Pantera Negra pode ser o herói da hora, mas Michelle e Barack Obama são imbatíveis no mundo real. Enquanto o primeiro super-herói negro da Marvel a ganhar um filme solo estreava nos cinemas, o ex-primeiro casal americano entrava para a Galeria Nacional de Retratos, em Washington, com duas pinturas apresentadas ao público no último dia 12. Em um rol que inclui ex-presidentes como George Washington (1732-1799) e Thomas Jefferson (1743-1826), ambos senhores de escravos, o primeiro casal de negros a ocupar a Casa Branca entra para a posteridade com retratos pintados por dois artistas também afro-americanos. Nada mal como simbolismo histórico no momento em que o atual ocupante do cargo flerta com a supremacia branca.
Michelle Obama está imperial no retrato pintado por Amy Sherald, mas o quadro não faz justiça ao carisma da personagem – talvez porque o estilo da artista não tenha favorecido uma representação mais humanizada da ex-primeira-dama. Já o retrato de Barack Obama é daqueles que sequestram o olhar antes mesmo que você seja capaz de decidir se gostou ou não do resultado. Depois do primeiro estranhamento com a parede verde que faz um pano de fundo pouco óbvio para um retrato presidencial (cada uma das flores da composição, aliás, carrega um simbolismo próprio relacionado com a biografia do ex-presidente), percebemos que o artista Kehinde Wiley conseguiu captar algo da essência da personalidade de Obama e do que ele representa para a nossa geração – a das pessoas que nasceram nos anos 1960 e estão agora no poder. No quadro, Obama tem o olhar firme, vivo, inquisidor. Não é um personagem passivo ou distante. Nada mais justo. Além da preocupação em estar à altura do cargo, o ex-presidente americano parecia sintonizado com o momento histórico que lhe tocou viver. Você pode gostar ou não dele, mas Barack Obama é um homem do seu tempo, do nosso tempo.
Por coincidência, no mesmo dia em que o quadro de Barack Obama era pendurado na parede de uma galeria em Washington, por aqui uma representação alegórica do presidente da República fazia seu desfile triunfal na passarela do Sambódromo. Com o enredo Meu Deus, Meu Deus, Está Extinta a Escravidão?, a Paraíso do Tuiuti instalou um presidente vampiro no último carro da escola. O drácula tropical, com faixa verde-amarela e aspecto mortício, foi assunto em jornais do mundo inteiro ao longo da semana e é a imagem mais marcante de um Carnaval pródigo em mensagens políticas visualmente impactantes.
Vampiros são conhecidos por sugar o sangue dos incautos – o que os torna personagens óbvios para ilustrar a cultura da corrupção –, mas são também mortos-vivos. Falam, caminham, deliberam, mas não são animados por qualquer tipo de impulso vital a não ser a força do hábito – túmulo da renovação. E não importa o quão poderosos se tornem no presente, serão sempre seres anacrônicos. Criaturas que pertencem ao passado e não ao tempo em que vivem, e sobrevivem, suas vítimas.