O posto menos invejado nos EUA atualmente deve ser o de reitor. Se a guerra Israel-Hamas inflamou (ainda mais) o debate público e abriu uma cratera ideológica até entre pessoas que antes pareciam concordar, em poucos lugares os embates têm sido mais acalorados do que nas universidades americanas.
Se o reitor tentar proteger a liberdade de expressão de uns, pode ser visto como alguém que é leniente com o discurso de ódio contra outros. Se defender a independência para lidar com assuntos internos, será lembrado do volume estratosférico de dinheiro que a iniciativa privada e o governo federal despejam em centros de excelência acadêmica. Se tolerar manifestações, será visto como fraco por um Congresso de maioria republicana. Se reprimir, perderá a legitimidade junto a alunos e professores, majoritariamente democratas ou de esquerda.
Nos últimos dias, os protestos de estudantes tomaram uma dimensão como há décadas não se via no país – com Columbia, que concentra o maior número de alunos judeus e muçulmanos, como epicentro. O movimento rapidamente tornou-se nacional, e os alunos agora protestam não apenas contra o massacre em Gaza, mas também contra a repressão das manifestações e a prisão de dezenas de estudantes.
Vamos voltar algumas casas nesse tabuleiro. No início do ano, a reitora de Harvard foi levada a renunciar depois de um depoimento no Congresso em que titubeou na hora de classificar o antissemitismo como um tipo de discurso de ódio. Chamada a depor no mesmo comitê há duas semanas, Minouche Shafik, de Columbia, decidiu mostrar-se mais dinâmica e eficiente – além de determinada a manter o emprego e os investimentos. Prometeu aos congressistas que garantiria a ordem no campus de qualquer jeito e que discursos considerados antissemitas não seriam tolerados. A fala de Shafik no Congresso e a decisão posterior de chamar a polícia para dispersar os alunos que acampavam no campus acabaram esquentando ainda mais a fervura. Em questão de horas, deputados republicanos, ativistas pró-Palestina e pessoas que são a favor da liberdade de manifestação, mesmo quando não concordam com as opiniões defendidas, estavam pedindo a cabeça da reitora.
Para que serve uma universidade? Que valores deveria defender? Como administrar diferentes tipos de demandas, internas e externas, que contrariam esses valores? Quem ganha quando a independência de uma universidade é ameaçada? Como as manifestações de estudantes, que prometem se estender pelo mês de maio, serão narradas pelos historiadores no futuro? Essas são algumas das questões que estão postas sobre a mesa. Maio de 24 começa daqui a dois dias, mas sabe-se lá quando e como vai terminar.