No dia 14 de março deste ano, criminosos armados dentro de um veículo abordaram um motorista na Avenida Pernambuco, na zona norte de Porto Alegre, e roubaram seu Honda Civic. Horas depois, policiais civis descobriram a localização do carro, que estava em uma área rural de Sapucaia do Sul, na Região Metropolitana. Duas pessoas foram presas.
O que chamou a atenção dos agentes é que, um deles estava com um boné que continha, entre outras palavras, a seguinte expressão: "piscou, perdeu". Frase que até é usada por algumas revendas no sentido dos clientes não perderem ofertas, mas que foi adaptada pelos investigados no assalto.
Tanto é que, quando os agentes falaram com a vítima, ela confirmou que os assaltantes proferiram a mesma frase. O fato deu origem a uma investigação que culminou na operação desta sexta-feira (23), em Porto Alegre, Sapucaia do Sul e São Leopoldo.
Cerca de 50 policiais cumpriram oito mandados de busca e nove de prisão preventiva. Até as 7h, oito suspeitos haviam sido detidos. De acordo com a Delegacia de Roubo de Veículos do Departamento Estadual de Investigações Criminais (Deic), o grupo age em vários locais, mas tem preferência pela zona norte da Capital, local que, no primeiro trimestre deste ano, concentrou 70% dos roubos de veículos na cidade.
Os delegados Newton Martins Filho e João Vitor Herédia, que comandam a chamada "Operação Piscou, Perdeu", investigam dezenas de roubos praticados pela quadrilha, mas, por enquanto, confirmaram seis casos — todos na Zona Norte — atribuídos a estes assaltantes. Os delegados também verificaram que cada um tem uma função no esquema e que, muitos deles também atuam no tráfico de drogas e no roubo de cargas na Região Metropolitana. Os criminosos fazem parte de uma facção que tem base no Vale do Sinos.
Os nomes dos presos não foram divulgados. O Deic informa que a investigação prossegue no intuito de descobrir mais vítimas. Sobre os integrantes da quadrilha, os delegados destacam que são apenas os nove envolvidos. Todos serão responsabilizados criminalmente no final do inquérito, previsto para ser concluído nos próximos dias. Motoristas assaltados podem procurar o Deic pelo telefone 0800 510 2828 .
Boné apreendido
Martins Filho e Herédia dizem que o boné apreendido foi o pontapé inicial para ligar todos os fatos. Depois da prisão do suspeito, que usava tornozeleira eletrônica, e a cobertura com os dizeres: "piscou, perdeu", a polícia passou a descobrir mais assaltos. E todas as vítimas disseram que, depois de terem seus automóveis levados pelos criminosos, ouviam a mesma frase. Segundo a polícia, esta expressão até é usada por revendas de veículos no que diz respeito a não perder tempo em ofertas, mas acabou sendo utilizada pela quadrilha nos crimes.
Tanto motoristas, quanto policiais, julgam que esta forma de agir é considerada uma afronta às pessoas, bem como um deboche. Mas foi este fato que oportunizou a identificação dos demais suspeitos e a descoberta dos roubos realizados por eles. Conforme inquérito do Deic, a maioria dos criminosos é de Sapucaia do Sul, mas há também de Porto Alegre e São Leopoldo, que são os locais onde estão sendo cumpridos mandados de prisão e busca.
O diretor da Divisão de Investigação Criminal do Departamento, delegado Eibert Neto, dá mais detalhes de como o boné apreendido resultou na operação realizada.
Como a quadrilha agia
Os delegados Martins Filho e Herédia explicam que os ladrões, sempre usando um veículo, acompanhavam os carros escolhidos por vias da zona norte da Capital. No momento oportuno, bloqueavam a frente do automóvel e, pelo menos dois homens armados, desciam do carro usado como suporte e abordavam as vítimas.
Além de ameaças e de apontar as armas para o motorista, geralmente escolhiam carros com uma pessoa. Numa ação rápida, mandavam a vítima descer do automóvel e antes de saírem do local, diziam: "piscou, perdeu".
Em relação a função de cada um dos suspeitos investigados, os delegados afirmam que cinco deles eram os assaltantes diretos nos roubos. Um deles, inclusive, era considerado o chefe do grupo, mas sempre tinha que se reportar ao líder da facção na hora de repassar valores roubados.
Este mesmo homem também era responsável por organizar o tráfico de drogas. Um sexto e sétimo suspeito, além de ajudar na clonagem dos veículos, também traficavam drogas. Um oitavo integrante da quadrilha tinha a função de repassar os veículos roubados para outros compradores. Ação também realizada pelo último integrante identificado.
Tráfico e roubo de cargas
De acordo com o inquérito da Delegacia de Roubo de Veículos, o dinheiro obtido com os carros revendidos era usado para capitalizar tráfico de drogas e de armas da facção que tem base no Vale do Sinos. A maioria era vendida para outras quadrilhas, mas alguns carros roubados, também adulterados, eram repassados para terceiros. Todos com preços bem abaixo do valor de mercado.
Em relação aos roubos de carga, o Deic acredita que os criminosos se passavam por policiais civis para simular barreiras e atacar caminhoneiros. Durante a investigação, um dos suspeitos presos teve, além de arma e munição apreendidas, um bloqueador de sinal GPS e um boné da Polícia Civil localizados com ele.
Os roubos de carga, assim como os de veículos, também ocorriam em Esteio, Alvorada, Estância Velha e Sapucaia do Sul, cidade de origem da maioria dos investigados.