Eduarda Herrera de Mello, uma garota de sorriso largo, deveria completar 15 anos no próximo mês de janeiro. Kendra Camboim Herrera, 36, queria estar planejando a festa da filha. Esse sonho só ficou no imaginário da mãe, dos tantos momentos que poderia ter vivido.
Aos nove anos, a menina brincava na frente de casa quando desapareceu, no bairro Rubem Berta, zona norte de Porto Alegre. No dia seguinte, a criança foi encontrada morta no Rio Gravataí, em Alvorada, na Região Metropolitana. Cinco anos depois, a família segue sem respostas sobre quem tirou a vida de Duda.
O drama de Kendra começou na noite de 21 de outubro de 2018. Duda brincava de patins com o irmão e uma vizinha, ambos então com seis anos, em frente de casa, na Rua Inácio Kohler. A rampa de acesso à garagem da residência era o lugar predileto da menina para fazer as acrobacias. A mãe entrou na casa por alguns minutos para orientar um eletricista, que havia sido acionado em razão de falhas na energia da residência. Minutos depois, Kendra retornou para a rua e não avistou mais a filha.
— Cadê a Eduarda? — perguntou aos vizinhos.
Ninguém sabia a resposta. A mãe se desesperou e foi até um bar onde Duda costumava comprar guloseimas, ali perto. No retorno, outra criança, vizinha e amiga de Eduarda, relatou ter visto a menina conversando com o motorista de um veículo vermelho.
— Ele perguntou se a gente queria ir comprar casaco. Eu falei que não podia porque a minha mãe ia brigar comigo. A Duda ficou ali— narrou a garota.
A polícia foi acionada, enquanto familiares e vizinhos faziam buscas pela criança. A procura se estendeu madrugada a dentro. Ao amanhecer, a mãe foi informada de que uma menina havia sido encontrada sem vida às margens da RS-118, em Alvorada. Quando se aproximou do local isolado, Kendra foi contida. Assim que conseguiu cruzar a barreira, confirmou o que mais temia.
Após a morte de Duda, a família organizou protestos pedindo uma solução para o crime. Quando andava na rua, Kendra se indagava sobre o autor do homicídio, imaginando que ele poderia estar em qualquer lugar. Depois de cinco anos aguardando por respostas, a mãe teve as esperanças esvaziadas.
O sentimento é de injustiça. Fizeram o que fizeram, ninguém descobriu nada.
KENDRA CAMBOIM HERRERA
mãe de Eduarda
Até hoje, nenhum suspeito foi preso pelo assassinato da criança. Agora Kendra encara uma situação que temia há muito tempo: conviver com a certeza de que a resposta nunca virá.
— O sentimento é de injustiça. Fizeram o que fizeram, ninguém descobriu nada. Ninguém dá uma resposta, nem para dizer o ano passado que o caso tinha sido encerrado. Nunca mais deram uma resposta para o caso da minha filha. Ninguém está nem aí. Nunca tivemos e nunca vamos ter (respostas). É um caso que está esquecido — desabafa a mãe.
Trauma
Após a perda de Duda, a família deixou a moradia onde vivia, a mãe abandonou o emprego em um posto de combustíveis e, por um tempo, o irmão não conseguia mais ir à escola. Os irmãos estudavam a poucos minutos de casa, na Escola Estadual de Ensino Fundamental Lídia Moschetti. Duda estava na 4ª série do Ensino Fundamental e sonhava que um dia seria médica. No colégio, era uma menina meiga que se dava bem com todos.
Ansiosa, Duda costumava perguntar pelas férias, pela praia e as viagens em família. Vaidosa, adorava passar batom e posar para fotos, que Kendra guarda como recordações. Segundo a mãe, era uma menina alegre.
A casa vivia cheia de crianças, especialmente nas comemorações. A garota estava fazendo planos para o aniversário de 10 anos que deveria ter sido comemorado em 30 de janeiro de 2019. Nessas datas, a família agora visita o Cemitério da Santa Casa, onde a menina está enterrada.
— A gente ainda procura por ela na casa. As roupas dela estão aqui. As fotos. Tudo continua igual. A dor nunca vai diminuir. A gente só aprendeu a lidar com ela, a controlar, depois de todo esse tempo — diz a mãe.
A despedida precoce afetou a família inteira. O irmão de Duda, atualmente com 11 anos, ficou traumatizado e ainda tem receio de sair de casa. A mãe traz no braço esquerdo a tatuagem do rosto da filha, feita duas semanas após sepultá-la. Kendra se tornou mãe de outra menina, atualmente com quatro anos.
— A Rafaela agora pergunta por ela, fala que a irmã mora no céu. Diz que está com saudades, sem ao menos ter conhecido a irmã — desabafa a mãe.
No fim de janeiro deste ano, quando Duda teria completado 14 anos, a mãe divulgou um texto nas redes sociais, onde descreveu o sentimento da perda.
"Meu amor, tu encheu (sic) minha vida de alegria. A minha, a do teu pai, de toda tua família. Como você seria agora, pré-adolescente, meu Deus? Queria tanto ver você assim. Quando eu te vi pela última vez, você era uma criança linda com aqueles cachinhos dourados, sorriso lindo, meiga, carinhosa. O que você estaria pensando agora? Do que você iria gostar? Como iria se vestir? Queria tanto estar vivendo tudo isso com você, meu amor? Por que você foi arrancada de nós desse jeito? Nos impedindo de sonhar novamente, de sorrir sem culpa. Não importa quantos dias, meses, anos décadas passar, você vai estar sempre no meu coração, na minha vida. Você é presente nos meus dias, mesmo não estando. Te amo com toda intensidade dessa vida e você jamais será esquecida, minha princesa", narrou a mãe.
— Nessas datas é muito mais difícil. Natal, pra mim, não existe mais. Faço por fazer, porque existem outras crianças em casa. Até hoje as pessoas me param na rua, e perguntam. Pedem para me abraçar. Depois de cinco anos ainda acontece isso. Isso nunca vai se apagar. A dor vai continuar sempre e o vazio também— lamenta.
A investigação
A Polícia Civil informou, por meio da assessoria de imprensa nesta quinta-feira (2), que neste ano e no ano passado foram realizadas algumas confrontações de material genético, por meio de exame de DNA, mas nenhuma delas obteve resultado positivo. Ainda segundo a instituição, o caso segue sem novidades.
Após a localização do corpo de Duda, a polícia passou a tentar identificar e localizar o autor do crime. Um retrato falado chegou a ser divulgado na época, mas não auxiliou na identificação de informações. A perícia realizada no corpo da criança apontou que Duda morreu por afogamento. A dinâmica do assassinato nunca foi esclarecida, assim como o autor.
A investigação sobre a morte de Eduarda foi remetida ao Judiciário em 3 de maio do ano passado, sem indiciamento, segundo a Polícia Civil. Ou seja, ninguém foi apontado como autor do crime. Depois disso, o documento passou por análise do Ministério Público e do Judiciário. Em 14 de fevereiro deste ano, o inquérito foi arquivado na 2ª Vara do Júri de Porto Alegre.
Em maio deste ano, a 2ª Delegacia de Proteção à Criança e ao Adolescente (DPCA) da Divisão Especial da Criança e do Adolescente (Deca) informou que o inquérito poderá ser reaberto, caso seja encontrada nova prova. Os documentos reunidos neste período, com perícias, depoimentos e relatórios, somam cerca de 1,5 mil páginas.
Dicas de como agir em desaparecimentos de crianças e adolescentes
- Procure a delegacia mais próxima e registre o caso imediatamente
- Leve fotos atualizadas da pessoa desaparecida na hora de registrar a ocorrência
- Avise amigos e familiares sobre o sumiço
- Percorra locais de preferência da criança/adolescente
- Saiba informar quem são os amigos da criança/adolescente e com quem pode estar
- Esteja atento às roupas que a criança ou o adolescente está usando e, em caso de sumiço, descreva para a polícia
- Mantenha alguém à espera no local de onde ela sumiu. É comum que ela retorne para o mesmo ponto
- Ensine as crianças, desde pequenas, a saber dizer seu nome e os nomes dos pais
- Quando a criança ou adolescente for localizada, informe à polícia
Fonte: Polícia Civil-RS