
A mulher acusada de matar o pai e a madrasta e queimar os corpos em uma churrasqueira, em 2022, morreu após sair da prisão para tratar uma infecção na última quinta-feira (20). A despedida de Cláudia de Almeida Heger, 51 anos, ocorre na tarde deste sábado (22), em Porto Alegre.
Cláudia respondia pelo homicídio e ocultação de cadáver de Rubem Heger, 85 anos, e da esposa dele, Marlene dos Passos Stafford Heger, 53, junto de Andrew Heger Ribas, 29, filho dela. Rubem era pai de Cláudia e avô de Andrew.
Em nota, a Secretaria de Sistemas Penal e Socioeducativo (SSPS) informa que Cláudia foi transferida ao Centro de Custódia Hospitalar Vila Nova, na última quarta (19), a pedido do médico responsável da Unidade Básica de Saúde da Penitenciária Estadual Feminina de Guaíba, onde ela estava presa desde maio de 2023.
Cláudia faleceu no dia seguinte à internação. Segundo a Polícia Penal, o atestado de óbito aponta como causas do falecimento complicações devido a comorbidades: apenada tem registro de diabetes, obesidade, hipertensão arterial e infecção do trato urinário.
Segundo a Funerária Zona Sul, do Grupo Mathias, a despedida ocorre entre 17h30min e 18h30min deste sábado, na Capela I do Cemitério São Miguel e Almas, no bairro Azenha, em Porto Alegre. De acordo com a Central Funerária da Capital, o corpo deve ser cremado em Glorinha.
Júri cancelado
Cláudia e o filho Andrew seriam submetidos ao Tribunal do Júri no dia 27 de novembro de 2024. Contudo, a sessão foi cancelada após Andrew firmar um acordo de delação premiada com o Ministério Público (MP). Na delação, ele revelou que o casal foi morto por ingestão de uma substância colocada na comida deles por Cláudia.
Na sequência, segundo o relato, Andrew e a mãe levaram os corpos para a própria residência, onde incineraram os restos mortais em uma churrasqueira. Na decisão que anulou o júri, o juiz Marco Luciano Wächter, da 1ª Vara Criminal da Comarca de Cachoeirinha, determinou que fosse aguardada a realização de um procedimento pericial para que, depois do resultado, fosse marcada nova data. Ainda não há uma nova data.
O advogado Bruno Pereira Baum, que representa Rafael Heger, neto de Rubem, divulgou uma nota nas redes sociais tratando sobre o possível falecimento de Cláudia e reiterando que segue "acompanhando a situação e adotando as medidas legais cabíveis para que os trâmites sejam conduzidos com transparência e celeridade".
Em nota enviada à reportagem, a defesa de Claudia disse que foram apresentadas e comprovadas "incontáveis vezes" ao Judiciário a gravidade do quadro de saúde dela.
"A dignidade, as garantias fundamentais e os direitos humanos de Cláudia foram severamente violados pelo judiciário brasileiro", afirma o texto assinado pelos advogados Thaís Comassetto Felix, Robertha Ferreira da Silva e Daniel Eduardo Cândido (leia a íntegra no fim da reportagem).
Relembre o caso

No dia 27 de fevereiro de 2022, o casal de idosos foi visitado por Cláudia e Andrew em sua residência, localizada em Cachoeirinha, na Região Metropolitana. Depois deste dia, o idoso e a esposa nunca mais foram vistos.
Câmeras de videomonitoramento registraram a chegada e a permanência dos visitantes na casa do bairro Vila Regina por mais de quatro horas. O desaparecimento verificado no mesmo dia desencadeou mobilização de familiares.
Buscas foram realizadas pela Polícia Civil para determinar o paradeiro do casal, mas eles nunca foram encontrados. A investigação concluiu que Rubem e Marlene foram assassinados. A polícia indiciou Cláudia e Andrew.
A tese do Ministério Público (MP) é de que Cláudia teria planejado matar o pai e a madrasta. A motivação, segundo o MP, seriam desavenças que ela tinha com ele, por interesse financeiro.
Em 2016, teria ocorrido um falso sequestro, pelo qual a mulher responde processo. O fato é apontado como motivo do rompimento da relação de pai e filha, e que teria levado ao planejamento do crime. É esse contexto que a acusação deve levar ao júri dos dois.
Em setembro de 2023, o juiz Marco Luciano Wächter, da 1ª Vara Criminal de Cachoeirinha, decidiu enviar os réus ao Tribunal do Júri. As defesas recorreram, tentando reverter a decisão. O Tribunal de Justiça negou os pedidos e manteve o veredito do magistrado.
Às vésperas de ser levado a júri, Andrew Heger Ribas, 29 anos, firmou delação premiada em 14 de novembro do ano passado, revelando detalhes sobre as mortes do avô e da esposa dele.
Andrew contou na delação que os idosos foram mortos por ingestão de uma substância colocada na comida deles por Cláudia. Ele também disse que ajudou a mãe a transportar e queimar os corpos do avô e de sua esposa. Os cadáveres foram incinerados um a um na churrasqueira da casa onde Cláudia e o filho viviam, no bairro Niterói.
A reportagem de Zero Hora esteve nesta casa entrevistando Cláudia em 2022, três meses após as mortes. Na ocasião, ela negou qualquer tipo de envolvimento com o desparecimento do casal. Já Andrew não conversou com a reportagem durante a entrevista. Segundo a mãe, ele não se comunicava verbalmente em razão da esquizofrenia.
Em novembro de 2022, o Instituto Psiquiátrico Forense (IPF), onde Andrew segue internado, emitiu laudo no qual considerou o réu inimputável — ou seja, incapaz de compreender os atos criminosos dos quais é acusado. Por essa razão, ele permanece no instituto.
Contrapontos
O que diz a Polícia Penal
A Polícia Penal informa que a apenada em questão foi transferida ao Centro de Custódia Hospitalar Vila Nova, na última quarta (19), a pedido do médico responsável da Unidade Básica de Saúde da Penitenciária Estadual Feminina de Guaíba, onde estava recolhida desde maio de 2023. No dia seguinte à internação, ela veio a óbito. O atestado aponta como causas do falecimento complicações devido a comorbidades: apenada tem registro de diabete, obesidade, hipertensão arterial e infecção do trato urinário.
O que diz a defesa de Cláudia de Almeida Heger
A defesa de Cláudia se manifestou por meio de nota assinada pelos advogados Thaís Comassetto Felix, Robertha Ferreira da Silva e Daniel Eduardo Cândido:
"Desde que assumimos a defesa de Cláudia de Almeida Heger, em dezembro de 2023, apresentamos e comprovamos incontáveis vezes ao Judiciário a urgência e a gravidade do quadro de saúde que Cláudia apresentava, situação que foi comprovada pela Polícia Penal inúmeras vezes. Cláudia contraiu citomegalovírus no cárcere e depois disso ficou tetraplégica. Ficou absolutamente dependente de outras colegas de cela. O Judiciário nunca considerou o teor dos relatórios médicos que a própria Polícia Penal enviava ao processo. A doença que vitimou Cláudia era imaginária, segundo o judiciário. A dignidade, as garantias fundamentais e os direitos humanos de Cláudia foram severamente violados pelo judiciário brasileiro. Cláudia foi vítima do que existe de mais lamentável na justiça penal brasileira: o total descrédito dirigido aos acusados. Lamentavelmente, Cláudia entrou no sistema prisional caminhando e saiu de lá para o seu sepultamento."