Em 19 de dezembro, Roseli Aparecida Folmer Lenz, 37 anos, escreveu em sua página numa rede social que havia se separado do marido, por decisão própria, e acrescentou: “Nós mulheres temos o direito de viver livres, sermos respeitadas”. Após o fim da relação, no ano passado, a moradora da área rural de Sobradinho, no Vale do Rio Pardo, vinha tentando retomar a vida. Na última quinta-feira (11), Rosi, como era chamada pelos familiares, foi morta a facadas. O ex-marido é o principal suspeito do feminicídio.
Após se separar de Osair Lenz, 40 anos, Rosi tinha deixado a casa onde morava e ido residir na antiga moradia da mãe, na localidade de Sanga Funda. Foi próximo dali que ela foi assassinada na tarde da última quinta-feira. Segundo familiares, o ex-marido teria ido até o local para buscar um dos filhos e depois regressado e atacado a vítima. Atingida por golpes de faca no peito, abdômen e pescoço, a mulher não resistiu aos ferimentos. O homem fugiu do local logo após o crime. Ele foi preso nesta segunda-feira (15).
— Ela não teve chance de defesa. Estamos sem chão e com medo — diz uma familiar, que prefere não ser identificada.
Na mesma tarde, o homem ainda teria, segundo familiares da vítima, colocado fogo a uma estufa de tabaco de um dos irmãos de Rosi. Nascida numa família de agricultores, ela trabalhou boa parte da vida na roça e como dona de casa. Após decidir se separar, tinha começado a trabalhar meio turno como acompanhante de uma idosa, próximo do local onde passou a residir. Em uma das últimas mensagens enviadas a uma familiar, contou que nesta semana daria andamento ao divórcio.
— Ela havia se separado pelo fato de que não aguentava mais as brigas. Ela achava que ia dar tudo certo, mas não. O sonho dela era recomeçar e ter tudo novamente, criar bem os filhos. Mas não pretendia mais se casar. Estava bonita, feliz— conta a familiar.
No post que fez nas redes sociais em dezembro, Rosi escreveu “Sou mãe, me separei. Foi uma decisão minha, cuidar de minha vida e saúde. Não quero ninguém. Tenho meu amor próprio, sei o meu valor como mulher e mãe”. Segundo a família, a dona de casa estava em tratamento de saúde, após sofrer uma paralisia parcial no rosto.
Despedida
Na tarde em que foi morta, pouco mais de uma hora antes, Rosi postou uma foto nas redes sociais, sorridente. Ela era mãe de um menino de sete anos e de uma adolescente de 17. Rosi também deixou nove irmãos — outros dois já são falecidos — e sobrinhos. O corpo dela foi velado na Capela Nossa Senhora da Conceição, de Vila Gramado, em Sobradinho, e sepultado no fim da tarde da última sexta-feira (12), no Cemitério de Segredo:
— Ela era uma pessoa doce, de voz mansa, de coração grande, amava todo mundo.
Foi uma grande perda, algo muito cruel — desabafa outra familiar.
A morte de Rosi causou comoção na comunidade em Sobradinho. Outros parentes e amigos se manifestaram pelas redes sociais, lamentando a perda trágica.
— Queremos justiça — diz a familiar.
A Polícia Civil enviou nota, na tarde desta segunda-feira, informando que o suspeito foi preso preventivamente e encaminhado ao Presídio Estadual de Sobradinho. GZH tenta contato com a defesa de Osair Lenz para contraponto.
Feminicídios
O Rio Grande do Sul teve queda de 21,6% nos feminicídios em 2023, em comparação ao ano anterior. Foram 87 casos de mortes de mulheres nesse contexto, enquanto em 2022 tinham sido 111. No último ano, o governo lançou algumas iniciativas na tentativa de reduzir esse tipo de crime no Estado. Entre elas, está o monitoramento de agressores por meio de uso de tornozeleiras eletrônicas.
Em janeiro deste ano, foram registrados novos casos de feminicídio no Estado. Entre eles, estão o assassinato de uma ex-candidata a vereadora em Osório, que teve o corpo encontrado dentro de uma geladeira. Nara Denise dos Santos, 61 anos, era bastante conhecida no município do Litoral Norte. O companheiro dela, Marcos do Nascimento Falavigna, 37 anos, foi preso em flagrante pelo crime.
O primeiro caso do ano foi registrado na zona leste de Porto Alegre, onde Mayla Cardoso, 31 anos, mãe de três filhos, teria sido assassinada com golpes de chave de fenda. O ex-namorado da vítima, de 32 anos, foi preso em flagrante no local — o nome dele não foi divulgado.
Como pedir ajuda
Brigada Militar – 190
- Se a violência estiver acontecendo, a vítima ou qualquer outra pessoa deve ligar imediatamente para o 190. O atendimento é 24 horas em todo o Estado.
Polícia Civil
- Se a violência já aconteceu, a vítima deverá ir, preferencialmente à Delegacia da Mulher, onde houver, ou a qualquer Delegacia de Polícia para fazer o boletim de ocorrência e solicitar as medidas protetivas.
- Em Porto Alegre, a Delegacia da Mulher na Rua Professor Freitas e Castro, junto ao Palácio da Polícia, no bairro Azenha. Os telefones são (51) 3288-2173 ou 3288-2327 ou 3288-2172 ou 197 (emergências).
- As ocorrências também podem ser registradas em outras delegacias. Há DPs especializadas no Estado. Confira a lista neste link.
Delegacia Online
- É possível registrar o fato pela Delegacia Online, sem ter que ir até a delegacia, o que também facilita a solicitação de medidas protetivas de urgência.
Ministério Público
- As vítimas podem procurar a Promotoria de Justiça mais próxima. Em Porto Alegre, o contato pode ser feito com o Espaço Bem-Me-Quer de Acolhimento às Vítimas, localizado na sede do MP, pelo WhatsApp 51 98779876 ou pelo telefone 32951410.
Central de Atendimento à Mulher 24 Horas – Disque 180
- Recebe denúncias ou relatos de violência contra a mulher, reclamações sobre os serviços de rede, orienta sobre direitos e acerca dos locais onde a vítima pode receber atendimento. A denúncia será investigada e a vítima receberá atendimento necessário, inclusive medidas protetivas, se for o caso. A denúncia pode ser anônima. A Central funciona diariamente, 24 horas, e pode ser acionada de qualquer lugar do Brasil.
Defensoria Pública – Disque 0800-644-5556
- Para orientação quanto aos seus direitos e deveres, a vítima poderá procurar a Defensoria Pública, na sua cidade ou, se for o caso, consultar advogado(a).
Centros de Referência de Atendimento à Mulher
- Espaços de acolhimento/atendimento psicológico e social, orientação e encaminhamento jurídico à mulher em situação de violência.