Faço parte de uma geração que achava importante guardar recordações palpáveis dos primeiros anos dos filhos. Fotografias impressas em papel, claro, mas também desenhos, o brinquedo favorito, o primeiro livro, os cadernos da escola. O hábito de colecionar souvenires, no meu caso, parecia tentar compensar, em parte, a ausência de relíquias da minha própria infância, vivida em uma época em que pais de múltiplos filhos nem sempre tinham disposição ou espaço para acumular memorabilias em casa.
Fico feliz que minha filha tenha uma espécie de cápsula do tempo para onde ela pode voltar sempre que quiser. Gostaria de ter tratado com o mesmo cuidado a memória dos meus pais e avós. No caso deles, não são os objetos que me fazem falta, mas as conversas que eu não tive – os relatos de juventude, as anedotas pessoais, as pequenas confissões, o conhecimento acumulado sobre os assuntos pelos quais se interessavam. É uma ironia, para uma jornalista, mas me arrependo de não ter parado para entrevistar os membros da minha própria família como se fossem estranhos.
Meus avós paternos, com quem eu convivi, morreram perto dos 90 anos. Meus pais, na casa dos 70. Minha sensação é a de que desperdicei o tempo de vida deles com a atenção rarefeita da minha juventude. O justo seria que eles estivessem vivos hoje, quando me aproximo dos 60, com muitas perguntas a fazer e disposição para escutar.
Não sei, por exemplo, como minha avó e meu avô se conheceram nem por que tiveram apenas um filho. Não sei como se divertiam na Porto Alegre dos anos 1920 nem se guardavam algum tipo de arrependimento nunca confessado. Sobre os meus pais sei um pouco mais – mas esse pouco parece cada vez mais insuficiente conforme vou me aproximando da idade que eles tinham quando morreram.
Nos últimos dias, ando escutando o podcast Wiser Than Me (mais sábia do que eu), apresentado pela atriz Julia Louis-Dreyfuss, dos seriados Seinfeld e Veep. A premissa é simples – mulheres mais velhas falando sobre a vida com alguém mais jovem – mas a execução é de luxo. Desde a estreia, em abril, a atriz já conversou com Jane Fonda (85 anos), Isabel Allende (80), Fran Lebowitz (72) e Diane von Furstenberg (76), entre outras, sobre temas como sexo, casamento, carreira, criação dos filhos, velhice.
É sempre bom ouvir pessoas que se destacaram em seus ofícios, mas nenhuma vida precisa ser excepcional, como a dessas mulheres, para tornar-se interessante. Refletir sobre o conhecimento adquirido, uma das definições clássicas de sabedoria, é uma habilidade que está ao alcance de qualquer um. Aprender a escutar também.