As prefeituras de Osório, no Litoral Norte, Santa Cruz do Sul, no Vale do Rio Pardo, e Viamão, na Região Metropolitana, aguardam pelo término das obras de construção de três centros de Atendimento Socioeducativos (Cases) que custaram mais de R$ 56,6 milhões até agora. O investimento total é estimado em R$ 65 milhões.
A responsabilidade é do governo do Estado, sendo que os municípios apenas cedem os terrenos. Os três centros, juntos, representariam 210 vagas a mais para adolescentes infratores.
O ritmo é lento, e duas construções — em Santa Cruz do Sul e em Viamão — estão inclusive paralisadas desde dezembro de 2021. Nesse tempo, houve rescisões de contrato com as empresas contratadas para realização das obras e foram lançados novos editais de comparação de preço em abril de 2022. Porém, o certame foi deserto (sem interessados).
Neste momento, uma empresa de consultoria elabora o material técnico e propõe soluções de engenharia para os dois Cases paralisados. A previsão é de que este levantamento esteja pronto em julho de 2023 e vá, em seguida, para a etapa de licitação (veja abaixo o que diz o governo do Estado).
As três obras integravam o Programa de Oportunidades e Direitos (POD) da Secretaria de Justiça e Sistemas Penal e Socioeducativo (SJSPS). Atualmente, apenas o empreendimento de Osório conta ainda com esses recursos, obtidos por meio do Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID). Os demais necessitam de receitas do Tesouro do Estado.
O POD, que agora é executado pela Secretaria de Justiça, Cidadania e Direitos Humanos, atende à população de 15 a 24 anos que vive em territórios de vulnerabilidade social onde se verificam elevados índices de violência.
O programa teve início em 2014, quando foi assinado contrato de empréstimo com o BID. Em 2015, teve início sua implementação e, em 2016, começaram os atendimentos nos Centros da Juventude. Depois do término do recurso do BID, no ano passado, o programa passou a ser financiado pelo Tesouro do Estado.
Quando estiverem concluídos, os três Cases oferecerão escola, oficinas, quadra esportiva, palco multiuso e consultórios para atendimentos na área da saúde. Os imóveis terão, ainda, telhado verde e sistema de reaproveitamento de água da chuva.
O objetivo da construção desses Cases é regionalizar o atendimento socioeducativo, buscando a qualificação dos serviços prestados ao adolescente infrator privado de liberdade.
A vice-diretora da Faculdade de Direito da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), Ana Paula Motta Costa, acompanhou de perto os projetos para criação dos Cases no Estado. Ex-presidente da Fundação de Atendimento Socioeducativo do RS (Fase), de 2000 até 2002, a professora explica a relevância desses locais.
— A Constituição Federal, especificamente, prevê o direito fundamental à convivência familiar e comunitária. É muito importante, no processo dos adolescentes que vão cumprir medidas socioeducativas de internação, a relação com a família e a comunidade — diz a docente.
Para Ana Paula, ficar longe da família e da própria comunidade se torna, de fato, um grande empecilho para o infrator se reintegrar à sociedade.
— Quando o adolescente vem da região de Santa Cruz do Sul ou do Litoral cumprir medida aqui em Porto Alegre, isso significa que ele está muito distante da família. Todo trabalho para ser feito de retorno dele à comunidade, de relação com a rede de atendimento e de fortalecimento com os vínculos da família, fica muito mais difícil — analisa.
A vice-diretora também vê problemas no envio de adolescentes de outras regiões para a Capital.
— Esses jovens dessas regiões, que cumprem medidas aqui, ficam no Case Padre Cacique, que possui uma estrutura física muito antiga. Todo o trabalho, desde os anos 2000, era para desativar aqueles prédios, porque eles não possuem uma estrutura arquitetônica adequada para um trabalho socioeducativo mínimo — afirma, concluindo: — Os prédios do Case Padre Cacique são muito ruins em tudo: em segurança, em espaços para lazer, escola, quadra esportiva e profissionalização.
Osório
Em Osório, a assinatura autorizando o começo das obras foi realizada em 12 de janeiro de 2021, sendo que os trabalhos propriamente ditos começaram em 16 de agosto do mesmo ano. O Case do município está sendo construído na RS-030, no loteamento Serramar, em terreno de quase 31,8 mil metros quadrados e área construída de 4,6 mil metros quadrados.
A previsão inicial para execução da obra era de 12 meses. Os trabalhos estão 67,19% executados (confira no infográfico acima). Inicialmente, o valor do contrato desta obra no município era superior a R$ 27 milhões. Entretanto, após os aditivos, o valor subiu para mais de R$ 32 milhões. A previsão do governo estadual é de que a construção, em pleno andamento, seja finalizada até dezembro de 2023.
Viamão
O Case de Viamão fica localizado na Avenida Senador Salgado Filho, no bairro Cecília. A obra (61% executada) começou em 12 de dezembro de 2019. Porém, assim como a construção do Case de Santa Cruz do Sul, está paralisada desde dezembro de 2021.
A unidade terá 4.810,52 metros quadrados de área construída em um terreno de mais de 23,8 mil metros quadrados. Quando a nova unidade da Fundação de Atendimento Socioeducativo do Rio Grande do Sul (Fase), vinculada à Secretaria de Justiça e Sistemas Penal e Socioeducativo (SSPS), estiver concluída, atenderá até 90 adolescentes vindos da Região Metropolitana.
O investimento, até o momento, chega a mais de R$ 13 milhões. A conclusão da obra está prevista após 15 meses da ordem de início dos serviços.
Santa Cruz do Sul
Em Santa Cruz do Sul, as obras também estão paralisadas há 16 meses na Rua Corredor Zanette, no bairro Esmeralda. O governador Eduardo Leite chegou a participar do lançamento da pedra fundamental, em 9 de março de 2020, e também esteve em visita ao canteiro de obras em julho do ano seguinte.
Construído em terreno de 40 mil metros quadrados, serão 4,5 mil metros quadrados de área construída. O Case do município, com 55,4% de execução concluída, tem previsão de abrigar até 60 adolescentes. Foram investidos mais de R$ 11 milhões.
O Case de Santa Cruz do Sul servirá como ponto de referência para 58 municípios da região que integram as comarcas de Arroio do Meio, Arroio do Tigre, Candelária, Encantado, Encruzilhada do Sul, Estrela, Lajeado, Rio Pardo, Salto do Jacuí, Sobradinho, Taquari, Teutônia, Venâncio Aires, Vera Cruz e Salto do Jacuí.
Como Viamão, a conclusão da obra em Santa Cruz do Sul está prevista após 15 meses da ordem de início dos serviços.
O último centro da Fundação de Atendimento Socioeducativo (Fase) foi aberto em 2004, em Novo Hamburgo.
O que diz o governo estadual
Questionado sobre a demora para a conclusão dos Cases nesses municípios, e os motivos para que isso esteja acontecendo, o governo do Estado, por meio da Secretaria de Sistemas Penal e Socioeducativo (SSPS), respondeu, por nota:
"A construção dos Cases é fruto de um projeto de grande complexidade construtiva, envolvendo diversas áreas de atuação da engenharia. Vale ressaltar que a pandemia da Covid-19 afetou significativamente o andamento das obras, além de colaborar para o desequilíbrio financeiro dos investimentos.
As obras dos Cases de Viamão e Santa Cruz do Sul, paralisadas em dezembro de 2021, tiveram a rescisão contratual finalizada em outubro de 2022. Na tentativa de retomada, foram lançados editais de comparação de preço em abril de 2022. Contudo, o certame foi deserto. Foi, então, contratada empresa de consultoria para atualizar o material técnico e propor soluções de engenharia, visto que há a necessidade de serviços a serem acrescentados para viabilizar a conclusão da obra.
O material está em fase de elaboração. A previsão de entrega, com todos os ajustes de projeto e conferência da equipe técnica do Departamento de Engenharia da Secretaria de Sistemas Penal e Socioeducativo, é em julho de 2023. Após, inicia-se o processo licitatório."
O que dizem as prefeituras
Osório
"O Centro de Atendimento Socioeducativo (Case) de Osório atenderá cerca de 60 adolescentes, com um espaço qualificado com local para escola, oficinas, quadras de esportes, palco multiuso, salas para atendimentos da área da saúde, entre outros. A administração entende que a nova estrutura trará uma relevância social para o município. O Case em Osório é uma demanda levantada pelo Judiciário há muito anos e que agora aguarda a conclusão das obras para o início do serviço."
Santa Cruz do Sul
"A Prefeitura de Santa Cruz do Sul cedeu o uso da área para construção do Case, conforme a Lei nº 7687/2016, analisou e aprovou as licenças para as obras. Demais encaminhamentos devem ser questionados ao Governo do Estado."
Viamão
"A Prefeitura de Viamão informa que considera a obra de extrema importância para a região, com o município colaborando desde o início para que o Estado tivesse todas as condições para executar.
Investimos pesado no Complexo de Cuidado com as Pessoas Ana Jobim, no mesmo terreno do Case. O nosso complexo hoje conta com o Centro da Juventude, Secretaria de Assistência Social, Centro Integrado de Segurança, UPA, Corpo de Bombeiros, Brigada Militar, Sine, Cufa, Conselhos Municipais e, em breve, com o Restaurante Popular. O Case vem para se incorporar neste grande centro de serviços.
Lamentamos que a obra esteja parada e aguardamos a resolução dos entraves para a conclusão da obra."