Mais de mil cidades brasileiras estão em alerta devido a níveis de umidade comparáveis, em alguns casos, aos de desertos como o Saara, segundo dados oficiais divulgados nesta quarta-feira (4). O país enfrenta a pior seca de sua história e os incêndios não dão trégua.
O Instituto Nacional de Meteorologia (Inmet) informou em um relatório que mais de mil cidades registraram "umidade relativa do ar abaixo de 12%", inferior às recomendações da Organização Mundial da Saúde (OMS). O instituto descreveu uma situação de "grande perigo", embora, no final da tarde, tenha reduzido o alerta para "perigo potencial" após um aumento dos níveis de umidade para entre 20% e 30%.
A umidade caiu recentemente abaixo de 10% (chegando a 7%) em dezenas de localidades. São níveis "tão baixos" quanto no deserto do Saara, explicou Ana Paula Cunha, pesquisadora do Centro Nacional de Monitoramento e Alertas de Desastres Naturais (Cemaden).
A seca no ambiente, que afeta Brasília e extensas regiões dos estados de São Paulo e Minas Gerais, assim como de Mato Grosso, Mato Grosso do Sul e Goiás, provoca um "grande risco de incêndios florestais e para a saúde", acrescentou.
Seca histórica
O Brasil enfrenta há vários meses uma onda de incêndios em várias regiões, especialmente na Amazônia, no Pantanal e no Estado de São Paulo. Os incêndios são favorecidos pela pior seca no Brasil desde que os registros começaram na década de 1950.
— O que estamos vendo hoje, com impactos em diferentes cidades, não é apenas por causa da estação seca atual e da umidade mais baixa, mas devido a um efeito acumulado da falta de chuva desde o verão de 2023-2024 — apontou Ana Paula, ao destacar que se trata da mais intensa e extensa dos últimos pelo menos 70 anos.
Somente dois dos 26 Estados e o Distrito Federal "não estão afetados severamente pela escassez hídrica severa", afirmou a ministra do Meio Ambiente, Marina Silva, nesta quarta-feira diante de uma Comissão do Meio Ambiente no Senado que a convocou para entender a resposta do governo à situação:
— Esses processos estão se tornando cada vez mais intensos, cada vez mais severos e frequentes.
Em um panorama inédito, nuvens de fumaça provenientes principalmente dos incêndios na Amazônia cobriram nos últimos dias grandes cidades como Brasília, onde não chove há mais de 130 dias. Também foi declarado na terça-feira (3) um grande incêndio na Floresta Nacional de Brasília, uma área responsável por 70% do abastecimento de água da região.
Imensas nuvens de fumaça eram visíveis sobre essa área vegetal de 9 mil hectares, enquanto equipes de bombeiros lutavam contra os fortes ventos, a baixa umidade e o material combustível para tentar conter as chamas, que se espalhavam por quilômetros.
Mais fogo que pessoal
É um "combate muito difícil, muito arriscado", explicou Fábio Dos Santos Miranda, que gerencia a floresta:
— Conseguimos preservar algumas áreas importantes, mas perdemos uma área muito significativa.
Os esforços estavam focados em proteger a vegetação que margeia e cobre os corpos d'água no parque, parte do Cerrado, também ameaçado pela seca e pelos incêndios. Na maioria dos incêndios recentes no Brasil, as autoridades suspeitam de ação humana.
— Há muitos focos de incêndio, mais do que pessoal disponível", disse o bombeiro Diego Rodríguez. Até a tarde desta quarta-feira as chamas ainda não estavam sob controle.
Com a previsão de alta temperatura, vento forte e baixa umidade, há um "cenário muito propício" para novos incêndios no Brasil, afirmou na semana passada a ministra Marina Silva.
Nos arredores de Brasília, a diretora de escola Cristiane Milane não via um fim para a situação.
— Na região, com certeza, todos vamos ficar apreensivos com a fumaça, com o fogo e com medo.
Especialistas relacionam esses eventos climáticos extremos ao recente fenômeno El Niño e ao aquecimento global causado pela atividade humana.