O julgamento de quatro acusados pelo Ministério Público do Estado (MP) por extorsão que resultou na morte da enfermeira Priscila Ferreira Leonardi, 40 anos, começou nesta sexta-feira (26), no Foro de Alegrete, na Fronteira Oeste. Priscila desapareceu em 19 de junho de 2023, após vir da Irlanda para o Brasil. O corpo foi encontrado às margens do Rio Ibirapuitã no dia 6 de julho.
Os quatro homens respondem por extorsão qualificada com restrição da liberdade da vítima, com resultado morte, além de ocultação de cadáver. Entre os acusados, está o primo da vítima, Emerson Leonardi, apontado como idealizador da ação. Os réus foram denunciados no final de novembro, após negociação da primeira delação premiada da história do município.
Durante a audiência, cinco testemunhas de acusação e um delator foram ouvidos. O magistrado Rafael Echevarria Borba decidiu manter a prisão preventiva dos réus. Ainda estão programadas para depor mais três testemunhas.
Segundo o Tribunal de Justiça do Estado (TJ), após o prazo de cinco dias para manifestações de pedidos de diligências e outras providências, uma nova audiência será marcada. Em seguida, serão ouvidas as testemunhas indicadas pelas defesas. Posteriormente, está prevista uma audiência para a oitiva do delator e para o interrogatório dos acusados.
Julgamento
Apesar de terem envolvimento na morte da vítima, eles não são acusados pelo crime de homicídio. Irão responder por extorsão qualificada (em razão da restrição da liberdade imposta à vítima) e majorada, por causa do resultado morte, além de ocultação de cadáver.
O MP explica que ofereceu denúncia desta forma porque o objetivo dos réus não era assassinar Priscila, mas se apossar do dinheiro que havia nas contas bancárias da enfermeira. Além disso, em caso de condenação, a pena é maior do que a de homicídio.
No entendimento do MP, a enfermeira acabou morrendo em decorrência da extorsão e de agressões sofridas durante o delito, o que elimina um caso de homicídio culposo (quando não há intenção de matar), explica a promotora Rochelle Jelinek:
— No crime de homicídio, o investigado tem a intenção principal de matar a vítima. Neste caso da Priscila, porém, o objetivo principal do grupo era extorqui-la, mas, algo deu errado durante o sequestro e ela acabou morta. Não foi possível identificar o motivo, ou seja, se foi um acidente, se algo deu errado no plano, se ela tentou fugir e então a mataram, ou, até mesmo, se algum deles decidiu, durante o sequestro, assassiná-la. Mas sabemos que queriam transferir o dinheiro das contas da enfermeira durante o sequestro. Este foi o objetivo desde o começo e por isso respondem por extorsão com resultado morte — ressalta Rochelle.
Denúncia
O MP havia denunciado nove suspeitos, todos por extorsão qualificada e com resultado morte, ocultação de cadáver e associação criminosa. No entanto, o juiz Rafael Echevarria Borba entendeu não terem sido apresentados elementos que comprovassem a participação dos outros cinco denunciados nos fatos. Ele também não recebeu a acusação em relação a associação criminosa, pelos mesmos motivos.
A promotora Rochelle Jelinek recorreu deste afastamento do delito de associação criminosa para todos e também da decisão de indeferir a acusação contra os demais envolvidos. O julgamento do recurso ainda é aguardado.
Relembre o caso
Priscila morava desde 2019 em Dublin, na Irlanda, onde trabalhava como enfermeira em um lar de idosos. Ela regressou em 2023 a Alegrete, na fronteira oeste do Rio Grande do Sul, para resolver pendências do inventário do seu pai, Ildo, falecido em maio de 2020. Também estava em busca de documentos de ancestrais com a intenção de encaminhar a cidadania italiana. A enfermeira desapareceu na noite de 19 de junho, após sair da residência que fazia parte da herança dela, mas era habitada pelo primo. Priscila tinha ido ao local para buscar pertences de valor sentimental. Ela embarcou, sozinha, em um veículo que supostamente havia sido chamado pelo primo para uma corrida particular, mas que era tripulado por um envolvido na trama.
Depois do desaparecimento, o corpo foi encontrado em 6 de julho, em estado avançado de decomposição, preso a galhos à margem do Rio Ibirapuitã, em Alegrete. Havia sinais de espancamento e uma corda enrolada no pescoço da vítima. O exame de necropsia apontou asfixia como causa da morte. Ainda foi identificado traumatismo encefálico.
Priscila e o primo Emerson tinham disputas patrimoniais. No seu retorno ao Rio Grande do Sul, a enfermeira teria tomado conhecimento de que foram sacados R$ 167,7 mil da conta do seu pai em cheques, em 2020, nas últimas semanas antes da sua morte. As beneficiárias dos valores, em parcelas, foram a esposa do primo e uma outra prima, que hospedava Priscila em sua casa em Alegrete.
A enfermeira havia encaminhado a venda da casa que era do pai dela ao primo Emerson, mas ele não havia cumprido acordos de pagamento em duas ocasiões. Por isso, ela ingressou com processo judicial de cobrança de mais de R$ 200 mil contra Emerson no início de 2023. Esse era outro ponto de tensão na relação entre eles. O primo chegou a atuar como cuidador do pai de Priscila antes da morte dele.