Quando olhamos as discussões e as disputas na Organização Mundial do Comércio (OMC), algo nos sugere que estamos flertando com nossa antiga companheira: a contramão. Enquanto os países acusam-se de subsidiar suas exportações e, com isso, ganharem vantagens indevidas, neste canto do planeta discutimos o contrário: tributar exportações, para ajudar nas combalidas finanças públicas dos governos estaduais.
É então que olhamos para relação entre arrecadação de ICMS e o Produto Interno Bruto (PIB) do Rio Grande do Sul, desde quando foi concebida a Lei Kandir, no ano de 1996, até 2016. Enquanto o PIB cresceu em média a 1,88% ao ano, a arrecadação de ICMS cresceu 3,64%. Ora, a arrecadação de ICMS – apesar e por causa da desoneração das exportações – cresceu quase que o dobro do PIB e, mesmo assim, governos estaduais estão com suas finanças colapsadas. A explicação não está, certamente, no lado da receita. Tivemos diversas experiências de governos que não tiveram preocupação com os quesitos fiscais, aumentaram gastos de maneira irresponsável enquanto construíam narrativas mirabolantes. Deu no que deu.
Não enfrentar o gasto e se esconder atrás da Lei Kandir é, novamente, fugir das responsabilidades e nos afastar das soluções, embarcados em teses messiânicas, demagógicas e sem sentido factual.
Apesar de sermos um Estado onde o agronegócio é o coração da economia, há ainda muita incompreensão de suas relações com os demais setores. Para produzir, é necessário comprar máquinas agrícolas, caminhões, químicos, fertilizantes, fármacos, petroquímicos, eletrônicos, pesquisas de ponta, biotecnologia e assim por diante. Olhe para a indústria gaúcha e o que você encontrará? Um enorme cinturão industrial e de serviços fornecedores da agropecuária e é, graças a ele, que conseguimos atingir níveis inimagináveis de produtividade.
A Argentina resolveu ir pelo caminho da tributação das exportações e teve queda de 158% na carne, a menor área de trigo em 110 anos, acumulou o maior estoque de soja do mundo e registrou uma imensa redução industrial.
Antes vendia-se uma máquina agrícola lá, outra cá – após as retenciones foi uma lá e quatro cá. O fim da Lei Kandir não seria um golpe somente no agro, mas também na indústria e nos serviços. Olhemos para o exemplo argentino, para as taxas do PIB e do ICMS e sejamos maduros para, uma vez na vida, fazermos o que precisa ser feito.
Antônio da Luz é economista-chefe do Sistema Farsul
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