Guardo comigo o segredo da longevidade de um relacionamento, para um amor único e eterno em meio a uma época fugaz de romances líquidos, para você viver com a mesma pessoa sem se enjoar, para completar sucessivas bodas de todos os elementos possíveis, do papel ao diamante.
Não é paciência. Não é tolerância. Não é respeito das diferenças. Não é lealdade. Não é fidelidade. Não é amizade.
É comprar anão de jardim. O resto vem junto com essa decisão.
Não é paciência. Não é tolerância. Não é respeito das diferenças. Não é lealdade. Não é fidelidade. Não é amizade.
Infelizmente, a regra só serve para quem tem casa. Os casaizinhos de apartamento não têm como desfrutar do inigualável feitiço do tempo.
O par que compra anão de jardim dificilmente se separa. Receberá a bênção e a proteção dos tesouros enterrados junto das árvores.
Não tem nem como se divorciar e correr o risco de separar os anões – seria como separar irmãos de sangue.
Anão de jardim é a pior compulsão da face da Terra, a pior cachaça que partiu um dia de um alambique. Você sempre quer mais um, sempre acredita que cabe mais um em seu terreno. Não tem limites, jamais se contenta em pôr um fim ao seu exército gabiru laqueado.
A coleção começa despretensiosamente, quase por acaso, num insight na hora de cortar a grama ou plantar roseiras. Você sente que falta alguma coisa para embelezar o gramado, e põe na cabeça que os pequenos guardiões são perfeitos.
Eclodirá a fissura obrigatória de parar sempre na BR para adotar um novo integrante. Baterá uma compaixão por aqueles serzinhos de trinta a sessenta centímetros vendidos nos quiosques da estrada. Parecerá que estão pedindo carona.
Suas viagens demorarão cada vez mais, seu porta-malas já estará revestido de lona preta para o transporte adequado dos mascotes. E vai querer ampliar o acervo para elfos e gnomos. E para os coadjuvantes sapos e cogumelos. Para o bosque encantado inteiro.
É muito mais viciante do que fazer tatuagem – os tatuados passam a vida cobrindo os corpos sob a justificativa de não arcar com o azar de ficar com um número ímpar.
A receita também segue uma lógica comportamental. Convenhamos, se o casal não sente vergonha de colocar Atchim, Dengoso, Dunga, Feliz, Mestre, Soneca e Zangado na entrada da residência, para todo mundo ver, não terá medo de mais nenhum vexame junto. Não discutirá se Sidney Magal, Wando e Odair José são cafonas, não temerá a censura na internet, não sofrerá com as patrulhas culturais do politicamente correto, não se tolherá para regras de etiqueta e ordem dos talheres na mesa, não se encabulará com os julgamentos familiares sobre loucura, sairá para buscar o jornal de pantufas e roupão, resgatará as polainas e os óculos coloridos da adolescência, participará de karaokês com frequência, tomando a iniciativa de romper a bolha de timidez do público e ser o primeiro a cantar.
A breguice e a inadequação não existirão mais no campo de experiência.
O casal perderá qualquer trava social, qualquer senso de ridículo, qualquer amarra de inibição.
Estará finalmente livre para amar.