Depois de contato feito por redes sociais, Laura (nome fictício), 47 anos, aceitou se reunir com uma equipe da agência de modelos Life Models, em Porto Alegre. No encontro, a moradora de Gravataí ouviu que tinha o perfil que empresas procuravam para campanhas de publicidade, e que tinha potencial para ao menos três trabalhos nos meses seguintes. Para isso, precisava assinar contrato com a agência e comprar cursos de preparação. Após gastar R$ 3 mil, ela afirma que não fez nenhuma campanha e se diz vítima de estelionato. O caso foi registrado na polícia, que afirma ter ao menos outras oito ocorrências semelhantes na Capital.
Procurada por GZH, a agência afirmou que não garante trabalhos ao assinar contratos e que o episódio se trata de um "mal entendido". Confira abaixo o contraponto.
Conforme Laura, o primeiro contato foi feito em setembro do ano passado, por uma olheira (também conhecido como scouter) da agência, que a convidou para uma reunião. A fotógrafa afirma que foi até o local combinado, no centro da Capital, desconfiada.
— Fiquei com receio, eu disse que não tenho o perfil de modelo, mas falaram que isso já não existe mais. Disseram que já tinham trabalhos para mim, dois em dezembro e um em janeiro, que era uma ótima oportunidade. Eles me falaram que ao menos dois trabalhos por mês era certo que eu conseguiria, mas que precisava ter carteira de modelo ou não poderia trabalhar. Por isso teria que comprar os cursos deles — lembra ela.
Segundo a autônoma, um produtor da agência afirmou que ela ganharia o valor de R$ 1,5 mil em cada trabalho já previsto, o que daria um total de R$ 4,5 mil com os jobs de dezembro e janeiro. Já os cursos de preparação da agência, além de um book fotográfico, custavam R$ 6 mil.
— Eles pediram uma entrada de R$ 3 mil, que fizemos em 12 vezes. O restante do valor eles disseram para eu não me preocupar, que eles iriam abatendo dos trabalhos que eu fizesse. Só que é um golpe. Eu fiz só uma aula presencial, em novembro, e o resto é tudo online. E nem são aulas, é só uma enrolação. O ensaio de fotos tem uma qualidade péssima, não teve edição. Não sei como iriam apresentar aquilo para um cliente.
A mulher afirma que busca respostas junto a funcionários da agência, mas que não tem retorno satisfatório desde dezembro.
— Pararam de me responder, acho que me bloquearam. Não ocorreram os trabalhos prometidos. Esses dias avisaram de uma data de curso, mas eu já disse que não quero mais. Vi que é só enrolação. Pedi para cancelarem o contrato e devolverem meu dinheiro e nada.
O relato da fotógrafa é semelhante ao de uma moradora de Ivoti, Priscila (nome fictício), 41 anos. Ela afirma que também foi contatada pelas redes sociais e que, em reunião com o mesmo produtor da agência, também lhe garantiram retorno financeiro.
— Prometeram mundos e fundos, vários trabalhos, em dezembro e janeiro, um seria uma campanha de carro. Ele disse que eu não ia me arrepender, que não é fácil conseguir pessoas da minha idade para ser modelo, com rosto jovial. Aí disse que precisava fazer os cursos.
Priscila diz que pagou R$ 1,5 mil, o valor que tinha na conta no dia da reunião, em outubro. O restante seria pago aos poucos. Desde então, afirma que também não foi chamada para trabalhos como modelo.
As duas mantêm um grupo com outros dois homens e uma mulher, que afirmam ter passado pela mesma situação com a agência. Em sites como Reclame Aqui também há mais relatos similares.
"A gente fica com vergonha", diz mulher
Conforme Laura, o objetivo ao firmar o contrato era buscar uma renda extra. Hoje, ela afirma que segue pagando as parcelas, com dificuldade, sem ter conseguido cancelar o serviço.
— Está tudo tão difícil, achei que seria uma oportunidade de ter uma renda melhor. Até hoje não acredito que caí nesse golpe. Tenho vergonha de ter passado por isso, mas não dá para ficar quieta. Sigo pagando o cartão, apertada, uma parcela de R$ 250 por mês. Tem um monte de gente, de tudo que é cidade, com essa mesma história. Teve gente que fez empréstimo para pagar eles e até agora não teve nenhum retorno também. Em uma aula online que fiz, tinham mais de cem pessoas. Imagina quantas já sofreram esse golpe — lamenta Laura.
Está tudo tão difícil, achei que seria uma oportunidade de ter uma renda melhor. Até hoje não acredito que caí nesse golpe. Tenho vergonha de ter passado por isso, mas não dá para ficar quieta.
LAURA
Fotógrafa
As duas mulheres ouvidas pela reportagem registraram boletim de ocorrência, afirmando terem sido vítimas de estelionato. Os casos, em Gravataí e Ivoti, foram registrados na última semana, e ainda serão distribuídos à delegacia que ficará com a investigação.
Em Porto Alegre, a Polícia Civil afirma que há outros oito registros contra a empresa, feitos nos últimos quatro meses. Na sexta-feira (2), GZH entrou em contato com a delegacia regional de Porto Alegre, para verificar se há inquérito em aberto e mais detalhes, mas não obteve informações em razão do feriado.
Empresa nega que tenha aplicado golpes
A agência Life Models negou que aplique golpes e afirma que o trabalho é desenvolvido de forma séria. A sócia-proprietária da empresa, Fernanda Vaz, 39 anos, disse que as situações relatadas surgiram de um "mal entendido".
— Tudo o que falamos no atendimento de novos agenciados é colocado no contrato. Não existe garantia de trabalhos, campanhas de publicidade. Isso é deixado muito claro, até porque não há como garantirmos isso, não depende só da gente que eles consigam trabalho — afirma ela.
Fernanda diz ainda que o valor cobrado é para cursos de formação. No entanto, muitos dos novos agenciados não aceitam fazer as dinâmicas, afirma.
— É feita a contratação de preparação. Eles precisam fazer os cursos, o material fotográfico e aí depois são encaminhados ao mercado da moda. O que acontece é que muitos se negam a ir às aulas. A maioria mora longe e não participa. Também, por isso, oferecemos aula online, toda semana. A presencial é uma vez por mês.
Segundo Fernanda, nesta segunda-feira (5), está prevista uma aula de teatro.