O gabinete do ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), encerrou na terça-feira (29) a fase de depoimentos dos cinco réus na ação penal que trata do assassinato da vereadora Marielle Franco e do motorista Anderson Gomes, ocorrido em 2018, no Rio de Janeiro.
Com o encerramento dos depoimentos, que foram conduzidos pelo desembargador Airton Vieira, auxiliar de Moraes, a fase de instrução oral foi encerrada. A partir de agora, as defesas e a acusação terão prazo de cinco dias para requererem as diligências que acharem pertinentes para o andamento do processo.
O julgamento do caso é dividido em dois. Enquanto os réus confessos pela execução, Lessa e Queiroz, serão submetidos ao Tribunal do Júri a partir desta quarta-feira (30), os demais suspeitos, incluídos os supostos mandantes, serão julgados em separado, em processo que corre no Supremo Tribunal Federal (STF).
Acusados
Além de Ronald, são réus no processo o deputado federal Chiquinho Brazão (sem partido-RJ), o conselheiro do Tribunal de Contas do Rio de Janeiro (TCE-RJ) Domingos Brazão, irmão de Chiquinho, o ex-chefe da Polícia Civil do Rio de Janeiro Rivaldo Barbosa e Robson Calixto, ex-assessor de Domingos.
Todos respondem pelos crimes de homicídio e organização criminosa e estão presos por determinação de Alexandre de Moraes, relator do caso.
Nos depoimentos prestados durante a instrução, os irmãos Brazão e Rivaldo Barbosa negaram participação no assassinato.
De acordo com a investigação realizada pela Polícia Federal, o assassinato de Marielle está relacionado ao posicionamento contrário da parlamentar aos interesses do grupo político liderado pelos irmãos Brazão, que têm ligação com questões fundiárias em áreas controladas por milícias no Rio.
Conforme a delação premiada do ex-policial Ronnie Lessa, réu confesso de realizar os disparos de arma de fogo contra a vereadora, os irmãos Brazão atuaram como os mandantes do crime.
Júri
Lessa e Élcio Queiroz vão a júri popular nesta quarta-feira (30). O Ministério Público do Rio defendeu hoje que os acusados sejam condenados a 84 anos de prisão.
O ex-policial militar Ronnie Lessa assinou acordo de delação premiada e é réu confesso.
Lessa disse ao depor como testemunha na ação penal no STF, em agosto, que sentiu náusea ao ver o ex-chefe de Polícia Civil do Rio de Janeiro Rivaldo Barbosa abraçando a mãe da vereadora Marielle Franco após o crime.
Ao comentar sobre a corrupção para barrar investigações na delegacia de homicídios do Rio, Lessa disse que Rivaldo tinha influência sobre as investigações do assassinato e era conhecido como "Topa", em alusão à expressão "Topa Tudo por Dinheiro". Ele ainda afirmou que os réus no caso são de "alta periculosidade".
O ex-sargento da Polícia Militar do Rio de Janeiro, Élcio Queiroz prestou depoimento, também na condição de testemunha na ação penal no STF, no dia 30 de agosto.
Élcio dirigiu o carro utilizado pelo ex-policial Ronnie Lessa, réu confesso do assassinato, para matar a vereadora. Ele está preso e assinou acordo de delação no qual assumiu participação no crime.
O ex-policial disse que foi envolvido em uma "rede de mentiras" e não sabia que iria participar do assassinato ao ser chamado por Lessa para dirigir o veículo usado no crime. Élcio afirmou que nunca tinha ouvido falar da vereadora.
O ex-sargento também deu detalhes sobre os momentos que antecederam o assassinato de Marielle.
Ele contou que alertou Lessa sobre a presença de Anderson e de Fernanda Chaves, assessora da vereadora, no carro, e disse que ele poderia "matar inocentes". No entanto. Ronnie acionou o "modo rajada" da submetralhadora HK utilizada no crime. Fernanda não foi atingida pelos tiros e sobreviveu.
— Ouvi os disparos, foi rápido, mas fez muito barulho. Não vi nem a Marielle sendo executada — completou.
Chiquinho Brazão
O deputado federal Chiquinho Brazão (sem partido-RJ), preso preventivamente sob a acusação de ter planejado o assassinato da ex-vereadora, reafirmou sua inocência no caso e novamente disse ter tido boa relação com Marielle na Câmara Municipal do Rio.
— Eu, como parlamentar, sou inocente, e evidente que sei que existe o processo, é normal, mas continuo afirmando que sou inocente. A relação com Marielle, por incrível que pareça, era maravilhosa — afirmou Chiquinho.
Chiquinho também afirmou que Ronnie Lessa, que confessou ser o autor dos disparos que mataram a então vereadora, quis "obter benefícios" na delação feita.
— Acreditamos que ele está protegendo alguém — disse.
Domingos Brazão
Presos desde 24 de março após delação premiada do ex-policial militar Ronnie Lessa. Domingos foi para a penitenciária federal de Porto Velho.
Rivaldo Barbosa
O ex-chefe da Polícia Civil do Rio de Janeiro Rivaldo Barbosa negou ter participado do assassinato da vereadora.
— Eu não mato nem uma formiga, vou matar uma pessoa? — indagou.
O ex-delegado afirmou que foi apresentado a Marielle pelo ex-deputado estadual Marcelo Freixo, de quem a vereadora foi assessora na Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro (Alerj).
Segundo Rivaldo, por ter atuação no campo dos direitos humanos, Marielle era o "elo de ligação" entre ele e Freixo para receber em audiência pessoas que tiveram parentes assassinados e buscavam informações sobre as investigações.
Ele também destacou o trabalho da vereadora na defesa dos direitos humanos e disse que ela contribuiu para a sociedade brasileira.
— No que diz respeito a Rivaldo e Marielle Franco, uma palavra pode definir: gratidão. Sou muito grato a Marielle — completou.
Rivaldo também negou conhecer os irmãos Brazão.
— Eu nunca falei com os irmãos Brazão na minha vida. Nunca tive uma relação política, religiosa, espiritual ou transcendental com eles — afirmou.
Lessa é o principal delator da investigação e réu confesso de realizar os disparos. Segundo ele, Rivaldo e os irmãos Brazão são os mandantes do crime.
Segundo os investigadores, Rivaldo Barbosa “planejou meticulosamente” o crime e ajudou a impedir a investigação inicial do caso.
Ex-delegado Rivaldo Barbosa ficou na penitenciária federal de Brasília.
Robson Calixto Fonseca
O ex-policial militar Robson Calixto Fonseca, conhecido como Peixe, negou ter fornecido a arma usada no assassinato da vereadora Marielle Franco e do motorista Anderson Gomes.
Robson é ex-assessor do conselheiro do Tribunal de Contas do Estado do Rio de Janeiro (TCE-RJ) Domingos Brazão.
Robson Calixto disse que nunca se encontrou com ex-policial Ronnie Lessa. Segundo Lessa, a arma usada no crime foi entregue a ele por Calixto.
— Como um matador de aluguel que já matou mais de 100 pessoas vai precisar pegar uma arma comigo para fazer o trabalho? É inadmissível o que esse sujeito fez. Eu jamais vou fazer isso. Eu tenho 48 anos e preservo minha vida e da minha família — afirmou.
Calixto também afirmou que não tem envolvimento com milícias e grilagem de terras na zona oeste do Rio.
— Nunca fui miliciano. Sempre fui trabalhador — completou.
Major Ronald
O último depoimento no processo foi realizado pelo major da Polícia Militar, Ronald Alves de Paula. Ele negou ter realizado trabalho de monitoramento da rotina de Marielle Franco.
Perguntado pelo juiz que conduziu a audiência sobre sua participação no crime, Ronald disse que não conhecia a vereadora, nem realizou o monitoramento da rotina dela.
— Com todo respeito à família, eu nunca tinha ouvido falar o nome de Marielle — afirmou.
Ele também negou ter ligação com o crime e afirmou que passou o dia do assassinato em um curso de formação da PM.
— Sou inocente de todas as acusações que me foram impostas — completou.
Relembre o crime
A vereadora Marielle Franco e o motorista Anderson Gomes foram assassinados no dia 14 de março de 2018, na Zona Central do Rio de Janeiro. Um Cobalt prata emparelhou com o carro da vereadora, por volta das 21h, e trezes disparos foram efetuados. Marielle foi atingida por quatro tiros na cabeça, Anderson, por três tiros nas costas.