Todos comentam a dificuldade de criação de adolescentes. Ou o desafio de cuidar de bebês, ou de se mostrar inteiramente responsável por crianças. O que não escuto muito é sobre a árdua empreitada de ser pai ou mãe de filhos adultos.
Você não tem mais como demonstrar o amor como antes. Não há mais reuniões de avaliação na escola. Não há mais apresentações para comparecer nas datas comemorativas. Não há mais noites de pijama para cozinhar aos colegas e ser simpático com a turma. Não há mais competições esportivas para vibrar na arquibancada. Não há mais necessidade de dar mesadas ou completar o valor de um ingresso para um show. Não há como buscá-los em festas, você não tem sequer noção de quando retornam para a cama. Não há mais como planejar as férias com eles. Não há mais como aconselhar na hora do café. Não há mais como sair junto no momento de comprar roupas. Não há mais recompensas, sorrisos, elogios de como “você é legal” ou do quanto é “a melhor mãe ou pai do mundo”. Não há mais rastros oficiais da ternura, cartõezinhos e desenhos para postar nas redes sociais.
Eles não moram mais com você para ofertar a presença farta do olhar e do abraço. São independentes. São autônomos. Têm suas preocupações e desafios. Têm seus estudos e carreiras. Sobram pouquíssimos encontros para reforçar o vínculo. Você depende da sorte de um telefonema para expor alguma questão pontual e pendente do seu dia. Talvez a inquietação que gostaria de partilhar caduque ou fique acumulada para nunca mais.
Fofocas exigem disponibilidade. Você não dispõe de um pretexto para verbalizar alguma indiscrição de um amigo, ou de um familiar, ou de um vizinho. Deixará também passar.
É uma amizade esparsa, regida por grandes acontecimentos. As miudezas escapam agora.
Perde de saber se estão amando ou em fossa, se estão amuados ou contentes. Não existe como reclamar da bagunça, das roupas espalhadas, da luz acesa, da louça suja, dos pés em cima da mesa. Tem certeza de que eles continuam do mesmo jeito, com a mesma desordem selvagem e individualista, mas está privado da influência para opinar e orientar. Não estão mais sob a sua responsabilidade, sob o seu campo de ação, sob o radar de suas emoções protetoras.
Cada um cuida de si. Cada um faz o que quer. Eles podem estar almoçando às três da tarde ou cabulando o almoço por excesso de obrigações profissionais. Eles podem ter a geladeira vazia por preguiça de ir ao supermercado. Eles podem dormir com fome ou só comer bobagem.
Você já imagina que estão magros, ossudos, porém encontra-se desfalcado de desculpa para aparecer com uma marmita. Recorda com saudade a época em que era útil e despertava de madrugada para cozinhar a eles.
Se os filhos estão gripados, logo imagina que não se agasalharam direito. Apesar da angústia, você não tem como atravessar a cidade como se fosse uma ambulância para providenciar o termômetro, o antitérmico e controlar a temperatura com a mão na testa.
Eles precisarão lidar sozinhos com as suas doenças e suas indisposições. Não tomarão o seu chá curativo, específico para os sintomas, tampouco o medicamento apropriado que está na ponta da sua língua para a rápida convalescença.
Hoje eles estão tentando se livrar da dependência por terapia. Não estranhe que desejem um pouco de distância para seguirem o próprio caminho.
Perdura uma grande desinformação entre vocês. Não usufrui da cumplicidade dos pequenos e decisivos detalhes da convivência.
Eles tornaram-se novas pessoas, mais sérias, mais mal-humoradas, com menos tempo, enfim, mais parecidas com você.
Não se trata de ninho vazio, mas de aprender a conversar com outra árvore carregada de frutos.