Segunda testemunha a depor no novo julgamento de Leandro Boldrini pela morte do filho Bernardo, a delegada regional Cristiane de Moura e Silva Braucks, que participou da investigação na época do crime, falou por quatro horas e 30 minutos no plenário do Júri do Fórum de Três Passos, nesta terça-feira (21).
Ela elencou as razões que levaram ao indiciamento do médico — do tratamento dispensado ao menino, que andava com roupas inadequadas e pedia comida na casa das pessoas, por exemplo, à cumplicidade com a a mulher, Graciele Ugulini (condenada no primeiro julgamento como executora da morte de Bernardo), até o desprezo e falta de interesse pala criança.
— Primeiro, não tinha amor pelo filho, pelo contexto, que ele tinha uma relação muito forte de cumplicidade com a Graciele, que ela tinha dito: "Ou eu, ou ele", então, sim, o doutor Boldrini, diante de todos esses elemntos, tinha interesse também na morte do menino — declarou Cristiane.
O depoimento da policial começou por volta das 8h40min, mas precisou ser interrompido cerca de 10 minutos depois, após gritos de Leandro Boldrini serem ouvidos do lado de fora. O réu passou mal e não entrou no plenário, mas permaneceu dentro do fórum até as 12h, quando foi levado de volta para o presídio.
No início do depoimento, a delegada explicou como a investigação levou ao paradeiro de Bernardo. Ela contou que três hipóteses foram levantadas inicialmente: sequestro, fuga por conta própria e homicídio, sendo que a última ganhou força a partir dos primeiros depoimentos colhidos. Também disse que os relatos mostravam o "desprezo" da família pelo menino:
— O núcleo familiar era o Leandro, a Graciele (Ugulini, madrasta) e a filha. Não havia espaço para o Bernardo.
Um dos testemunhos recordados pela delegada foi de uma amiga de Graciele, Sandra Cavalheiro, que dias após a localização do corpo procurou a Polícia Civil para declarar que já havia ouvido sobre a intenção de matar o garoto.
O advogado de Boldrini Ezequiel Vetoretti então perguntou à delegada se não foi questionado o porquê de Sandra não ter avisado a polícia antes do crime.
— Ela não acreditou. Não quis crer que ia terminar do jeito que terminou — respondeu a delegada.
Cristiane também reforçou a tese de um possível conluio entre réus e advogados para isentar Leandro Boldrini das acusações, para financiar a defesa deles, já que o médico era o único com renda expressiva. O material foi obtido com escutas telefônicas.
Questionada pelo promotor Miguel Podanosche se havia informação de que o médico pagaria a defesa dos demais réus, a delegada confirmou.
— Sim, ele iria bancá-las financeiramente. A princípio, a Edelvânia (Wirganovicz, amiga de Graciele) tinha um salário pequeno, acredito. Ela trabalhava na Coordenadoria da Saúde, e a Graciele, a princípio, não teria renda, um salário específico — respondeu a delegada.
O promotor acrescentou que o suposto "conluio entre advogados" não prosseguiu por recuo de um dos defensores e por um depoimento de Graciele, o que foi confirmado pela delegada.
— Tinha informação nas escutas de que não teria dado certo porque a Graciele teria isentado também a Edelvânia, no momento em que ela disse que era um homicídio culposo, como se ela tivesse a medicação e o menino tivesse tomado o remédio — disse a policial.
Sobre as mesmas escutas, a defesa de Boldrini questionou se algum telefonema comprovava Leandro planejando o crime com os demais réus. A delegada respondeu que não, pois toda a execução foi feita pela madrasta.
— Eles arquitetaram e a Kelly (como Graciele é chamada entre os conhecidos) foi quem fez todos os atos de execução. A Graciele seria a executora. Ela que ia buscar essas pessoas (Edelvânia e o irmão Evandro). Ele não iria por a mão na massa, digamos assim — concluiu.
Segundo julgamento
Boldrini é acusado de ter sido o mentor intelectual da morte do filho Bernardo. O réu havia sido condenado, em 2019, a 33 anos e oito meses de prisão em regime fechado, mas a decisão foi anulada em 2021 — fazendo com que ele seja submetido a novo julgamento.
A situação dos demais réus
- Graciele Ugulini (madrasta) — condenada a 34 anos e sete meses de reclusão em regime inicial fechado, está presa no Presídio Feminino Madre Pelletier com previsão de progressão para o semiaberto em 2026.
- Edelvania Wirganovicz (amiga de Graciele) — condenada a 22 anos e 10 meses de reclusão em regime inicial fechado, cumpre pena no regime semiaberto no Instituto Penal Feminino de Porto Alegre.
- Evandro Wirganovicz (irmão de Edelvania) — condenado a nove anos e seis meses em regime semiaberto e atualmente em liberdade condicional.