Disputar os Jogos Olímpicos é o grande momento na carreira de todo esportista. E não é diferente para a gaúcha Jaqueline Weber, 27 anos. Natural de Teutônia, pequeno município da região central do Rio Grande do Sul, ela corre para fazer parte do seleto grupo de atletas olímpicos e mostrar aos mais jovens que é possível atingir objetivos, independente de sua origem.
Em entrevista ao programa Gaúcha 2024 da Rádio Gaúcha, Jaqueline falou sobre a temporada que foi encerrada com duas medalhas nos Jogos Sul-Americanos de Assunção, no Paraguai, o sonho de estar nos Jogos de Paris e o legado que deseja deixar para sua comunidade, para os mais jovens.
Como você avalia essa temporada de 2022?
Foi uma temporada muito positiva. Encerro como líder do ranking brasileiro dos 800m e vice-líder do ranking sul-americano. Cheguei a estar em 60º no ranking mundial, fui prata no Troféu Brasil e encerrei com duas medalhas nos Jogos Sul-Americanos, prata nos 800m e bronze nos 1.500m, onde não estava cotada para o pódio e fiz melhor marca pessoal. Nos 800m, confirmei uma tendência, sendo superada apenas pela atleta olímpica uruguaia Deborah Rodriguez. Tudo faz parte da caminhada rumo a Paris. Ano a ano vamos consolidando os resultados internacionais para em 2024 estar entre as 56 melhores do ranking mundial nos 800m e disputar os Jogos.
Você buscou vaga para os Jogos de Tóquio e faltaram alguns detalhes. Para Paris, o que está sendo aprimorado?
Eu terminei a corrida olímpica (para Tóquio) em 89º lugar. Na classificação para o Mundial deste ano eu cheguei ao 63º. Foi uma evolução considerável, uma consolidação de resultados e é o que dá confiança para estar melhor e chegar à vaga em 2024. O trabalho da equipe é cada vez mais forte, com treinamentos de força, recuperação. Tenho nutricionista, terapeuta pra trabalhar parte psicológica. São detalhes que vem ajudando a evoluir. É uma caminhada consistente, felizmente sem nenhuma lesão.
As provas de 800m e 1.500m são classificadas como meio-fundo. Quais as principais diferenças para provas de fundo (5 mil e 10 mil metros)?
As nossas provas (800 e 1.500m) tem como característica, a resistência de velocidade. Além de tudo são de tática. Como não corremos em raias, apenas os primeiros 100m, o posicionamento faz a diferença. Temos que estar bem resistentes, mas também muito velozes, porque as provas são decididas nos últimos 200m. No dia a dia, os treinamentos são bem específicos. A parte principal pode durar apenas 10 minutos, por conta da alta intensidade, com quatro repetições de 500m e naturalmente você fica no limite do corpo. Os treinos de meio-fundo são curtos, mas muito intensos. É diferente da velocidade. Eu corro em média a 24 km/h, um homem corre a 27 km/h nos 800m. É uma velocidade bem alta e tem que estar muito bem preparado. Precisa de 3,4 meses para atingir esse pico de performance.
Você treina com o Fabiano Peçanha, que representou o Brasil nos Jogos de Pequim e Londres, e que é também seu noivo...
O Fabiano é ter alguém que admirei me orientando. Como ele vivenciou isso, ele sabe o que vou sentir após a semana de treinos. Ele entende o que atleta sente na pista e antes das competições, me dá dicas de onde acelerar, atacar. Por exemplo, na reta oposta, quando falta 300m, não deixar uma adversária passar porque psicologicamente é difícil recuperar. São detalhes que ele vivenciou e me passa. E é um desafio, até por ele ser meu noivo, tem que saber separar e com a ajuda de outros profissionais vamos moldando isso da melhor forma possível para chegar aos Jogos Olímpicos, eu como atleta e ele como treinador.
Você é natural de Teutônia. Como foi o começo no atletismo?
Comecei na escola. E nos turnos inversos fiz diversas atividades, dança, coral, todos os esportes, incluindo atletismo, onde me descobri aos 10 anos. E o que era uma brincadeira foi ficando sério e ainda na escola fui para a seleção brasileira de base e em 2013 eu vim para Santa Cruz do Sul a convite do pai do Fabiano (Jorge Peçanha), que tinha um projeto de atletismo na Unisc e me radiquei aqui até chegar ao nível adulto de seleções brasileiras e sonhar com os Jogos Olímpicos.
E conquistar uma vaga para Paris, realizar o sonho olímpico, o que significa?
Estar numa Olimpíada é o ápice. Na história do Brasil são menos de 4 mil pessoas que representaram nosso País nesse evento, seria estar num grupo seleto. Mas principalmente porque essa construção, essa caminhada, deixa um legado. Não apenas pra mim, minha família, mas para minha cidade Santa Cruz, Teutônia. Porque existe uma questão de inspiração, de mostrar para as pessoas que é possível, que elas podem. O atletismo faz parte da minha vida. Aqui em Santa Cruz temos um projeto social (Associação Medalha de Ouro - AMO), que é encabeçado por mim e pelo Fabiano, onde atendemos 50 crianças. É um pouco de retorno, de oportunizar para outros, o que tivemos através do atletismo. Essas coisas não tem preço.
E que mensagem isso pode deixar para esses jovens, mesmo que a maioria não chegue ao alto rendimento?
Nós queremos que eles entendam que o mundo é muito maior que o local onde eles convivem. Esse ano, muito deles tiveram a oportunidade de viajar para Porto Alegre pela primeira vez e participar de uma competição na Sogipa. Eles saem da sua caixinha, tem a oportunidade de uma visão um pouco mais macro, além do dia a dia, com respeito, disciplina, aprendem que resultados vêm com o treino, de entender que derrotas fazem parte. Muitas crianças se frustram ao ouvir um não, não estão acostumadas com o perder. Entender que a resiliência é importante, que a gente pode cair, mas precisa levantar e ir de novo batalhando, coisas que o esporte ensina. Temos parceria com a universidade. Hoje são apenas bolsistas que trabalham no projeto. Mas a ideia é que com o passar do tempo, aqueles que se formarem no ensino médio, entrarem na universidade com bolsa de estudo e poderem sair com uma graduação. E isso é mais importante que se tornar um atleta de rendimento. Pode acontecer ao natural, mas sem pressão. E isso nos deixa realizados.