Mais duas pessoas procuraram a polícia para relatar que foram vítimas do dentista Jeferson Scaranto, 53 anos, por suposta violência sexual durante consultas em Viamão, na Região Metropolitana. Assim, o número de mulheres que procuraram a polícia chega a seis. O suspeito está detido no Núcleo de Gestão Estratégica do Sistema Prisional (Nugesp), na zona leste de Porto Alegre.
O dentista foi preso, de forma preventiva, no último sábado (8), após Scaranto desembarcar ao lado da esposa no aeroporto Salgado Filho, vindo de viagem de São Paulo. Antes disso, ele já havia sido detido e, depois, liberado.
— Ele (suspeito) não se manifestou na ocasião das prisões. Depois que ele foi preso no dia 20 de março, apareceram mais duas vítimas — revela a delegada Marina Dillenburg, da Delegacia Especializada de Atendimento à Mulher (Deam).
Os crimes mais recentes teriam sido cometidos no consultório em que ele trabalha em Viamão, enquanto os mais antigos teriam ocorrido em Porto Alegre, onde o profissional também atendia.
— Acredito que tenha mais vítimas deste profissional, porque ele atua há muito tempo. Muito provavelmente, outras mulheres passaram por situações similares — afirma a delegada, dizendo que o suspeito optou por não se manifestar quando foi interrogado.
A delegada pretende tentar interrogá-lo novamente:
— Temos alguns ofícios e diligências para o Conselho Regional de Odontologia, em que questionamos qual é a orientação que o profissional tem na hora das consultas para evidenciar que o comportamento dele era bem inadequado.
O primeiro relato contra o dentista foi registrado em 1995, pelo mesmo crime, de acordo com a Polícia Civil. O suspeito chegou a ser preso em março deste ano, após uma paciente gravar o crime sexual, com auxílio do celular, durante uma das consultas. Na ocasião, ele foi solto pela Justiça para responder ao crime em liberdade.
A Polícia Civil está divulgando o número de dois telefones para outras vítimas se manifestarem (confira abaixo). Além disso, mulheres que teriam sofrido assédio do dentista no passado estão sendo procuradas pela Delegacia Especializada de Atendimento à Mulher, para prestarem depoimento como testemunhas.
Vítimas relatam como dentista agia nas consultas
A reportagem de GZH entrevistou, na terça-feira (11), duas mulheres que afirmam ser vítimas do dentista. Uma delas, que procurou a polícia há mais de 20 anos, agora será testemunha.
A mulher, que pediu para não ser identificada, tem atualmente 47 anos e trabalha como contadora. Na época em que teria sofrido a violência sexual, ela esteve em quatro oportunidades no consultório do dentista, no bairro Azenha.
Na quarta vez, ele foi me deitando na cadeira aos poucos. Aí ele colocou a mão dentro da minha blusa e veio para cima de mim para me beijar.
RELATO DE VÍTIMA
Segundo a contadora, que chegou ao dentista na época por indicação de um amigo de seu marido, na primeira consulta não aconteceu nada fora do comum.
— A partir da segunda vez, já comecei a notar algumas coisas estranhas, tipo fazer um carinho no rosto de uma forma diferente. Só que ele continuava a conversar como se nada estivesse acontecendo — compartilha.
Na terceira consulta, a contadora teria sido acariciada na perna, mas o pior, segundo seu relato, aconteceria na oportunidade seguinte:
— Na quarta vez, ele foi me deitando na cadeira aos poucos. Aí ele colocou a mão dentro da minha blusa e veio para cima de mim para me beijar — detalha, salientando que o dentista não possuía secretária no local.
Sem ajuda e com dificuldades para destrancar a porta, ela conta que precisou fugir correndo da sala.
— Fui na polícia no mesmo dia. Meu marido (hoje, ex-marido) na época foi comigo. Teve audiência com ele (dentista). O irmão dele é advogado. Fiquei sentada frente a frente com ele. E eles (suspeito e advogado dele) riram da minha cara. Lembro que ele acabou voltando e pegou uma pena irrisória — lamenta.
Senti uma coisa esquisita subindo pelas minhas pernas. Quando abri os olhos, vi a mão dele subindo. Lembro que saí correndo e chorando para contar ao meu pai
RELATO DE VÍTIMA
A outra vítima tem 46 anos — ela também pediu para não ser identificada — e trabalha como professora. O crime teria ocorrido em 1995 em um consultório que ficava localizado nas imediações do antigo prédio da prefeitura, no Centro Histórico.
— Eu tinha 18 anos de idade na época. É uma coisa que mexe ainda bastante comigo — relembra.
Segundo a docente relata, ela foi atendida pelo dentista na Capital por meio de um convênio com o local onde o pai dela trabalhava.
— Era minha primeira consulta com ele. Estava sentindo um desconforto enquanto ele mexia nos meus dentes e fechei os olhos. Senti uma coisa esquisita subindo pelas minhas pernas. Quando abri os olhos, vi a mão dele subindo. Lembro que saí correndo e chorando para contar ao meu pai.
A família fez um boletim de ocorrência.
— Passaram-se alguns anos e uma moça apareceu na minha casa dizendo que tinha acontecido a mesma com ela e que iria processar o dentista. Ela queria saber se eu poderia testemunhar. Depois não voltou a me procurar — divide.
A professora conta que o trauma ainda é grande:
— Por mais que tu aches que isso está bem resolvido na tua cabeça, no momento em que tu olhas, volta toda aquela sensação horrível. É muito complicado, é como se estivesse tudo enterrado e tu tens de desenterrar isso.
A educadora diz que nem o tempo consegue apagar o desconforto e afirma que jamais imaginaria ser violentada ao ir a uma simples consulta ao dentista.
— Foi há quase 30 anos e ele continua fazendo isso — conclui.
Contraponto
O que diz a defesa do dentista
A advogada Márcia Silva, responsável pela defesa do dentista, alega que o seu cliente é “com certeza inocente.”
— Não tivemos ainda acesso aos autos, que correm em segredo de Justiça. Estamos pleiteando a liberação para nossa habilitação, para tomarmos ciência de todos os pormenores neste processo. Sabemos que isso será facilmente esclarecido desde que tenhamos acesso aos autos — garante.
A advogada reclama do tratamento dispensado por parte da imprensa em relação ao caso.
— Só quero fazer um pormenor: ainda está sendo veiculado na mídia que ele (suspeito) estava foragido. Na realidade, ele estava retornando de São Paulo do enterro do sogro dele. Então quero deixar bem claro que ele não estava foragido. Não sabemos nem o conteúdo do motivo dessa prisão.
O que diz o Conselho Regional de Odontologia
O Conselho Regional de Odontologia do RS se posicionou, nesta quarta-feira (12), sobre o tema. O conselheiro secretário Everson Martins enviou à GZH a posição do CRO-RS. Confira abaixo:
"O Conselho Regional de Odontologia do RS tomou conhecimento, na manhã de segunda-feira (10), da prisão preventiva do cirurgião-dentista acusado de violação sexual, mediante fraude, no Aeroporto Salgado Filho em Porto Alegre. Em março, a autarquia já havia recebido a informação, via imprensa, de denúncia de importunação sexual que levou à prisão do profissional no município de Viamão, na Região Metropolitana. Imediatamente, solicitou cópia do inquérito, o que foi enviado pela Delegacia da Mulher de Viamão. Ato contínuo, e quando essa documentação estava sendo avaliada pelo Conselho, em 31 de março, novamente o Conselho tomou conhecimento, extraoficialmente, por intermédio de uma notícia televisiva, que mais vítimas teriam se apresentado à delegacia denunciando terem sido assediadas pelo profissional. Dessa forma, o Conselho imediatamente entrou em contato com a Delegacia da Mulher de Viamão, solicitando o envio do restante do inquérito e da identificação das novas vítimas para fins de embasar a abertura do processo ético-disciplinar contra o cirurgião-dentista. No dia 10, na parte da tarde, conseguimos obter tais informações, a partir do apoio de um fiscal do Conselho que compareceu à Delegacia da Mulher. Dessa forma, já estão sendo adotados todos os procedimentos para a abertura do processo ético-disciplinar, o que ocorrerá com a maior seriedade possível, respeitando sempre o auto direito de defesa e o contraditório do profissional. E onde poderão ser aplicadas as penalidades cabíveis por este Conselho. De antemão, deixamos claro que o Conselho de Odontologia repudia toda e qualquer violação aos direitos da mulher e já se colocou à disposição da Justiça para auxiliar no que for preciso para o devido transcurso deste processo penal."
Telefones para denúncias
A Polícia Civil está divulgando dois telefones para que vítimas relatem casos envolvendo o dentista. Os números são os seguintes: (51) 98416-6066 ou (51) 98594-6617.