Determinada como medida de segurança contra a comunicação entre apenados e suas conexões — especialmente entre células do crime organizado —, a inexistência de tomadas de energia elétrica nas celas das novas penitenciárias passa a inspirar questionamentos. A decisão está pautada pelo intuito de impedir o carregamento de telefones móveis nas cadeias. Contudo, impossibilita a utilização de outros aparelhos alimentados por eletricidade, como cafeteiras e ventiladores.
— Trata-se de uma restrição importante no que diz respeito a desestimular a utilização de celulares nas prisões. É importante quebrar a comunicação do crime organizado. Porém, é muito importante também acompanharmos a situação relacionada às condições de habitação das novas penitenciárias — aponta a presidente da Comissão de Cidadania e Direitos Humanos da Assembleia Legislativa, deputada Laura Sito (PT).
A parlamentar indica que a observação sobre condições de temperatura durante o período mais quente de verão constitui uma preocupação "razoável".
— Especialmente nos meses de dezembro e janeiro, faz muito calor aqui no Estado, o que torna necessária a avaliação sobre a condição de temperatura nos espaços de habitação para cumprimento de pena — afirma a deputada.
Laura Sito antecipa que não está descartada a possibilidade de uma inspeção nos novos ambientes por integrantes da Comissão de Cidadania e Direitos Humanos.
A ausência de acesso à rede de eletricidade tem produzido queixas e questionamentos desde o início da ocupação das novas estruturas da Penitenciária Estadual de Charqueadas (PEC) II, inaugurada em 27 de novembro. A unidade tem capacidade para 1.650 apenados, tendo blocos de celas distribuídos em dois grandes prédios.
Cada cela acomoda até oito homens, em camas individuais constituídas do mesmo material com o qual foram construídas as divisórias e paredes internas. Trata-se de um tipo de concreto de alto desempenho moldado sobre fibras de polipropileno, o que dá um aspecto menos denso e espesso às estruturas, embora seja considerado mais resistente e durável do que o concreto armado sobre ferragem.
Além disso, o material proporciona baixa transferência térmica, é menos suscetível à combustão e não se fragmenta em pedaços para serem usados como armas, o que ocorria com a armação de ferro nas paredes construídas no modelo convencional.
Autoridades realizaram inspeção
Uma semana depois do início da ocupação, na segunda-feira (4), autoridades inspecionaram as instalações e ouviram relatos dos apenados, que reclamaram do calor nas instalações. Representantes do Poder Judiciário que participaram da vistoria manifestaram estranhamento sobre a inexistência de tomadas.
Na mesma semana, familiares de presos realizaram protesto em frente ao Foro Central de Porto Alegre, apontando que as novas estruturas também seriam desconfortáveis para os visitantes, cenário que foi descrito por apenados durante a inspeção no local. Relatos foram formalmente apresentados por familiares ao Judiciário.
Dois dias depois, na quarta-feira (6), uma comitiva de autoridades lideradas pelo governador do Estado, Eduardo Leite, visitou as antigas instalações do Presídio Central e as obras do novo presídio que está em construção na mesma área e que possui o mesmo modelo de edificação e gestão da PEC II.
— Quando a gente estabelece uma obrigatoriedade de uso de uniforme, quando a gente tira a possibilidade de carregamento de celulares, isso gera reações, tentam forçar a barra para que o Estado novamente relaxe e de alguma forma faça concessões que acabam significando na possibilidade de operações de grupos criminosos. Nós vamos continuar insistindo nesse caminho, o que não significa que a gente não reconheça algum ajuste — declarou Leite na ocasião.
Proibição de tomadas pode virar lei federal
A Comissão de Segurança Pública da Câmara dos Deputados aprovou projeto de lei que proíbe a instalação de tomadas ou pontos de energia elétrica em celas e áreas acessíveis de penitenciárias. A proposta determina a retirada daqueles já instalados em até 30 dias após a aprovação da lei. O objetivo é evitar que presos possam recarregar aparelhos celulares que entram ilegalmente em unidades prisionais.
Para o secretário de Sistemas Penal e Socioeducativo do Estado, Luiz Henrique Viana, a medida contribui para a diminuição de crimes cometidos de dentro dos presídios.
— Esta medida não é novidade. Há resolução do Ministério da Justiça para proibição de colocação e retirada de onde existem tomadas. O tema tem sido discutido em vários Estados através de projetos de lei. Na Câmara dos Deputados, tramita também um projeto de lei, já aprovado pela Comissão de Segurança Pública e que será apreciado na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ). O Rio Grande do Sul tem implementado diversas medidas para evitar que crimes sejam cometidos de dentro do sistema prisional. Esta é uma delas — argumenta Viana.
Como passa a vigorar
Caso seja aprovado na CCJ sem divergências sobre o texto apresentado e se não houver recurso assinado por, ao menos 52 deputados, o projeto que tramita na Câmara dos Deputados, não precisará ser apreciado em plenário. Passando pela análise do Executivo, com possibilidade de sanção ou veto, o texto entra em vigor.
Designado como Projeto de Lei 2774/23, de autoria do deputado Pedro Aihara (Patriota-MG), o texto aprovado modifica a Lei de Execução Penal (Lei 7.210, de 1984) e o Regime Diferenciado de Contratações Públicas (Lei 12.462 de 2011).