É um poeta à paisana quem nomeia as operações da Polícia Federal. Fico imaginando o quanto esse escriba disfarçado vai atrás, madrugada adentro, das palavras perfeitas para encontrar a definição do motivo da próxima ação. E ele sempre acerta a rima. Gostaria de conhecê-lo para pedir um autógrafo.
A última, que prendeu Milton Ribeiro, ex-ministro da Educação do governo do presidente Jair Bolsonaro, ontem, em Santos, tem o didático batismo de Acesso Pago. O título já revela o esquema a ser investigado: os lobistas Gilmar Santos e Arilton Moura, que também foram presos, teriam privilégios no repasse de verbas do MEC. Assim eles negociariam com prefeituras o direito ao benefício se recebessem propinas, seja em ouro, seja em reais. É o clássico caso de tráfico de influência e de corrupção.
Na investigação, essa trinca de pastores – incluindo o ex-ministro demitido em março pelo presidente quando vazou um áudio com as suas facilitações do FNDE (Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação) – estaria fazendo um balcão de licitações, favorecendo a ou b de acordo com os ganhos escusos, por baixo dos panos.
O acesso ao gabinete era literalmente comprado, o que distorce a natureza igualitária do repasse de verbas. Ainda estamos no início da investigação, nem nos cabe sentenciar os envolvidos, ou dizer que nossos impostos estão virando dízimos, muito menos estigmatizar os evangélicos pelas atitudes pessoais e isoladas de seus representantes. Mas, se Bolsonaro admite que a apreensão e a prisão preventiva têm motivo, não serei eu a discordar.
O que não podemos é desmerecer a gravidade de tais rombos na educação. Não são abstratos e veniais. Salas vazias e abandonadas significam cemitérios de ideais.
São tão nocivos e criminosos quanto desvios na saúde pública. A diferença é que, em vez de pessoas morrerem rapidamente por falta de atendimento e de equipamentos nos leitos dos hospitais, sonhos são assassinados lentamente dentro das escolas.
Perde-se a equanimidade social necessária na distribuição dos subsídios. Quem deveria ser atendido não é, e ginásios são levantados no lugar do básico: de merendas e de efetivo de professores. Os elefantes brancos seguem pisoteando as formigas.
Afinal, crianças e adolescentes inocentes acabam surrupiados na raiz dos investimentos. E isso impacta diretamente a sua formação e a respectiva colocação no mercado. Se vivemos numa meritocracia, todo vazamento financeiro institucional cria um cinturão de miséria, com milhões de alunos banidos da competição justa e democrática devido à completa ausência de assistência.
Num estudo elaborado pelo IMD (World Competitiveness Center), que analisou a competitividade de 64 nações, o Brasil se encontra em último lugar exatamente pelo mau desempenho dos gastos públicos totais no setor educacional, com qualidade e execução seriamente comprometidas.
Roubar no ensino é aviltante. É tirar a doce ilusão de meninos e meninas de, um dia, chegar à universidade.
A verdade é que 11% dos nossos jovens não completam o Ensino Médio.