Apaixonado pelo trabalho, Luiz Gizéria, 61 anos, vinha se preparando para diminuir o ritmo. Ele havia recém-recebido a primeira aposentadoria e comprado, fazia pouco tempo, um pequeno sítio para descansar aos finais de semana com a família. O repouso viria depois de 25 anos de trabalho no comando da TransGizéria, empresa de transporte de carga internacional fundada pelo empresário em Itaqui, na Fronteira Oeste. Foi no estabelecimento, que um dia foi o sonho de Gizéria, que ele foi baleado e morto em um assalto no último dia 22.
Conforme a Polícia Civil, o empresário teria reagido a ação de dois criminosos na tarde daquela quarta-feira. A dupla foi presa no mesmo dia, em flagrante. A investigação segue em andamento.
Gizéria nasceu em Horizontina, e desde cedo começou a ajudar os pais, agricultores. Aos 16, se mudou para Itaqui, onde cuidava de animais em fazendas e, depois, foi trabalhar em um frigorífico. Após algum tempo, pilotava carretas e caminhões pequenos. Antes de fundar a própria empresa, trabalhou como caminhoneiro.
— Ele se apaixonou por esse ramo bem cedo. O primeiro caminhão ele comprou junto de um amigo, meio a meio. Depois, quando foi começar a empresa, comprou todo o caminhão. O trabalho sempre foi muito importante para ele. Era a forma de cuidar da gente — conta a filha caçula do empresário, Renata Gonçalves Gizéria.
Em dezembro de 1998, o empresário conseguiu fundar a TransGizéria. Segundo Renata, o pai vendeu casa e carro para "investir no sonho". Era no estabelecimento que ele passava a maior parte do dia, segundo a filha. Pai de cinco filhos e casado havia mais de 35 anos com a esposa, Anna Gizéria, o empresário tinha como meta dar estudo aos filhos, conta Renata.
— Uma época eu quis ajudar ele na empresa, mas ele disse que era muito estressante, falou para eu estudar. Tinha muito essa preocupação de dar estudo para os filhos, e deu. Não lembro de ele tirar férias. Até hoje a gente insistia para ele parar um pouco, descansar. Mas ele estava sempre na empresa, todos os dias. Acordava de manhã, fazia um chimarrão e ia para lá, ficava até a noite. Ele trabalhava até nos dias de folga, nem que fosse cozinhando para os outros, fazendo um churrasquinho para a família todo o domingo — brinca Renata.
Gizéria também era apaixonado por Itaqui, cidade que escolheu para viver e cuidar da família. Era também onde ele queria, quando partisse, ser sepultado. No último dia 23, durante o velório, o município — de população estimada em 37 mil pessoas (conforme o IBGE em 2021) — retribuiu o carinho, conta a filha:
— Naquele dia eu soube o quanto ele era querido aqui, não só conhecido. A quantidade de pessoas que vieram, de homenagens. Nunca vi tanta flor na vida. Tanta gente que veio falar comigo, de uma empresa que ele ajudou, de um hospital, de alguma campanha que ele fez para quem estava precisando. Acho que foi a parte bonita disso tudo. Ele sempre teve esse perfil muito gentil, era de um caráter honesto.
O enterro ocorreu no Cemitério Municipal, no dia 23.
Empresário teria reagido
Conforme Renata, a morte do pai foi o segundo baque enfrentado pela família nos últimos meses. Em novembro, outra filha de Gizéria sofreu um traumatismo cranioencefálico após um acidente enquanto andava a cavalo. Moradora de Santa Catarina, ela veio para a casa dos pais em Itaqui, enquanto se recuperava.
Neste período, Gizéria ficou mais próximo dos dois netos, gêmeos, hoje com quatro anos, que foram para Itaqui junto da mãe.
— Nós quase perdemos a minha irmã, mas tivemos uma união gigantesca, rezamos muito para ela se recuperar. Ela está bem agora, com quase nenhuma sequela. Havíamos passado por isso recentemente, e agora a perda do meu pai. Parece que a gente estava sendo preparado para essa hora. É um momento muito delicado.
Assalto
O assalto a empresa ocorreu por volta das 18h de quarta-feira (22), na sede da empresa. A ação foi flagrada por câmeras de segurança do local. As imagens captaram o momento em que dois criminosos chegam de moto a empresa TransGizéria, no bairro José da Luz, e também a fuga deles após o crime.
No momento do assalto, estavam na empresa o proprietário e dois funcionários, que acionaram a polícia. A dupla invadiu o local exigindo a abertura do cofre, o que foi negado por Gizéria, segundo a investigação.
Os criminosos efetuaram dois disparos, que atingiram o empresário na cabeça e no peito. Na sequência, os criminosos fugiram do local, de moto. De acordo com o delegado de Itaqui, Flávio Martins, nada foi levado do local, mas as circunstâncias do caso apontam para um latrocínio (roubo com morte).
— Só não conseguiram levar valores porque a vítima reagiu — disse Martins.
A filha de Gizéria afirma que o cofre não estaria fechado no momento da ação:
— Eles não chegaram perto do cofre, não perceberam, mas não estava trancado. Não tinha nada de mais ali, de valor, porque hoje em dia é tudo por cartão, Pix. Não sabemos exatamente como foi, se ele chegou a reagir. Acho que morreu defendendo a empresa, que era um sonho de vida para ele, defendendo o que acreditava.
Atingido por dois disparos, Gizéria chegou a ser socorrido, mas morreu a caminho do hospital.
Dupla foi presa
Conforme a polícia, as equipes acessaram as câmeras de segurança da parte externa da empresa e identificaram os dois criminosos responsáveis pela ação. A dupla, dois homens de 26 e 34 anos, foi localizada pouco depois, na motocicleta usada na fuga do local, e presa em flagrante. Eles foram encaminhados ao presídio de Itaqui.
Conforme Martins, em depoimento, o homem que efetuou os disparos confessou participação no caso. O outro suspeito negou envolvimento.
— No entanto, ele foi preso tripulando a motocicleta utilizada para fugir do local e também foram encontradas as roupas utilizadas por ele no momento do crime — afirma o delegado.
O trabalho de captura dos homens foi feito em conjunto entre a Polícia Civil e a Brigada Militar.