O granizo é o penetra na festa da neve. Você está esperando doces e suaves flocos de gelo, e vem pedrada do céu destruindo tudo.
Só quem é gaúcho e mora aqui conhece esse lado nada bonito do inverno, esse lado sombrio, esse lado assustador: o infortúnio de plantações devastadas e colheitas comprometidas, de empresas e residências destelhadas, de ginásios cheios de desabrigados e intensa procura por lonas na Defesa Civil (mais de cinco mil metros foram fornecidos nesta semana apenas em Charqueadas).
A neve e o granizo são a luta do bem contra o mal, o embate da luz com as trevas em nosso firmamento.
Os temporais registrados entre o final da tarde e início da noite de segunda-feira (15) criaram pânico entre moradores de dezenas de cidades no Rio Grande do Sul. Em Rio Pardo, por exemplo, oito mil moradores arcaram com prejuízos.
Cerca de 338 mil unidades residenciais ficaram sem energia elétrica. Houve registro de ventos de 120 km/h. Árvores derrubadas fecharam avenidas, geraram engarrafamento e mudaram o mapa rodoviário e o trajeto de seus moradores. Aulas terminaram suspensas em Canoas.
A neve e o granizo são a luta do bem contra o mal, o embate da luz com as trevas em nosso firmamento. A neve é lúdica, enternece as famílias, reúne a todos para o arrebatamento da brancura pelas telhas, capôs e copas, convoca para a rua crianças que deixam o seu gorro e sua manta nos bonecos. O granizo traz medo, é agressivo e perigoso, ninguém pode ficar exposto fora de casa para não se machucar. É o boneco Chucky com seu macacão jeans e olhos azuis de relâmpagos roubando o nosso patrimônio.
A neve surge das nuvens baixas; o granizo, das nuvens altas.
A neve parte das nuvens rasteiras, perto do solo, tipo cerração, sem peso, sem ser tocada pelo vento, congelando moléculas de água em sua capa.
O granizo parte da mais empírea atmosfera, atrapalhando o voo dos aviões e causando turbulências, carregando ventanias enodadas, enjoadas, em sua garupa.
De acordo com Cléo Kuhn, são estruturas e armações diferentes em alturas distintas: o granizo é sólido, empedrado, já a neve é maleável, pastosa, entre sólida e líquida.
Na semana do Festival de Cinema de Gramado, em que a rede hoteleira aguarda lotação esgotada pela previsão de neve, aparece no tapete vermelho uma inoportuna tempestade de pedras, desprovida de convite, para acabar com a nossa beleza, nosso chocolate e nosso vinho.
Os turistas jamais entenderão: o frio custa caro para nós.