A cantora Luísa Sonza foi massacrada pela opinião pública quando se separou, há três anos, do humorista Whindersson Nunes, que hoje detém um exército de sessenta milhões de seguidores somente no Instagram.
Houve toda uma boataria de infidelidade e deslealdade nas redes sociais, alegando que ela teria sido interesseira e oportunista, e usado o casamento como trampolim de sua carreira como artista.
Luísa sobreviveu com dificuldade, arcando com sequelas de desconfiança e paranoia, mesmo com toda a sua couraça na fama, mesmo acostumada aos fuxicos intermináveis em sua intimidade.
Em seu documentário recém-lançado na Netflix, chegou a desabafar: “Se o povo não tivesse infernizado tanto a nossa vida, a gente estaria junto até hoje”.
Não contou com a mesma sorte a estudante Jéssica Vitória Canedo, de 22 anos, de Araguari, no Triângulo Mineiro. Ela terminou envolvida em uma armação de prints falsos apontando um início de romance com Whindersson.
A menina não suportou os ataques, que tornaram insustentável a sua rotina com a família e colegas do ensino médio, e tirou a sua própria vida como única forma de escapar do acossamento, de calar as vozes asfixiantes e intimidadoras.
Chamada de tudo para baixo, experimentou a misoginia escandalosa que sofrem as mulheres em nosso país quando o assunto é contato com celebridades masculinas.
Para se ter uma noção da avalanche que a soterrou, saíram em páginas de fofocas — como a Choquei, com mais de 21 milhões de seguidores — montagens que indicariam um namoro entre ela e Whindersson Nunes.
Veio à tona, como se fosse real, um fictício bate-papo entre a estudante e o comediante, com a chamada "Veja: São divulgados prints de conversas de Whindersson Nunes com sua nova affair".
Jéssica falou que não era verdade, pediu aos sites que cessassem um pouco a importunação para entender o que vinha acontecendo e respirar em paz, suplicou que a deixassem de lado, solicitou que a mãe gravasse um vídeo em sua defesa: “Mamãe, peça a eles que parem! Não estou aguentando, faça alguma coisa”.
Minutos se transformaram em horas, horas se transformaram em dias de um desespero mudo e catatônico, a partir de fake news, que divulgavam um caso com quem ela sequer conhecia. Ela só dizia: “não sei que trem é esse!”.
Mas não havia como se defender na pacata Araguari de uma farsa em escala nacional. O trem passou por cima de sua família, de sua fragilidade.
A difamação fulminante destruiu uma existência inocente. Ela nem lidava com redes sociais, ou com WhatsApp, comunicava-se unicamente por telefone.
A caça por likes ultrapassou a ética, escancarou a impunidade na prática da informação e revelou o quanto não existe cuidado com a saúde emocional das pessoas.
Se alguém já se encontra em depressão, com tratamento psiquiátrico, como Jéssica, uma invasão de privacidade é um empurrão para a tragédia.
Haters entraram em sua casa, saquearam sua delicadeza e sua esperança, torturaram seus afetos e mentiram a seu respeito.
É um latrocínio moral.
Primeiro, publica-se, para depois confirmar os fatos. Primeiro, mata-se publicamente, para depois verificar quem era a vítima.