Uma empresa de Porto Alegre que se diz especialista na análise de apostas esportivas é alvo de reclamações por parte de clientes que alegam não receber valores superiores a R$ 1,2 milhão desde janeiro. Segundo o próprio CEO da empresa, cerca de 250 clientes aderiram ao plano de investimento e deixaram de receber rendimentos no começo deste ano.
Conforme contratos apresentados por clientes a GZH (veja abaixo), a "Info na Bola Treinamento e Assessoria em Jogos Eletrônicos" prometia aos investidores um retorno fixo de 15% a 17% ao mês, enquanto o valor praticado normalmente em renda fixa (como o CDI) gira entorno de 1% ao mês.
No CNPJ da empresa constam dois sócios: Caique Gründler e Diego Sausen. O primeiro, que se apresenta como CEO e que realiza as análises esportivas, se manifestou duas vezes nas redes sociais.
Em 17 de fevereiro, em nota, disse que estava trabalhando para devolver o dinheiro e que não fugiu, como dizem os clientes, mas que estava abrigado em local seguro. Em 15 de março, em um vídeo publicado, ele sustentou que estava sofrendo ameaças de morte, mas que seguia trabalhando para devolver os valores. Também alegou que era responsável por 60% da empresa, sendo o restante divididos entre outros dois sócios.
Um deles é Diego Sausen, que também se manifestou pelas redes e disse que apenas entrou como sócio investidor da empresa: "Acabei tendo a vida destruída, sendo vítima, um lesado como diversas outras pessoas. Tudo o que tive já foi vendido e pago como dívida" (leia as notas abaixo).
O terceiro sócio citado por Caíque terá seu nome omitido pela reportagem e no contraponto pois não aparece no quadro societário cadastrado na Receita Federal.
Prejuízos
Somente um empresário, que encaminhou notícia-crime ao Ministério Público e à Polícia Civil, narra que teria tido prejuízo de R$ 1 milhão. O homem diz ter sido apresentado a Caíque por um conhecido em comum e assinou um contrato com promessa de retorno mensal de 17%.
O primeiro depósito aconteceu em 4 de outubro de 2022, no valor de R$ 150 mil. Em novembro, o empresário não sacou o lucro e investiu mais R$ 122,5 mil, totalizando R$ 300 mil.
— Ele vai te pescando, todo mês que tu coloca um pouco, ele vai te pagando o lucro do teu próprio aporte. Quando entra um valor maior, ele deixa de pagar — afirma Gustavo Nagelstein, advogado do empresário.
Em dezembro, o empresário decidiu pegar um empréstimo de R$ 500 mil para investir ainda mais na empresa.
— Ele viu que os juros do banco eram menores do que o retorno. Nenhum investimento é nesse patamar. Então, o cliente olha uma rentabilidade desse tamanho e se impressiona. Hoje, ele deve para o banco R$ 500 mil, sem contar os juros — aponta o advogado.
Em 4 janeiro deste ano, o empresário recebeu os últimos rendimentos, no valor de R$ 153 mil, o que equivale a 17% do total investido. Em fevereiro, soube por meio de um conhecido que ninguém mais estava recebendo os rendimentos e tentou contato com Caíque.
— No primeiro momento, ele respondeu algumas vezes. Dizia que tinha insucesso de uma situação, que tinha errado, mas que ia tentar pagar todo mundo que conseguisse — concluiu Nagelstein.
Na última semana, um plano de devolução foi encaminhado via e-mail ao empresário. A proposta é de devolução mensal dos valores, a partir de maio, mas sem prazo para quitação total. O plano também afirma que os clientes não vão receber os rendimentos, mas apenas o valor inicialmente investido.
"Os valores vão ser divididos em grupos de clientes, dessa forma não será ressarcido o valor total de imediato e sim conforme os pagamentos até saldar o valor investido. A ideia é aumentar o valor trimestralmente para que a dívida seja sanada o mais rápido possível", diz o e-mail.
Investigação
A investigação sobre o caso está a cargo da Delegacia de Repressão aos Crimes Informáticos e Defraudações do Departamento de Investigações Criminais (Deic). O delegado Thiago Albeche diz que não pode adiantar informações, mas que a apuração será no sentido de verificar se houve dolo para configurar o crime de estelionato.
— Tem que restar comprovado que o intuito dessa pessoa era de obter uma vantagem indevida sobre as vítimas e que, de alguma forma, ele as manteve em erro. Existem alguns requisitos para se configurar um estelionato — afirmou o delegado.
Além do empresário que realizou um aporte maior, Nagelstein representa outra pessoa, que depositou R$ 200 mil. A reportagem ainda teve acesso a um grupo em aplicativo de mensagens com cerca de 40 membros que dizem não receber os valores. Uma delas foi a jornalista Nathália Kruttz, que depositou R$ 20 mil.
— Estou há dois meses sem receber. Anteriormente recebia direitinho, tudo certo. Quando estourou tudo, pra mim foi um choque. De me colocar de cama, com febre, porque eu fiquei muito arrasada.
O que a empresa oferecia
Em contrato, a empresa oferecia um investimento de renda fixa e com juros acima dos valores praticados no mercado. Enquanto R$ 100 mil rendem cerca de R$ 1 mil por mês em investimentos como o CDI (13,65% ao ano), a promessa prevista em contrato era devolver até R$ 15 mil, por exemplo. A tabela de rendimento variava conforme o valor investido:
- De R$ 5 mil a R$ 9,9 mil = 5% ao mês
- De R$ 10 mil a R$ 14,9 mil = 10% ao mês
- Acima de R$ 15 mil = 15% ao mês.
Os valores seriam obtidos por meio de apostas esportivas feitas conforme avaliação de especialistas. No entanto, diferente de quem aposta diretamente nas plataformas, com risco de ganhar ou perder, o contrato assinado com a empresa garantia o rendimento, sem a pessoa precisar acompanhar e analisar as partidas.
Foi a promessa de retorno alto com risco baixo que atraiu Nathália.
— Jamais mencionou sobre os riscos. Inclusive me deixou bem tranquila quanto a isso — contou a jornalista.
Especialista em investimentos em renda fixa e variável, o economista Éverton Lopes afirma que não existe renda fixa com valores acima do mercado.
— Ele promete uma remuneração como se fosse uma renda fixa. Só que renda fixa segue uma taxa de juros, que é a Selic (13,75% ao ano), conforme o Copom determina — alerta Lopes.
Contrapontos
O que diz Diego Sausen:
"Venho por este texto tentar esclarecer algumas coisas que as pessoas vêm falando sobre mim. Eu, Diego, nunca tive acesso a nenhum tipo de conta, tanto bancária, como plataformas de apostas. Nunca fui operador de nada dentro do Infonabola, fui um sócio investidor, e que acabei tendo a vida destruída sendo vítima, um lesado como diversas outras pessoas disso tudo que tá acontecendo. Já não tenho mais nada meu, tudo o que eu tive já foi vendido e pago como dívida. Minha família toda foi lesada, investiram o dinheiro da aposentadoria delas, pegaram empréstimos acreditando no negócio.
Nunca tive acesso a quantidade de investidores. Consigo provar na justiça que eu nunca tive acesso a nada, através de LOGS do App do banco, assinaturas do banco, conversas e etc. Toda minha vida eu trabalhei sendo o mais certo possível, vendendo cachorro quente em final de festa, trabalhando vendendo ingresso, sempre me virei pelo certo e nunca quis prejudicar ninguém! Eu não aguento mais sofrer ameaças! Eu também fui uma vítima e preciso que todos saibam disso!
Eu nunca deixei de responder ninguém! Peço a todos que sabem da minha índole, desde menor trabalhando pelo certo, que divulguem isso pra chegar nas pessoas que querem meu mal por fora da justiça! Eu imploro! Eu peço desculpa por tudo MAS EU NÃO SABIA! Minha família perdeu tudo! ME AJUDEM.
O que diz Caíque Gründler, em nota publicada em 17 de fevereiro:
"O Infonabola é uma empresa constituída na modalidade de sociedade limitada (LTDA). O artigo 1052 do Código Civil Brasileiro ordena que a responsabilidade de cada sócio se limita ao valor das quotas que possui na sociedade (empresa).
Os sócios têm participação tanto nos lucros quanto nas perdas, dentro do percentual de participação de cada um. Os nomes dos sócios e suas respectivas quotas/ participação na sociedade Ltda constam no contrato social da empresa.
Mas, caso exista outro sócio "de fato" que não esteja inscrito no contrato social, como sócio "de direito", a sua participação/ responsabilidade pode ser facilmente declarada em juízo, através de ação judicial de reconhecimento de sociedade de fato. Em outras palavras, se o sócio "de fato" não consta no contrato social, mas recebia lucros, se existem comprovantes bancários de pagamentos de clientes ou da própria sociedade Ltda para esse sócio "de fato", e se ele tinha acesso a contas bancárias da sociedade, por exemplo, sua participação será declarada e reconhecida judicialmente."