A RS-118 está com ares de freeway. Carros deslizam pelas quatro pistas da recém-concluída duplicação dos 21,5 quilômetros que separam Sapucaia do Sul de Gravataí — principal trecho dessa estrada da Região Metropolitana. A inauguração da obra aconteceu na quarta-feira (23), sob olhar quase incrédulo de moradores das margens da rodovia. O motivo: a obra durou 14 anos. E ainda faltam detalhes de acabamento.
João Martins, 11 anos, que o diga. Quando ele nasceu, a novela da duplicação da RS-118 já durava três anos. As obras começaram em em julho de 2006. Joãozinho nasceu e cresceu vendo operários, poeira e lama em frente a sua casa. Ficou intrigado ao ser informado, pela reportagem, que as obras começaram antes de ele ser um projeto de gente.
— Nossa, pro senhor ter ideia, nunca atravessei para o outro lado da faixa. Minha mãe não deixa. E vou continuar sem atravessar, faltam aquelas pontes pras pessoas passarem — descreve o garoto.
As pontes a que Joãozinho se refere são passarelas para pedestres. Seis delas estão previstas, nenhuma ainda implementada. Quando quer ir para o outro lado de Sapucaia, a mãe de João, a manicure Andressa Martins, leva 15 minutos caminhando por centenas de metros até cruzar por baixo de um viaduto, numa via transversal, que também liga a cidade ao vizinho município de Esteio.
— Melhorou muito, é preciso admitir. Deve diminuir o barro das obras e o nosso terreno vai valorizar. Mas ainda falta muita coisa para tornar a faixa segura — pondera Andressa, que mora desde 1992 às margens da rodovia.
Por ela, Joãozinho vai continuar seus passeios curtos de bicicleta sem cruzar a rodovia. Com isso, ele só frequenta casa de colegas de escola que vivem de um lado da estrada.
Há razão para o temor. A velocidade dos veículos na rodovia contribui para muitos acidentes. Joãozinho lembra de um carro que capotou e veio parar na entrada da sua casa. Pelo menos as colisões serão menos frequentes com a duplicação, reconhece Andressa.
Moradora de Esteio, a recicladora Elisa Menezes reluta em celebrar a duplicação. Ela mora às margens da RS-118 e diz que jamais foi indenizada quando a obra tomou parte de um terreno onde ficava um depósito seu.
— Até agora, 279 famílias não receberam tudo a que tinham direito. E o pior é que muitas, como eu, perderam também o aluguel social que era pago pela prefeitura. Para os motoristas está ótimo, mas nossa situação não mudou — reclama Elisa.
Eduardo Souza Vargas, de Sapucaia do Sul, é outro que reivindica indenização. Ele diz que seu terreno tinha 12 metros por 37 de área. Ficou em 12 m por 12 m, após a duplicação. O governo estadual teria alegado que a área já foi indenizada no passado, durante a construção da rodovia em pista simples.
A reportagem não conseguiu contato com os setores encarregados da questão de indenizações territoriais em área contígua à rodovia.
Dois microempresários que atuam às margens da estrada estão otimistas. Fernando Ávilla, dono de uma borracharia em Esteio, acredita que os negócios vão melhorar com a duplicação, mesmo que até hoje tenha se beneficiado da buraqueira da RS-118.
— O asfalto melhorou, terá menos pneu furado, lógico. Mas o fluxo de veículos aumentou muito. Como lido também com suspensão, soldas, acho que sairei no lucro — estima Ávilla.
Já Antônio Vanildo Schmitz, dono de dois caminhões-guincho em Esteio, crê que o número de clientes possa aumentar, mesmo com a melhoria nas condições da rodovia.
— Sempre aparece gente com motor encrencado, pane elétrica, coisas que nada tem a ver com buraco. Aí trabalhamos nisso. E vai dar mais serviço, com mais fluxo de veículos — calcula.