações podem ser fortes – lembro da primeira vacina que fiz para febre amarela, há 20 anos – mas duram no máximo 24 horas. Após uma cirurgia, você também fica cansado, dolorido, febril, inchado. Pode ficar ansioso, até ter taquicardia. Mas não é uma conspiração – a inflamação é uma reação natural do seu corpo – que só é problemática se não se resolve em um ou dois dias.
Os chamados eventos adversos são públicos e analisados pelos órgãos regulatórios. Nenhuma vacina é aprovada se gera eventos de grau alto, ou muitos eventos de qualquer grau e, principalmente, mortes. FDA e Anvisa só aprovam vacinas após análise de técnicos especializados, com consultoria de sociedades médicas e científicas, pessoas como eu e você. Entenda, eduque; ajude os seus a não cair pela escada.