Tuskegee, no Alabama, é uma cidade conhecida por três fatos. Um: sediar a Universidade de Tuskegee, fundada em 1881 pelo educador negro Booker T. Washington, que transformou um prédio em ruínas em um centro de excelência de estudos para pessoas de todas as etnias. Dois: ser o local de origem e treinamento do primeiro esquadrão de pilotos negros, o 447º Esquadrão de Bombardeiros da Força Aérea Americana, durante a II Guerra Mundial. Três: o infame experimento com sífilis que leva seu nome.
Entre 1932 e 1972, centenas de homens negros foram recrutados para um estudo clínico do governo, “O Estudo Tuskegee sobre Sífilis Não-tratada no Negro Americano”. Uma tragédia resultou do que é hoje objeto obrigatório de discussão em todos os cursos de ética, ao redor do mundo: os participantes, na maioria homens analfabetos do Sul dos EUA, não foram informados de que possuíam a doença, nem tratados. A sífilis é causada por uma bactéria, com sintomas graves que incluem cegueira e comprometimento cerebral. É transmitida de modo congênito, contaminando embriões. As parceiras e os descendentes dos participantes foram contaminadas, mesmo existindo tratamento com antibióticos desde os anos 1940.
No último dia 17, faleceu o epidemiologista Bill Jenkins, 73 anos. Jenkins, médico negro, tinha uma carreira promissora quando tomou conhecimento da pesquisa, nos anos 1960. Ele notou que o estudo começara bem-intencionado, oferecendo exames, refeições e seguro funerário, recrutando 600 homens negros, 201 dos quais não tinham a doença, acompanhados por um ano. Contudo, em 1936, decidiram seguir os participantes até o óbito, sem que fossem informados nem tratados os contaminados. Jenkins, um dos primeiros negros trabalhando em saúde pública nos EUA desde 1967, tomou conhecimento do estudo em 1968. Juntamente com um colega epidemiologista, Peter Bauxum, iniciou um movimento para descontinuar o estudo. Ignorados por colegas e pela Associação Médica Americana, contaram a história a um repórter que tornou públicos os fatos. Seguiu-se uma investigação do Congresso Americano, que concluiu que o conhecimento gerado não justificava o risco para os participantes, interrompendo o estudo em 1972. Uma ação jurídica obteve reparações para os participantes sobreviventes e seus descendentes e, em 1992, o então presidente Bill Clinton, publicamente, pediu desculpas pelo comportamento claramente racista do governo no episódio.
Jenkins dedicou a vida a criar consciência, advogando para reduzir as disparidades raciais na saúde. Fundou uma Conferência de Saúde de Minorias, trabalhou em HIV no CDC, em Atlanta, focado exatamente nos menos favorecidos e desprezados pela Saúde por sua raça. Repetia que os estudos médicos sobre raça deveriam investigar a causa das disparidades – o racismo. Jenkins nos deixa em fevereiro, mês da História Negra nos EUA. Mas educadores em ciência honram seu legado em todos os meses quando, ao contar a história de Tuskegee, trabalham para que isso nunca mais se repita.