Em Balneário Camboriú, como se sabe, ninguém tapa o sol com a peneira. Na superlativa “Dubai brasileira”, paisagem abençoada com oito dos 10 edifícios residenciais mais altos do país, parte da orla repousa sob a refrescante sombra dos espigões plantados à beira-mar nas últimas décadas – para conforto dos banhistas de pele sensível e êxtase estético de quem só consegue relaxar quando está cercado de concreto.
O mais novo empreendimento do paraíso vertical catarinense chama-se Triumph Tower. Com seus 509 metros de altura e 154 andares, o homônimo da popular marca de sutiãs pretende conquistar o título de prédio residencial mais alto do mundo, coroando assim a insaciável ambição nefelibata do mercado imobiliário local. O projeto da FG Empreendimentos, em parceria com a Havan, do empresário Luciano Hang, deve ser lançado no segundo semestre deste ano. O céu pode esperar, os investidores não.
No quesito megalomania, a Triumph Tower não parece ter buscado inspiração apenas na Trump Tower ou nos arranha-céus de China e Dubai, mas também no brasileiríssimo Fontana Sky, portento da engenharia nacional lançado há exatos 50 anos no Rio de Janeiro. Conjugando pela primeira vez os conceitos de moradia, entretenimento e tecnologia, o Fontana Sky foi o primeiro edifício do país a ser totalmente controlado por computadores, dispondo de rampas eletrônicas que levavam os carros até a porta dos apartamentos (para ninguém ter que caminhar) e de cozinhas cibernéticas que preparavam todas as refeições (para ninguém ter que cozinhar).
No quesito megalomania, a Triumph Tower não parece ter buscado inspiração apenas na Trump Tower ou nos arranha-céus de China e Dubai.
O engenheiro dessa obra magnífica chama-se Dias Gomes, e o esforço do empresário Lauro Fontana (Milton Moraes) para erguer seu Fontana Sky no lugar de um velho casarão de Botafogo é o pano de fundo de O Espigão (1974), disponível no Globoplay desde o início de abril – para deleite dos noveleiros. Com diálogos impagáveis e elenco de primeira, a novela aborda com bom humor temas sérios que despontavam no debate público naquele momento, como ecologia, patrimônio histórico, planejamento urbano, novas tecnologias, inseminação artificial e até a disfunção erétil. Além de registro saboroso dos hábitos e da linguagem da época, O Espigão nos lembra como o futuro era imaginado no passado – e como alguns dos problemas que já eram detectados há 50 anos continuam sem solução.
A propósito: na semana passada, enquanto eu me divertia assistindo a O Espigão, o Instituto do Patrimônio Histórico do Estado (Iphae) negou a autorização para a construção do empreendimento de 45 andares na Duque de Caxias, ao lado do Museu Julio de Castilhos. Nem tudo está perdido, afinal.