Em 26 de janeiro de 2020, o caso de uma família assassinada após uma briga de trânsito, no bairro Lami, gerou revolta em Porto Alegre. Naquele domingo, Rafael Zanetti Silva, 45 anos, Fabiana da Silveira Innocente Silva, 44, e o filho mais velho Gabriel, 20, voltavam para casa depois de um aniversário na zona sul da cidade, mas foram mortos a tiros no caminho. O filho caçula do casal, na época com oito anos, e a namorada de Gabriel assistiram a cena de dentro do veículo.
Quase quatro anos depois, o judiciário gaúcho marcou data para julgamento dos envolvidos. A sessão está prevista para o próximo dia 11 de dezembro, a partir das 9h, no plenário do 5º andar do Foro Central I, em Porto Alegre.
Os réus são Neuza Regina Bitencourt Vidaletti, que responde por um disparo de arma de fogo efetuado em direção ao chão, e o filho dela, Dionatha Bitencourt Vidaletti, acusado pelos três homicídios triplamente qualificados (por motivo fútil, perigo comum e recurso que dificultou a defesa das vítimas) e também por porte de arma.
Após o crime, Dionatha foi preso. Atualmente, está no Complexo Prisional de Canoas. A mãe nunca chegou a ser detida. Ao longo do processo, os dois alegam que agiram em legítima defesa, porque teriam sido agredidos pela família.
GZH entrou em contato com o advogado Cristiano Rosa, que atende mãe e filho, para contraponto (leia abaixo).
O julgamento será presidido pelo juiz Francisco Luís Morsch, titular da 1ª Vara do Júri do Foro Central da Capital. A previsão é que o júri dure cerca de dois dias. O trabalho será transmitido pelo canal do Tribunal de Justiça do Estado (TJRS) no YouTube.
Tiros após discussão
O caso ocorreu na tarde daquele domingo, quando o veículo em que a família trafegava, um Aircross, colidiu na Ecosport de Dionatha, que estava estacionada em frente à casa da avó dele, numa estrada do Lami. O motorista, Rafael, não parou o carro para verificar possíveis estragos, o que teria revoltado Dionatha, que saiu em perseguição ao veículo da família. Acompanhado da mãe, ele pegou seu carro e conseguiu alcançar o Aircross. Na sequência, ambos os dois motoristas pararam no acostamento e começou a discussão.
Durante a briga, Neuza teria pego uma pistola, que estava dentro do carro e efetuado um disparo contra o chão. Em seguida, o filho se apossou da arma e disparou contra as três vítimas.
A promotora Lúcia Helena Callegari, que está à frente do processo, destaca a escalada de violência que ocorreu em poucos minutos na ocasião:
— Por um motivo muito banal, uma família acabou dizimada. Esse réu, uma pessoa tão nova, jogou a própria vida no lixo, mas fez algo ainda pior com a vida das vítimas. Nós temos testemunhas oculares do fato, que são unânimes em dizer que ele não agiu em legítima defesa, como alega. Vamos buscar justiça para mortes tão estúpidas.
Lúcia Helena afirma que arrolou cinco testemunhas de acusação para o júri.
Naquele dia, o filho caçula do casal, que na época tinha oito anos, estava dentro do carro no momento dos disparos. O garoto presenciou quando os pais e o irmão foram assassinados. Chegou inclusive a tentar acudi-los, logo após serem atingidos, segundo testemunhas. Junto dele, estava a namorada de Gabriel, que também permaneceu no veículo.
As três vítimas foram enterradas juntas, dias depois, após uma corrente de orações e salva de palmas, no Cemitério Jardim da Paz, no bairro Lomba do Pinheiro, na Capital.
Réus alegam legítima defesa
Ao longo do processo, mãe e filho acusados alegaram versão diferente da indicada pela investigação policial. Afirmaram que foram agredidos pela família e que agiram em legítima defesa.
Em depoimento ainda naquele mês, Dionatha confessou ser o autor do triplo homicídio, mas alegou que estava desarmado e que a pistola usada por ele na ocasião era de uma das vítimas, afirmação que mais tarde foi derrubada pela investigação policial. Ao serem interrogados no processo, depois, mãe e filho disseram que a arma era usada para proteção contra os assaltos no comércio que mantinham.
Conforme o TJRS, mãe e filho não tinham autorização para portar a arma, comprada dias antes pelo acusado.
Contraponto
A reportagem entrou em contato com o advogado Cristiano Rosa, que atende mãe e filho, para contraponto.
Em relação a Dionatha Bitencourt Vidaletti, a defesa afirma que o "cliente agiu em legítima defesa para proteger a mãe" e que há "elementos probatórios suficientes para persuadir o Conselho de Sentença" sobre isso.
"Dionatha, um jovem trabalhador, sem histórico criminal pregresso, agiu movido por um instinto de proteção à sua família. O peso do desfecho dos acontecimentos naquele fatídico dia o aflige profundamente", diz a nota. A defesa declara, ainda, que "confia plenamente na preparação do Conselho de Sentença e sua capacidade de avaliar as provas com a necessária imparcialidade". "Ao final, acreditamos que o Conselho reconhecerá que Dionatha agiu em legítima defesa, em conformidade com os princípios da justiça", finaliza.
Quanto a Neuza Regina Bitencourt Vidaletti, o advogado afirma que "cabe esclarecer que, por decisão da sentença de impronúncia, (Neuza) não responde ao triplo homicídio".