O milho voltou a ganhar terreno nas lavouras gaúchas, um ano após ocupar a menor área da história. Reanimados pelo aumento no preço da saca de 60 quilos, que avançou 42% em um ano, passando de R$ 26,60 para R$ 37,84 essa semana, agricultores ampliaram a área destinada à cultura no Estado. Serão 738 mil hectares na safra 2018/2019, extensão 5,5% acima do ciclo anterior, segundo a Emater.
Uma das principais razões para a reação dos preços observada desde o início do ano é a quebra da safrinha, plantada principalmente do Paraná para cima e que, nos últimos anos, superou a de verão.
– A estimativa para a safrinha é que tenha sido de 53,38 milhões de toneladas, 10 milhões de toneladas abaixo do ano passado – diz Adriano Gomes, analista de mercado da consultoria AgRural.
Com a redução da área no ultimo ciclo, a soma da primeira e segunda safra neste ano deve chegar a 81,3 milhões de toneladas, 16,8% abaixo do ano passado, mostra o último levantamento da Companhia Nacional de Abastecimento (Conab).
O presidente da Associação dos Produtores de Milho do Rio Grande do Sul (Apromilho-RS), Ricardo Meneghetti, avalia que o preço também é sustentado pela expectativa de ampliar a exportação. Esse aumento de demanda do mercado externo, sustenta, seria em razão da guerra comercial deflagrada entre Estados Unidos e China. Como Pequim pretende retaliar Washington, haveria maior busca pelo grão da América do Sul. Mas, como é um grão muito mais dependente do mercado interno, Meneghetti também vê que o crescimento da área no Estado é sinal de recuperação para a economia.
– Alguns produtores oscilam, de acordo com o mercado da soja ou do milho. Este ano é um aumento de área mais consolidada. Vejo que os aventureiros não foram para o milho. Quem está plantando mais é o produtor tradicional, que tem expectativa interessante para a economia no próximo ano – diz Meneghetti.
Uma das incertezas da safra, a tabela de frete, que encareceu o transporte, de certa forma tem ajudado. Meneghetti lembra que, como as regiões produtoras de milho no Rio Grande do Sul estão mais próximas das indústrias consumidoras, como as de aves e suínos, fica bem mais caro trazer o grão do Centro-Oeste, por exemplo:
– Enquanto os negócios aqui estão saindo na casa dos R$ 36 a R$ 38, se trazer este milho do Centro-Oeste chega a R$ 40.
Gomes observa que a questão logística, relacionada à tabela do frete, por enquanto prejudica muito mais as exportações do milho safrinha – devido à maior distância das regiões produtoras para os portos – do que o mercado regional, onde a necessidade de transporte é menor.
Valor pago ao produtor estimula cultivo no país
A analista de mercado Ana Luiza Lodi, da INTL FCStone, entende que, com a recuperação dos preços, o milho tende a ganhar área em todo o país:
– Creio que a influência dos preços é bem interna. Os produtores estão segurando o milho safrinha, depois da quebra, e os consumidores têm dificuldade de encontrar no mercado.
O assistente técnico estadual da Emater Alencar Ruggeri diz torcer para que, após a curva descendente nos últimos anos no Rio Grande do Sul, a área não seja mais reduzida nos próximos ciclos. Devido à forte presença da indústria de proteína animal no Estado, o grão – base da ração de aves e suínos – é considerado estratégico.
– Esperamos que o fundo do poço em termos de área plantada tenha ficado para trás – diz.
Apesar de ainda ser necessário esperar pela ajuda do clima, por enquanto a projeção é de uma safra de 5 milhões de toneladas no Estado, 11% acima do ano passado.
A despeito da volta do incentivo a plantar o cereal, a extensão cultivada este ano ainda é baixa – a segunda menor da série, iniciada na década de 1970. Antes de 2013, por exemplo, em apenas um ano há registro de área inferior a 1 milhão de hectares, o que virou regra nas últimas cinco safras, com os agricultores optando mais pela soja.
Compra de insumos antecipada driblou alta
No Noroeste, as regiões mais próximas ao Rio Uruguai são as primeiras a começarem o plantio de milho no Rio Grande do Sul. Este calendário mais adiantado, aliado à atenção às condições que poderiam afetar o custo, acabou beneficiando produtores como Hélio Valdir Chiapinotto, 47 anos, de Doutor Maurício Cardoso.
– Comecei a ouvir informações de que o dólar poderia subir e comprei os insumos ainda em maio – conta Chiapinotto, que escapou dos aumentos que viriam na esteira da alta da moeda americana, que começou a acelerar a partir da greve dos caminhoneiros, ainda naquele mês.
Chiapinotto planta 83 hectares de lavouras de verão. Costuma repartir as áreas entre soja e milho, mesmo em momento em que o cereal não esteja tão remunerador. Facilita o manejo e o controle das pragas. A palhada adiciona mais fertilidade ao solo, o que também se reflete na produção de soja. A mesma saca de 50 quilos de adubo que comprou no início de maio por R$ 65 hoje está a R$ 95. A ureia, adquiriu a R$ 62. O preço agora está em R$ 85.
Mercado futuro ajuda a cobrir investimento
Em 2017, o agricultor teve rendimento de 185 sacas por hectare, contra média estadual de 81,5 sacas por hectare. Para cobrir custos, vendeu no mercado futuro o equivalente a 100 sacas por hectare, fixando em R$ 36,50 a saca.
– Ano passado estava em torno de R$ 25 a saca de milho. Normalmente, com 80 sacas consigo pagar meu custo e me sobra de 90 a 100 por hectare. Acho que o preço do milho vai subir. Estão falando em escassez – diz Chiapinotto.
Devido ao microclima local, é possível semear bem cedo. Chiapinotto plantou em junho. Em dezembro, quando a região costuma ter os chamados veranicos, períodos mais secos que afetariam a produtividade da lavoura se as plantas estivessem em estágio anterior, pretende estar colhendo.
O gerente regional adjunto da Emater em Santa Rosa, José Vanderlei Waschburger, diz que, na região, a área de milho cultivada neste ano será de 136 mil hectares, 4% acima do ano passado. Quase todas as lavouras já estão implantadas. Com isso, a colheita ainda no final do ano permite que as mesmas áreas recebam soja.
– Até aqui, o desenvolvimento vegetativo das lavouras está muito bom. Esperamos produtividade média na região de 118 sacas por hectare, 12% acima da safra anterior – revela o técnico.
Segundo Waschburger, os produtores estão investindo mais em tecnologia. Avalia que, embora o custo tenha aumentado entre 20% e 30%, percentualmente os preços do milho subiram bem mais, de cerca de R$ 22, há 12 meses, para R$ 36 agora.
Custo alto e incerteza no transporte
Mesmo que o preço atual seja um incentivo a incrementar a área, o horizonte não é claro. Um dos problemas é o custo dos insumos, como fertilizantes e defensivos, que oscilam ao sabor do dólar. Hoje, a cotação da moeda norte-americana está próxima a R$ 4, um ano atrás girava em torno de R$ 3. Outra incerteza é a tabela do frete, embora a venda para consumidores de pequenas distâncias tenha impacto menor.
– Ainda não sabemos como estará o mercado quando o produtor entregar o produto. Se o dólar passou de R$ 4, dependendo do presidente pode voltar a R$ 3,50. Por isso, muitos estão travando o preço de parte da safra – diz o presidente da Apromilho no Estado, Ricardo Meneghetti.
Ele lembra que a tonelada de adubos, como o fosfato diamônico, que estava em torno de R$ 1,5 mil antes da greve dos caminhoneiros. Hoje, custa até R$ 2,2 mil. Agora, a tabela no frete causa insegurança.
– É o único elo da cadeia que não é definido pelo livre mercado. Isso causa certo nervosismo – aponta o dirigente.
O analista de mercado Adriano Gomes, da AgRural, ressalta que o lucro da safra dependerá do mercado e do clima, mas é possível minimizar altas de custos aproveitando os bons preços atuais.
O assistente técnico estadual da Emater Alencar Ruggeri entende que boa parte do resultado depende de quando os produtores adquiriram os defensivos e fertilizantes. Quem comprou antes da disparada do dólar, avalia, tem boas chances de conseguir remuneração satisfatória devido à perspectiva de preço firme do grão.
O produtor Aires Antonio Basso, 42 anos, de Frederico Westphalen, no Norte, aproveitou a alta na cotação. Ele vendeu parte da produção esperada no mercado futuro. Por enquanto, cerca de 20%, a preços de até R$ 37.
– Minha intenção é travar até 60% para garantir (a rentabilidade), principalmente devido ao aumento dos custos. Um preço abaixo de R$ 30 seria inviável – detalha Basso.
O agricultor manteve a área cultivada com milho este ano, apesar dos custos. A lavoura de 59 hectares ficou cerca de 35% mais caro, calcula Basso. O incentivo veio do preço. Ele lembra que, um ano atrás, o preço da saca do cereal era negociado a R$ 28, R$ 29.