Um grupo do noroeste gaúcho é investigado por criar um esquema que prometia lucros elevados com investimentos em uma plataforma online. Conforme a polícia, os integrantes se passavam por corretores ou consultores financeiros, com uso de linguagem técnica sobre o assunto, e conseguiram reunir pessoas do Rio Grande do Sul, de Santa Catarina e de São Paulo para participar de um grande grupo virtual de investidores. Contudo, de acordo com a apuração, tudo não passava de um golpe.
Segundo a Polícia Civil, os participantes estavam na verdade depositando dinheiro em contas de estelionatários, muitas deles no Exterior. Elas estariam sendo induzidas por meio de campanhas, sites falsos e atrativos diversos nas redes sociais e por meio do WhatsApp.
A Polícia Civil estima que são 4 mil vítimas com prejuízo de mais de R$ 20 milhões.
O trabalho resultou na realização, nesta quarta-feira (12), da chamada Operação Trapaça, nos três Estados. O titular da Delegacia de Repressão às Ações Criminosas Organizadas (Draco) de São Luiz Gonzaga, Heleno dos Santos, comandou a ação com 150 agentes.
Foram cumpridos 11 mandados de prisão, 21 de busca, 33 de apreensão de veículos e imóveis — são 19 automóveis e 14 salas ou residências — e bloqueio de 14 contas bancárias. Até as 10h30min, oito pessoas haviam sido detidas. Uma delas estava com R$ 8 mil em casa.
De acordo com Santos, os suspeitos indicavam uma plataforma online cujo nome fazia alusão a uma empresa idônea do ramo financeiro e que não tem relação com a investigação. Após baixar o aplicativo em seus celulares, as pessoas cadastravam dados e anexavam documentos pessoais. Na sequência, as vítimas recebiam links para aderir a grupos de WhatsApp com os seguintes nomes: "Águia", "Águia Vip" e "New Invest".
O delegado diz que, desta forma, as pessoas recebiam orientações de como investir e sempre com a sugestão de que fossem aplicações mais rápidas possíveis, porque os supostos consultores financeiros tinham informações privilegiadas sobre o mercado. A promessa era de que todos teriam grandes lucros.
— Os desvios ocorriam via Pix, TED ou boletos, todos gerados a partir de uma outra plataforma, que era regular. Ocorria que eles faziam uma mescla, ou seja, uso de aplicativos legítimos com uso de aplicativo falso para tentar mascarar o golpe. Mas muitas pessoas começaram a procurar a polícia, e a investigação começou por Santo Antônio das Missões — diz Santos.
Funcionário de prefeitura é preso
Há dois meses, o titular da Delegacia de Santo Antônio das Missões, Gerson de Assis, recebeu as primeiras ocorrências e acionou o delegado Santos, da Draco. Eles passaram a investigar o caso até a realização da operação desta quarta-feira. Os policiais contam que, dos 11 investigados, dois são do município do noroeste do Estado.
Os dois foram presos. Um deles é cargo em comissão da prefeitura local. Ele e os outros detidos na ofensiva não tiveram os nomes divulgados. O Executivo municipal informou a GZH que, por enquanto, não irá se manifestar.
O delegado Santos diz ainda que uma das vítimas é a esposa do prefeito de Santo Antônio das Missões. Mais de cem moradores da cidade foram lesados, segundo a polícia.
Além de Santo Antônio das Missões, os mandados judiciais foram cumpridos em Tijucas, Porto Belo, Balneário Camboriú, São Lourenço do Oeste e Itapema, em Santa Catarina, e a capital de São Paulo.
Ostentação e lavagem de dinheiro
Conforme a investigação, os suspeitos criaram três empresas de fachada para desviar dinheiro obtido das vítimas. Dos mais de R$ 20 milhões que teriam sido obtido de forma ilícita, R$ 2 milhões já haviam sido convertidos na lavagem de capitais: compra de bens e depósitos em contas bancárias, a maioria fora do país.
Sem formação na área financeira, os suspeitos também utilizavam linguagem técnica que é normalmente utilizada por corretores de investimentos e consultores financeiros. O delegado Santos diz que a ideia era gravar vídeos nas redes ou grupos de WhatsApp como se fossem entendidos do assunto. Outro objetivo era aparecer em imagens como pessoas bem-sucedidas, em imóveis de alto padrão ou dirigindo carros de luxo.
— Esses vídeos também eram usados para táticas persuasivas, com promessas de lucros garantidos, oportunidades exclusivas e supostas informações privilegiadas de negócios rentáveis — ressalta o delegado.
Os investigados ainda criaram uma pessoa fictícia, chamada Kelly. Eles se referiam a ela nos grupos de WhatsApp como sendo a chefe da empresa. Em mensagens de vídeos e áudios postados, os suspeitos agradeciam à personagem Kelly pelos altos retornos obtidos e bens adquiridos. Boa parte destas mensagens era de imagens em salas luxuosas — algumas foram até alugadas para as gravações, como se os supostos investidores estivessem em reuniões.
A polícia continua com a investigação e pede que as pessoas lesadas registrem ocorrência, já que boa parte não está procurando as autoridades. Até o momento, só 50 registros foram feitos. O delegado Santos diz que um dos objetivos com a investigação é tentar o ressarcimento das vítimas. As ocorrências podem ser feitas de forma online no site da Polícia Civil.