Quem nunca sofreu ao perceber, em alguma saída amorosa, que o desodorante venceu?
No meu primeiro encontro com Beatriz, escolhi uma roupa inadequada.
Mesmo com a brisa, com o frescor do entardecer, exagerei na precaução.
Apareci com casaco de lã, um casaquinho verde de vó, que destoou do vestido floreado, de meia-estação, com os ombros à mostra, da minha companhia: um jardim exalando pólen, só faltava a escolta das abelhas.
Quando fui me livrar do calor do tricô, eu já estava com duas pizzas debaixo dos braços. Só faltava a escolta das moscas.
Senti a asa tarde demais. Não tinha como voltar para casa, não tinha como remediar no toalete.
Falhei com o figurino em nosso primeiro jantar romântico. Logo numa ocasião decisiva, em que certamente iríamos nos abraçar, aproximar-nos antes pelo corpo do que pelas palavras.
Sabendo disso, comecei a suar ainda mais.
Não poderia tirar o casaco, que aquelas rodelas ficariam visíveis a olho nu.
Parecia que havia tomado algum medicamento sudorífero. Talvez fosse o nervosismo. Talvez fosse o novo desodorante que experimentava e não testara, com sua ilusória promessa de 72 horas de resistência à transpiração.
Durante a conversa, eu lembrava um títere de cordas quebradas. Não levantava os braços, encurtados pelo medo, ajustados na cadeira, encolhidos e presos à cintura.
Para um descendente de italiano, que fala pelas mãos, fui vergonhosamente censurado, o equivalente a ser amordaçado.
Não me diferenciava de um androide, com movimentos mecânicos e contidos. Um Robocop de tricô.
Vivia o pânico de empestar o ar. De não passar despercebido pelo faro apurado do sommelier.
Meu constrangimento foi aumentando porque ela inventou de mudar de lugar. Estava de frente e veio caprichosamente para o assento ao meu lado.
Se eu pudesse, partiria diretamente para a sobremesa, pediria a conta, dispensaria o vinho e a delicadeza, a gentileza e a mesura: apenas sairia correndo dali para o banho. Aboliria aquele dia da minha vida, recomeçaria do zero.
Não dizia nada com nada. Ria de apreensão, precariamente escutando Beatriz de tanto que me via vítima da aparência.
Tentava pensar o pior para melhorar a realidade: mais grave do que asa seria estar de mau hálito. Beatriz, então, beijaria a asa na boca. Pelo menos, minha boca permanecia perfumosa de Halls preto.
Ela estranhou que não a cortejava, não a seduzia, não fantasiava esperanças.
Até que me perguntou à queima-roupa:
— Tudo bem entre nós?
Como saída para a minha falta de iniciativa, restou-me explicar que queria ir com calma, conhecê-la devagar.
Ela suspirou:
— Você é um anjo.
Beatriz me comoveu com a sua ingenuidade. Desconhecia que as minhas asas eram outras, a verdade era outra.
Acreditou que eu representava um homem sério, bem-intencionado.
Hoje somos casados. Quem diria que minhas asas me levariam a voar tão longe no relacionamento?