Querida Eduarda:
Eu não te conheci, nunca vou te conhecer. Mas não consigo parar de pensar em ti.
Tu tinhas nove anos, a idade que minha filha mais velha vai fazer agora em novembro. Eu olho para a foto que foi divulgada, teu sorrisão iluminando tudo, e sinto uma dor tremenda. Dor e raiva, preciso admitir.
Quero crer em um um céu para onde vão meninas e meninos como tu. Tamanho sofrimento precisa abrir as portas de um paraíso.
TICIANO OSÓRIO
Editor de Zero Hora
Ponho-me no lugar dos teus pais, da tua família, dos teus amigos: para onde ir sem teus olhos a guiar o caminho? Que graça tem a vida sem a risada de um filho? Nessas horas, eu fico envergonhado de, por vezes, reclamar da bagunça barulhenta que nossas crianças fazem em casa — uma coisa é um dia de paz, outra é uma eternidade de ausência.
Vou ser franco contigo, Eduarda: infelizmente, já ouvi histórias parecidas com a tua. É a terrível realização do maior pesadelo de um pai ou de uma mãe. E também é o maior pesadelo de um filho: não ter a quem pedir ajuda diante de um monstro.
Monstro.
Só consigo definir assim quem faz mal a uma criança. Mas "monstro" é muito pouco, ainda mais que é uma palavra com as quais os pequenos convivem, de um jeito leve, por meio dos livros, dos filmes, dos desenhos, do território seguro da ficção. Essas pessoas são o que de pior produzimos na vida real: atacam inocentes indefesos, abusam e infligem dor, não dão ouvidos ao choro infantil. São repulsivos, abjetos. Inomináveis.
Tragédias como a tua, Eduarda, constituem um raro momento em que me flagro pensando em Deus. Quero crer em um céu para onde vão meninas e meninos como tu, quero acreditar que toda criança vítima de violência seja transformada em um anjo, ou pelo menos em uma estrelinha. Tamanho sofrimento precisa abrir as portas de um paraíso, repleto daquilo que deveria cercar todas as crianças: amor, proteção, alegria, escorregador, algodão doce, unicórnios, rodinhas de amigos, colo de mãe e garupa do pai.
Dorme bem, Eduarda. Estamos todos pensando em ti.