Entenda a reportagem em cinco pontos:
1. Governo do Estado propôs à Assembleia Legislativa votar em regime de urgência o projeto de lei que cria o novo código ambiental do Rio Grande do Sul.
2. Produtores de soja, engenheiros ambientais e sanitários, professores e pesquisadores ligados a diferentes entidades pedem mais tempo ao Estado para avaliar a proposta.
3. A Secretaria Estadual do Meio Ambiente e Infraestrutura informa que segue aberta a mudanças no PL até a votação, programada para ocorrer até 29 de outubro.
4. A Assembleia Legislativa promoverá uma audiência pública no próximo dia 21, a partir das 17h, no Auditório Dante Barone, para discutir a questão.
5. Na semana passada, GaúchaZH publicou com exclusividade 15 pontos de uma análise preliminar do projeto que preocupam ambientalistas e o grupo de trabalho composto por 13 promotores ambientais e urbanísticos do Ministério Público (MP) do Estado.
Deputados estaduais e o governo do Estado vêm recebendo um bombardeio de cartas e notas públicas, desde a semana passada, enviadas pelas mais diferentes entidades e relacionadas ao projeto de lei (PL) que cria um novo código ambiental do Rio Grande do Sul. Todas contêm o mesmo pedido: a retirada do regime de urgência da votação do PL na Assembleia Legislativa, prevista para até o dia 29 deste mês.
Apesar de reconhecerem a necessidade de atualização do código, em vigor desde 2000, para acompanhar a evolução do pensamento técnico e as mudanças na legislação nacional, produtores de soja, engenheiros ambientais e sanitários, professores e pesquisadores pedem mais tempo ao Estado para serem discutidas com a sociedade as mais de 480 inclusões, alterações e retiradas nos 216 artigos propostos.
GaúchaZH publicou com exclusividade, na semana passada, 15 pontos de uma análise preliminar do projeto que preocupam ambientalistas e o grupo de trabalho composto por 13 promotores ambientais e urbanísticos do Ministério Público (MP) do Estado. Além de sugerir a retirada do regime de urgência, para uma avaliação mais aprofundada sobre o tema, o MP apontará sugestões ao projeto.
Em nota pública encaminhada ao governador Eduardo Leite, a Associação Brasileira de Engenharia Sanitária e Ambiental — Seção Rio Grande do Sul (ABES-RS) pede uma discussão ampla com a sociedade. "O PL 431/2019, no entanto, faz muitas e significativas alterações no ordenamento jurídico estadual. Um projeto desta complexidade precisa ser amplamente discutido pela sociedade. Por esse motivo, solicitamos a retirada do Regime de Urgência, viabilizando a participação ativa dos diferentes setores e o aprimoramento técnico e legal do PL. Entre outros aspectos, é fundamental rever incorreções conceituais que, se não corrigidas, resultarão em insegurança jurídica e retrocessos importantes".
— Uma legislação longa como esta não poder ser avaliada tão rapidamente. É preciso uma análise com cuidado — aponta a presidente da ABES-RS, Jussara Kalil.
Já a Associação dos Produtores de Soja do Rio Grande do Sul (Aprosoja), o Clube Amigos da Terra e a Comissão Rural Jovem de Santiago, Unistalda e Capão do Cipó uniram-se numa carta endereçada a cada um dos 55 deputados estaduais. Eles pedem discussão ampla do tema e apontam o que chamam de "flagrantes indícios de insegurança jurídica no projeto". "Após análise do referido Projeto de Lei, produtores rurais e entidades representativas concluíram que o seu conteúdo não apresenta avanços naquilo que a sociedade civil espera no momento: eficiência do Estado no cumprimento do seu dever, desburocratização, redução de custos e estímulo à atividade produtiva, quer seja industrial, urbana e rural".
— Este novo código não é uma atualização, mas uma continuação do que já existe. Para piorar, o Estado se propõe a fiscalizar, mas sem dar a devida segurança necessária dentro do projeto — insiste o presidente da Aprosoja, Luis Fernando Fucks.
Pedido de estudos técnicos e discussão com a sociedade
Outra entidade que se manifestou publicamente em carta aberta endereçada ao governador e à Assembleia Legislativa foi o Instituto de Biociências da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS). O texto, assinado pela diretora do Instituto, Clarice Fialho, pelo vice-diretor Luiz Roberto Malabarba e por 31 professores doutores também pede mais tempo para avaliação. "Uma revisão abrangente deveria ter sido precedida de estudos técnicos e discussão com a sociedade. Além disso, a proposta atual não introduz avanços que atendam desafios socioambientais emergentes. Ao contrário, fragiliza a gestão socioambiental no Estado".
— Reconhecemos que a legislação deve ser aperfeiçoada, mas não existe tempo hábil para todas estas mudanças. O novo código retira 14 artigos do código florestal referentes à flora e às espécies ameaçadas e isso precisa ser revisto — alerta Paulo Brack, coordenador do Instituto Gaúcho de Estudos Ambientais e um dos professores do Instituto Biociências da UFRGS que assinou o documento.
Em nota, o presidente da Federação das Associações de Municípios do Rio Grande do Sul (Famurs), Dudu Freire, e a assessora técnica da Área de Meio Ambiente da Famurs, Marion Heinrich, destacaram que "diversas mudanças trazidas pela proposta apresentada pelo Governo do Estado já estavam sendo aguardadas, já que a Lei 11.520/2000, que institui o Código Estadual de Meio Ambiente, possui praticamente vinte anos de vigência. Em razão das transformações ocorridas nas últimas décadas e do descompasso existente com legislações federais que tratam da temática ambiental, a atualização da norma estadual se faz necessária, para evitar conflitos na hora de sua aplicação e trazer maior segurança jurídica para os empreendedores e órgãos ambientais". Porém, ambos entendem que 30 dias "não é um tempo adequado para discutir um tema tão complexo e importante".
A Associação Gaúcha dos Advogados de Direito Ambiental Empresarial (AGAAE) também considera imprescindível a atualização do código ambiental por considerar ultrapassado o que está em vigência. Em manifestação pública, a AGAAE disponibilizou-se a colaborar com a discussão antes da votação do PL. "Cabe pontuar, desde logo, que tal atualização é necessária especialmente para compatibilização com normativas federais mais recentes que trouxeram novos regramentos sobre Áreas de Preservação Permanente (Lei Federal 12.651/12), Mata Atlântica (Lei Federal 11.428/06), Licenciamento e Fiscalização Ambiental (Lei Complementar 140/11), por exemplo. Assim, a AGAAE apoia as mudanças voltadas a suprimir ou adequar os dispositivos em conflito com essas e outras normas de abrangência nacional". A associação também vê como positiva a proposta de inclusão das licenças Ambiental Única, de Operação e Regularização e a Licença por Adesão e Compromisso (LAC)".
— Não fechamos uma posição sobre este ponto (retirada do regime de urgência), a concordância na diretoria foi para que se possibilite algum instrumento de participação, como audiência pública — ressalta a presidente da AGAAE, Fabiana Figueiró.
Na contramão de outras entidades, a OAB-RS informou, por meio da assessoria de imprensa, que nem entidade nem a comissão de direito ambiental da OAB-RS, presidida por Marília do Nascimento, irão se manifestar sobre o tema, que ainda está em discussão interna.
Sema diz estar aberta a mudanças e Assembleia fará audiência pública
Por meio de nota, a Secretaria Estadual do Meio Ambiente e Infraestrutura informou que "o governo recebeu os pedidos, mas está com as atenções voltadas a receber e analisar todas as contribuições". E reforçou que "ainda que o projeto de lei esteja em tramitação na Assembleia Legislativa, está recepcionando sugestões, observações e apontamentos de entidades que representam os setores da economia, institutos de pesquisa, associações de funcionários e órgãos públicos, referentes ao projeto de lei do novo Código do Meio Ambiente".
A pasta destaca, ainda, que as sugestões recebidas serão integralmente avaliadas e terão manifestação do órgão aos deputados que avaliam neste momento o texto. "O novo Código Ambiental foi amplamente discutido em uma subcomissão criada na Assembleia Legislativa para debater o tema."
A Sema assegura sua presença, na próxima segunda-feira (21), em uma audiência pública para discutir o projeto de lei com a sociedade, promovida pela Assembleia Legislativa. O debate será realizado no Auditório Dante Barone, a partir das 17h, com transmissão "ao vivo", da TVAL.
Proposta pelo líder do governo, deputado estadual Frederico Antunes (PP), em conjunto com os parlamentares Elton Weber (PSB) e Gabriel Souza (MDB), a audiência sobre o projeto que institui a nova legislação ambiental estadual será realizada em conjunto com as comissões de Constituição e Justiça; Agricultura, Pecuária e Cooperativismo; e de Saúde e Meio Ambiente.
— Num prazo recorde, conseguimos por unanimidade, em quatro comissões da Assembleia, a aprovação da realização deste debate sobre o Projeto de Lei 431/2019, que institui o Código Estadual do Meio Ambiente — comemorou Frederico Antunes.